Inicial. Contrato. Cédula de crédito industrial

AutorHélio Apoliano Cardoso
Páginas334-405

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EXMO. JUIZ DE DIREITO DESTA COMARCA

PROCESSO Nº ...................

............. por intermédio de comum advogado, ao final assinado, conforme procurações anexadas, com escritório profissional localizado na Rua ................, nº ....., CEP ......-..., indicado no instrumento procuratório anexado, onde recebe intimações, nos autos da execução por título não sentencial agitada pelo poderoso ..................., vêm, com base nos artigos 267, § 3º, 585, II; 586; 618, I; 267, VI; 586, II, do CPC, sólida corrente doutrinária e robusta jurisprudência, apresentar EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE, expondo e requerendo, ao final, o seguinte:

I - INTRODUÇÃO

A - COMPONENTE HISTÓRICO E SOCIAL DA CÉDULA DE CRÉDITO INDUSTRIAL

A Cédula de Crédito Industrial surgiu como um dos mecanismos do Governo, após 1964, necessários ao desenvolvimento econômico da Nação e voltados à ampliação e desenvolvimento do parque industrial, facilitando a obtenção de crédito e incentivando o investimento no setor.

Cuida de créditos incentivados pelo Estado para o desenvolvimento da atividade econômica, concedida sob regime de fomento à atividade industrial, cujo regramento advém de legislação específica (Decreto-Lei 16/76 e Decreto-Lei 431/69), que derrogou a Lei 4.595/64, por ser posterior a ela, conforme iterativas decisões do STJ.

Nos termos da legislação que rege as cédulas de crédito, os juros remuneratórios estão limitados em 12% (doze por cento) ao ano, a menos que haja autorização específica do Conselho Monetário Nacional, não se submetendo os empréstimos criados com vistas a incentivar atividades de fomento à regra geral de liberação dos juros remuneratórios nos contratos firmados com instituições financeiras.

Somente em razão de os juros permanecerem limitados é que a lei permite a capitalização mensal em contratos desse jaez.

Conforme já decidiu este Superior Tribunal de Justiça, a Resolução 1064/85 não representa autorização do CMN para, nos créditos incentivados, cobrar juros acima do teto legal (AgRg no Resp 213.804/RS e AgRg no Resp 262.632/RS).

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Não há manifestação do CMN com o intuito de afastar a limitação da taxa de juros nas cédulas de crédito rural, comercial e industrial.

A jurisprudência é precisa:

"Direito processual civil e econômico. Agravo no agravo no recurso especial. Contrato de Cédula de Crédito Rural. Juros remuneratórios. Limitação.

Por ausência de deliberação do Conselho Monetário Nacional, a taxa de juros remuneratórios está limitada em 12% ao ano para as cédulas de crédito rural, comercial e industrial.

Negado provimento ao agravo no recurso especial." (AgRg no AgRg no Resp 714.940/MG, rel. Min. NANCY ANDRIGHI, DJU de 26.09.2005)

A Segunda Seção do STJ decidiu que os juros bancários só serão modificados em casos de abuso; porém, referido julgamento teve como objeto contrato de mútuo e não cédula de crédito.

No Resp 132986/SC fica clara a exclusão dos mútuos rurais da regra geral de liberação dos juros:

DIREITOS COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO ACOMPANHADO DE EXTRATO CIRCUNSTANCIADO DE MOVIMENTAÇÃO DA CONTA-CORRENTE. TÍTULO EXECUTIVO. ASSERTIVA CONSTANTE DO ACÓRDÃO. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME NA INSTÂNCIA ESPECIAL. LIQUIDEZ. JUROS. LEI DE USURA. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO.

O contrato de abertura de crédito rotativo tem a natureza de título executivo, suficiente para informar o processo de execução, desde que acompanhado de extrato de movimentação da conta-corrente que permita aferir a evolução da dívida e a exata correspondência com o que tenha sido ajustado, como ocorre na hipótese sob exame.

Tendo o acórdão recorrido assentado que os extratos juntados seriam suficientes para se apurar a evolução da dívida, a matéria não pode ser reexaminada nesta instância, por demandar análise da prova, vedada nos termos do enunciado da Súmula 7/STJ.

A Lei 4.595/1964, que rege a política econômico-monetária nacional, ao dispor no seu art. 4º, IX, que cabe ao Conselho Monetário Nacional limitar taxas de juros, revogou, nas operações realizadas por instituições do sistema financeiro, salvo nos mútuos rurais, quaisquer outras restrições que previam teto máximo daqueles.

A taxa de juros restou atrelada ao alvitre do Conselho Monetário Nacional, criado exatamente ‘com a finalidade de formular a política da moeda e do crédito, ... objetivando o progresso econômico e social do país’ (art. 2º da Lei nº 4.595/64).

As taxas de juros, ante a eventual omissão do Conselho Monetário Nacional, não podem ficar sujeitas à livre vontade das instituições bancárias, geridas sempre com o intuito de trilhar os caminhos do lucro, muitas vezes exagerados, como sói acontecer, o que prejudica a própria razão de ser da nota de crédito industrial.

