Os impactos econômicos da atuação do sistema penal: vida virtual, isolamento e encarceramento em massa

AutorSergio Francisco Carlos Graziano Sobrinho
CargoPontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
Páginas133-158
Os Impactos Econômicos da Atuação do Sistema
Penal: vida virtual, isolamento
e encarceramento em massa1
The Economic Impacts of the Penal System Performance: virtual life,
isolation and mass incarceration
Sergio Francisco Carlos Graziano Sobrinho
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – Porto Alegre, RS, Brasil
Resumo: Este artigo objetiva compreender a
atuação do sistema penal brasileiro a partir dos
índices de encarceramento dos últimos 20 anos,
interagindo o conceito econômico da maximi-
zação dos lucros com o discurso criminológico
da seletividade do sistema penal. As transfor-
mações discursivas no campo das políticas cri-
minais, caracterizadas por uma constante e forte
repressão penal, passando do “previdenciarismo
penal” (correção) ao aumento das punições,
sofrem importante interferência do modelo
econômico, em especial modulando as práticas
de encarceramento com interesses privados e
produzindo significativo aumento dos índices
de encarceramento, permanente seletividade
da atuação do sistema penal e transformações,
tanto no modo de vida contemporâneo como na
atuação e nas estruturas dos órgãos de controle
e de justiça criminais.
Palavras-chave: Encarceramento. Privatiza-
ção. Seletividade.
Abstract: This article aims to understand the
role of the criminal justice system from the in-
carceration rates of the past 20 years, interact-
ing economic concept of profit maximizat ion
with the criminological discourse of selectivity
of the penal system. The discourse transforma-
tions in the field of criminal policy, character-
ized by a constant and strong prosecution, pass-
ing “penal welfarism” (correction) the increase
in punishment, suffer signific ant interference
from the economic model, in particular modu-
lating the practices of incarceration with private
interests, producing a significant increase in
incarceration rates, permanent selectivity of ac-
tion of the penal system and the changes in both
the contemporary way of life as the action of
the organs and structures of control and crimi-
nal justice.
Keywords: Incarceration. Privatization. Selec-
tivity.
1 Recebido em: 14/7/2014
Revisado em: 8/10/2014
Aprovado em: 14/10/2014
Doi: http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2014v35n69p133
134 Seqüência (Florianópolis), n. 69, p. 133-158, dez. 2014
Os Impactos Econômicos da Atuação do Sistema Penal: vida virtual, isolamentoe encarceramento em massa
1 Introdução
O cenário de violência que se estabeleceu nas últimas décadas nos
ambientes urbanos brasileiros favoreceu a realização de pesquisas com
coleta de dados suficientes para permitir e entender esse fenômeno e
avançar em algumas conclusões sobre os caminhos a serem trilhados no
enfrentamento do problema. Contudo, a partir da necessária compreensão
da atuação do sistema penal brasileiro, mormente pelos déficits existentes
no modelo tradicional de resposta à criminalidade, baseado principalmen-
te na atuação seletiva das polícias e no encarceramento em massa, o pro-
blema da capacidade do sistema penal em responder as demandas sociais
torna-se um dos mais importantes objetos da sociologia da administração
da justiça, justamente em razão das expectativas dos cidadãos na atuação
das instituições públicas.
A pretensão do presente ensaio é entender o significado, as conse-
quências e as motivações econômicas do aumento dos índices de encar-
ceramento, justamente em razão das profundas alterações discursivas no
campo das políticas criminais, as quais passaram do modelo previdenciá-
rismo penal (correção) ao aumento das punições e sofrem importante in-
terferência do modelo econômico, modulando as práticas de encarcera-
mento com interesses privados.
A constatação mais evidente do aumento do encarceramento no
Brasil pode ser vista no significativo aumento da população carcerária
nos últimos 20 anos. Para se ter ideia desse crescimento, em 1995 havia
pouco mais de 148 mil pessoas submetidas ao regime de encarceramento,
hoje são 567.655 presos, mais 147.937 pessoas em prisão domiciliar, to-
talizando 715.655 pessoas presas. É preciso computar – para uma análise
do universo que se está trabalhando – conforme dados do DEPEN do ano
de 2009, mais 671.078 pessoas submetidas a algum tipo de controle penal
extramuros, como as penas alternativas (126.273 pessoas) criadas pela Lei
n. 9.714/1998, e medidas alternativas (544.795 pessoas) previstas na Lei
n. 9.099/1995, como a transação penal, suspensão condicional do processo
e a composição civil. Apesar dos dados não estarem atualizados em relação
às penas e às medidas alternativas, é possível dizer que hoje no Brasil há
mais de 1.386.733 pessoas submetidas à ação direta do sistema penal.

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