Institucionalização de Crianças e Jovens em Portugal: um Exemplo para o Brasil

AutorMariana Zorzi Maino; Priscila Coelho
Páginas413-418

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1. Contexto social da delinquência juvenil

A questão da delinquência juvenil é um tema internacionalmente discutido que desperta o interesse de toda a população. Muitas vezes utilizado pela mídia sensacionalista como uma forma de obter forte atenção popular, o tema é constantemente distorcido, apresentado de forma exagerada e fora de contexto para aumentar a audiência dos telespectadores ou leitores que não têm muito envolvimento com a área mencionada. O tema continua dividindo a sociedade, que, com opiniões controversas, não consegue chegar a uma conclusão clara sobre quem, de fato, deveria ser responsabilizado pelos atos criminosos cometidos por jovens com idade inferior ao estabelecido em lei para imputação criminal, afinal, responsabilizar exclusivamente os jovens como únicos culpados é colocar-se em uma posição alienada em que não é possível enxergar a importância e a influência que outras instituições sociais, como a família e o Estado, podem desempenhar na vida de qualquer cidadão.

A família comumente é apontada como a principal responsável pelo desenvolvimento deste tipo de comportamento desviante. O abandono familiar é quase sempre apontado como a principal causa de os jovens transgredirem, uma vez que, não tendo apoio e atenção em casa, irão procurar outras formas de serem notados e de fazer com que seus responsáveis exerçam sobre si uma correta parentalidade. O furto, por exemplo, em alguns casos pode ser considerado como um ato praticado por carência afetiva. Assim como muitos adultos recorrem às compras quando se sentem solitários, os jovens também procuram bens materiais quando não são afetivamente preenchidos por dentro1.

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Partindo de uma visão um tanto quanto superficial do assunto, podemos simplesmente atribuir parte da responsabilidade aos jovens, que já deveriam ter discernimento suficiente para saber o que é certo e errado, e outra parte da culpabilidade ficaria a encargo da família, esta também por não ser capaz de transmitir às crianças e aos adolescentes que estão sob sua responsabilidade os valores morais e os princípios ideais de conduta predominantes na sociedade na qual estão inseridos. Pedro Moura Ferreira afirma que “a delinquência é vista como uma falta de controle, uma demissão do mundo adulto das suas responsabilidades em relação à geração mais nova”2.

Mas então, nesse caso, a culpa seria única e exclusivamente dos indivíduos; os adultos, por serem considerados incapazes de educar seus filhos da maneira mais adequada, de acordo com os padrões sociais que nos são impostos, e as crianças e os adolescentes, por não serem capazes de respeitar as regras e, portanto, conviver harmoniosamente em sociedade.

Acontece, porém, que muitas destas famílias estão inseridas em um ambiente com práticas que em muito divergem daquelas consideradas “socialmente adequadas”, sendo impossível a cobrança de um tipo de comportamento que nunca foi vivenciado.

Questiona-se, então, até que ponto deve ir a responsabilidade destes indivíduos e qual seu verdadeiro papel dentro de toda essa problemática exposta e moldada pelo Estado a toda a população, pois o problema social da delinquência juvenil tem uma dimensão muito mais profunda do que a simples justificativa que nos é passada por meio de todas as políticas sociais, que insistem na autorresponsabilização dos indivíduos. Se há uma falha no comportamento de determinadas pessoas, na maioria das vezes daquelas que apresentam mais escassez de recursos econômicos, carência de bens e serviços essenciais e provenientes de moradias que sofrem de precariedade na infraestrutura, é porque o Estado social, que deveria ser o agente da promoção social e organizador da economia, não foi capaz de garantir os serviços públicos e a proteção necessária a toda a população, tendo também sua parcela de culpa3.

2. Relação familiar com os jovens portugueses institucionalizados

Em Portugal, a entrada dos jovens para a delinquência ainda é muito frequente e está, na maior parte dos casos, relacionada ao abandono familiar em suas diversas formas. Ou seja, pode-se observar que os indivíduos não provenientes de famílias estruturadas e emissárias de princípios e valores comumente aceitos pela sociedade são mais propensos a praticar delitos.

Esse abandono familiar pode se manifestar de várias maneiras: a falta de supervisão adequada dos pais, ausência de limites, pouca orientação e atenção dos pais, famílias desajustadas, maus exemplos, ignorância dos problemas emocionais dos filhos, conflitos com os demais membros da entidade familiar, negligências, abuso emocional, psicológico ou físico, etc. Vale destacar também que crianças que apresentam um fraco apego aos seus pais e familiares são majoritariamente as que se envolvem em atividades impróprias, incluindo a conduta delinquente. Todos esses elementos somam as condições ideais para que problemas graves se manifestem em ações violentas.

Em Portugal, as crianças e os adolescentes institucionalizados demonstram valorizar muito sua família; independentemente de qual seja sua estrutura e sob quais princípios esteja alicerçada, é para a família que desejam retornar.

São poucos os casos que nos adotam como família. Para todos, a grande maioria, a família é extremamente importante. Por muito má que seja, a família é pra onde eles querem voltar, com quem eles querem estabelecer os laços, por muito mais que às vezes estejam tristes porque a família, no dia dos anos, não lhes liga, mas é o que têm de mais importante. Não só a família

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a que pertencem, como depois, também a que vierem a construir. Os que não têm, tentam realmente arranjar sempre alguém que possa ser a família deles, os padrinhos, a instituição de onde vieram [...].4

De acordo com o que nos foi...

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