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Ao invés de incentivar a industrialização, a liberdade excessiva dos bancos tem acarretado, na verdade, a quebra de centenas de indústrias que dependem do crédito para sobreviver.

A jurisprudência do STF, consolidada na Súmula nº 596 e aplicada já em alguns casos, entende que ‘as disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional’.

Isso porque a Lei nº 4.595/64, art. 4º, inciso IX, incumbiu ao Conselho Monetário Nacional limitar, apenas quando necessário, as taxas de juros relativas a operações e serviços bancários ou financiamentos.

Ocorre que o Decreto-Lei nº 413/69, além de posterior à Lei nº 4.595/64 e específico para as cédulas de crédito industrial, prevê no art. 5º que ao Conselho Monetário Nacional compete fixar e não que poderá fixar os juros a serem praticados.

A faculdade prevista na Lei nº 4.595/64, art. 4º, inciso IX, cede à norma específica e mais moderna do Decreto-Lei 413/69, que prevê dever.

Por orientação da Súmula nº 596 do STF, mesmo que não alcance a cédula de crédito industrial quanto à limitação dos juros, deve incidir, enquanto não regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional, a taxa de juros máxima de 12% ao ano prevista no Decreto nº 22.626/33, art. 1º, caput. (in DJU de 13.10.1998).

B - DIREITO DE AÇÃO

O direito de ação do credor só nasce com o seu vencimento, no termo final ou de forma antecipada em caso de inadimplemento das prestações convencionadas.

As matérias de ordem pública - porque o Juiz as pode conhecer de ofício - podem ser discutidas em sede de exceção de pré-executividade.

C - CABIMENTO DE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE PARA DISCUTIR EXCESSO DE EXECUÇÃO

A admissibilidade da exceção de pré-executividade para discutir excesso de execução tem o aval do STJ, especialmente o manifestado no REsp n° 545.568/MG, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ 24.11.2003, extraindo-se o que interessa:

Com a devida permissão, não creio seja possível estabelecer regra linear, no sentido de que a alegação de excesso de execução somente possa encontrar espaço em ação de embargos. É preciso discernir a natureza que o excesso assume para evitar que, de forma extremamente onerosa e desnecessária, obrigue-se o devedor a oferecer garantia aparentemente irreal em face do crédito reclamado judicialmente.

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EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE 337 Na espécie em exame, o excesso de execução de que se ocupou o agravado é aquele mencionado pelo art. 743, I, CPC, pois, aparentemente, o agravante pleiteia quantia superior ao estipulado no acórdão.

Sabe-se que este fundamento não extingue o processo de execução, apenas corrige o seu curso, a fim de se outorgar ao título executivo a indispensável certeza e liquidez a proporcionar a correta e justa satisfação do credor.

A execução por quantia excessiva e que seja perceptível de imediato, se averiguada a origem do título que a embasa, constitui tema que não pode apenas ser invocável por vontade exclusiva do devedor em embargos.

Indiscutível a solidez dos argumentos anteriormente apresentados, a justificar a procedência da presente argumentação.

D - NULIDADE ARGUIDA EM FACE DE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. POSSIBILIDADE

É plenamente possível a presente arguição, mercê de sólida corrente jurisprudencial do STJ:

"AGRAVOS NO RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE CÉDULA DE CRÉDITO INDUSTRIAL. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. MATÉRIA DE FATO.

ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. PACTUAÇÃO.

JUROS. DISCUSSÃO SOBRE A VIGÊNCIA DA LEI Nº 4.595/64. DISSÍDIO NÃO CONFIGURADO. RECURSOS DESPROVIDOS.

  1. Sendo recíproca a sucumbência das partes, porque decaíram em proporções semelhantes, cada parte arca com metade das despesas processuais e com os honorários de seus advogados, relativamente à ação de embargos, sem prejuízo dos honorários do processo de execução.

  2. Desconstituir a assertiva do acórdão impugnado no sentido de que o título preenche todos os requisitos legais e está acompanhado de demonstrativo contábil "que possibilita aos devedores ampla e especificada impugnação dos valores", implicaria reexame de provas vedado pelo enunciado n. 7 da súmula/STJ.

  3. Esta Corte fixou entendimento de que é cabível a capitalização dos juros, nos casos expressamente autorizados por norma específica, como nos mútuos rural, comercial ou industrial, desde que observadas as prescrições legais e a pactuação nos contratos, nos termos do enunciado n. 93 da súmula/STJ.

  4. A dessemelhança entre as situações fáticas descritas no aresto paradigma e no acórdão impugnado impede a divergência jurisprudencial hábil a instruir a via do recurso especial." (AgRg no REsp 197.815/SC, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 19.12.2002, DJ 10.03.2003 p. 220)

    E - AÇÃO COMO DIREITO POTESTATIVO

    Giuseppe Chiovenda, em famosa preleção bolonhesa de 1903, chama a atenção para o conceito de ação como poder jurídico de dar vida à condição para a atuação da vontade da lei.

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    Referido direito insere-se na categoria dos direitos potestativos, constituindo um diritto del potere giuridico , tendente à produção de efeito a...

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