Governo das condutas e subjetividades contemporâneas: o biocapital em questão

AutorRenata Rodrigues - Dolores Galindo - Flávia Cristina Silveira Lemos - Marcos Nalli - Daniella Soares Santos
CargoUniversidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá/MT, Brasil - Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá/MT, Brasil - Universidade Federal do Pará, Belém/PA, Brasil - Universidade Estadual de Londrina, Londrina/PR, Brasil - Universidade de Brasília, Brasília/DF, Brasil
Páginas41-59
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Revista de Ciências HUMANAS, Florianópolis, v. 49, n. 2, p. 41-59, jul-dez 2015
Neste artigo, pretende-se analisar a produção
do mercado da saúde por meio da indústria far-
macêutica, da gestão de riscos/perigos, da venda
e compra de serviços biomédicos variados, sob o
modelo neoliberal atual. O governo da vida, na
biopolítica, que emerge a partir da segunda meta-
de do século XIX, traz o acontecimento gestão da
saúde para o primeiro plano das práticas sociais,
em nome do fazer viver e do deixar morrer, como
parte do acontecimento história da gerência da po-
pulação. Trata-se de um estudo teórico a partir de
operadores históricos genealógicos, baseado em
Michel Foucault e em outros autores contemporâ-
neos, os quais analisaram os processos biopolíticos
enquanto biocapital, nos termos da governamenta-
lidade neoliberal do empresariamento da vida.
Palavras-chave: Biocapital – Biopolítica – Neoli-
beralismo – Subjetividades - Foucault esumo
This article aims to analyze the production
of the healthcare market by the pharmaceutical in-
dustry, the risk management/hazards, the sale and
purchase of various biomedical services, under the
current neoliberal model. The government of life in
biopolitics, which emerges from the second half of
the nineteenth century, brings health management
event to the forefront of social practices, on behalf
of making to live and letting to die, as part of the
history of population management event. This is a
theoretical study from genealogical incumbents,
based on Michel Foucault and other contemporary
authors, who have analyzed the biopolitical as bio-
capital processes, pursuant to neoliberal govern-
mentality of entrepreneurship of life.
Keywords: Biocapital - Biopolitics - Neolibera-
lism - Subjectivities. Foucault.
Introdução
A genealogia em Michel Foucault (1979) implica problematizar as prá-
ticas de saber, de poder e de subjetivação por meio de uma análise histórica.
Há uma preocupação em pensar a coexistência dessas práticas e seus efeitos
na gestão das populações e dos corpos individuais simultaneamente com o
Governo das condutas e subjetividades contemporâneas:
o biocapital em questão
Government of conducts and contemporary subjectivities:
The biocapital under consideration
http://dx.doi.org/10.5007/2178-4582.2015v49n2p41
Renata Rodrigues
Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá/MT, Brasil
Dolores Galindo
Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá/MT, Brasil
Flávia Cristina Silveira Lemos
Universidade Federal do Pará, Belém/PA, Brasil
Marcos Nalli
Universidade Estadual de Londrina, Londrina/PR, Brasil
Daniella Soares Santos
Universidade de Brasília, Brasília/DF, Brasil
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RODRIGUES, Renata et al. Governo das condutas e subjetividades contemporâneas: o biocapital em questão.
objetivo de explicitar como os objetos foram forjados; como não são naturais,
portanto, podem ser transformados. Entre as análises de poder, de saber e de
subjetivação realizadas por Foucault (2008a; 2008b) está o conceito de biopo-
lítica, que se tornou um importante operador para a interrogação do que se faz
na atualidade por meio dos saberes e políticas de governo da vida em nome da
saúde e da defesa da sociedade.
A biopolítica tem como função fazer viver e deixar morrer, por meio da
criação de estratégias de regulação para intervir no aumento da longevidade,
controlar acidentes e eventualidades, melhorar a deciência genética humana,
melhorar e intensicar traços humanos valorados como qualidades e benfaze-
jos à existência da população (FOUCAULT, 1999). A rubrica biocapital tem
sido utilizada para balizar uma série de processos que vêm acontecendo nas
últimas décadas, em que elementos ditos da natureza adquirem valor e são
estruturados em termos econômicos, principalmente com base na emergência
histórica do neoliberalismo.
Tal terminologia chama nossa atenção por seu caráter dúbio, uma vez que
passou a ser usada tanto como ferramenta de crítica à comercialização irree-
tida da vida quanto pelas organizações econômicas que dela se valem, para
cálculos biopolíticos. Parece apropriada à racionalidade neoliberal que vive-
mos. Foucault (2008a) mostra que as sociedades neoliberais surgem quando
problemas relativos à saúde, higiene, natalidade, longevidade, raças não po-
dem ser dissociados do âmbito da racionalidade política, no interior da qual
eles aparecem e adquirem importância e intensidade.
Com efeito, a palavra biocapital aparece pela primeira vez na literatura
cientíca em 1913, no livro Evolution by cooperation: a study in bioecono-
mics, do biólogo Reinheimer, mas somente em 1972 sua conceituação é rea-
lizada pelo matemático e economista Georgescu-Roegen, a m de discorrer
sobre a manipulação de órgãos que acompanham os seres vivos desde o seu
nascimento, bem como a capacidade dos seres humanos em desenvolver téc-
nicas para manipular e vencer algumas restrições biológicas. Entendemos que
discorrer sobre economia não se resume à produção de trabalho, mas implica
considerar também todos os envolvidos na relação de comercialização como
atores importantes.
O liberalismo é uma losoa política, caracterizada pelos limites que im-
põe ao poder exercido pelas autoridades políticas (AVELINO, 2013). É ainda
uma maneira de organizar a subjetividade e constituir estilos de vida. A emer-
gência do uso do termo biocapital está ligada ao mercado transnacional de
capital biológico, e apenas num momento posterior migrou como crítica a esse
próprio movimento do qual surge, como evidenciam Gonzáles et al. (2014).

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