Generalidades sobre processo

AutorChristovão Piragibe Tostes Malta
Ocupação do AutorAdvogado. Juiz aposentado
Páginas19-66
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PRÁTICA DO PROCESSO TRABALHISTA
Primeira PartePrimeira Parte
Primeira PartePrimeira Parte
Primeira Parte
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO
1º Capítulo GENERALIDADES
SOBRE PROCESSO
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11
1Conflito de interConflito de inter
Conflito de interConflito de inter
Conflito de interessesesses
essesesses
esses. As pessoas, físicas ou jurídicas, muitas vezes se desentendem sobre
a satisfação de suas pretensões ou interesses, usado este vocábulo em seu sentido normal de
proveito, utilidade ou bem. O empregador, por exemplo, quer reduzir o salário de um empregado
e este se opõe à medida. Paralelamente ao interesse do empregador em diminuir seus gastos, há
o do empregado de não ter seu poder aquisitivo reduzido. Surge, então, o conflito de interesses.
É possível que os opositores, por si mesmos, cheguem a um entendimento (autocomposição do
conflito), o que pode se dar pela desistência (renúncia à pretensão; no exemplo dado, o empregador
desiste de reduzir o salário do empregado), pela submissão (renúncia à resistência oferecida à
pretensão; no exemplo dado, o empregado concorda com a redução) ou pela transação
(concessões recíprocas; o empregador, por exemplo, reduz o salário do empregado, mas também
diminui sua jornada de trabalho). Não havendo esse entendimento, a pessoa que se sentir
lesada pela manutenção do conflito pode dirigir-se ao Estado para que o solucione (forma de
heterocomposição do conflito). Com raras exceções (legítima defesa, greve etc.), não mais se
admite que os adversários procurem solucionar o conflito ou fazer justiça por seus próprios
meios, isto é, rejeita-se a autodefesa ou composição unilateral.
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2Lide e conflito de interLide e conflito de inter
Lide e conflito de interLide e conflito de inter
Lide e conflito de interessesesses
essesesses
esses. Duas ou mais pessoas podem ter interesses opostos, jamais
externando suas reivindicações. Não sendo possível saber o que se passa no íntimo das pes-
soas, nada existe para ser solucionado pelo Estado e o desejo, a pretensão de cada um, é estranho,
no caso, ao direito.
Para que o Estado procure solucionar o conflito de interesses é preciso que a reivindicação
de uma pessoa seja resistida por outra. Levado o conflito ao pronunciamento do Estado, ocorre
a lide, conflito de interesses submetido ao pronunciamento do Estado.
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PrPr
PrPr
Pretensãoetensão
etensãoetensão
etensão. O conflito de interesses resulta de haver uma ou mais pretensões insatisfeitas.
A pretensão é o desejo de uma pessoa de submeter ao seu o interesse de terceiro, de obter certo
benefício, como o recebimento de alguma importância ou a imposição a terceiro de dado
procedimento; ex.: a abstenção de expulsar empregados da casa da empresa em que residem.
Para que qualquer pessoa possa pleitear do Estado a solução de um conflito, contudo,
não é necessário que realmente haja uma reivindicação insatisfeita; é suficiente que alegue que
isso ocorre.
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Preenchidas certas exigências que serão examinadas em outra passagem, há o direito ao
pronunciamento do Estado sobre o conflito; o Estado, mediante seus órgãos jurisdicionais,
tem o dever de pronunciar-se sobre a lide que lhe é submetida, assim exercendo uma de suas
funções, a jurisdição.
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4JurisdiçãoJurisdição
JurisdiçãoJurisdição
Jurisdição. Encontramos a jurisdição na doutrina e na jurisprudência sob diversas
designações. Em sentido lato (poder de solucionar conflitos de interesses) os mestres chamam-
-na, por vezes, poder judiciário e função da justiça. Em sentido estrito (conjunto de órgãos estatais
incumbidos de solucionar conflitos de interesses) também a denominam administração da justiça
e poder judiciário. O termo jurisdição, além de oferecer a vantagem da maior difusão com referência
ao instituto que designa, a ele corresponde, precipuamente, à diferença das outras expressões
mencionadas, sendo, por conseguinte, tecnicamente mais perfeito.
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5Jurisdição e soberaniaJurisdição e soberania
Jurisdição e soberaniaJurisdição e soberania
Jurisdição e soberania. A soberania é o poder inerente a todo Estado. Esse poder, que é
uno, manifesta-se mediante três funções: legislativa, administrativa e jurisdicional, estreitamente
ligadas à noção de soberania e mesmo constituindo elementos indispensáveis à organização
estatal.
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6Conceito de jurisdiçãoConceito de jurisdição
Conceito de jurisdiçãoConceito de jurisdição
Conceito de jurisdição. Poder Judiciário. A jurisdição é a função da soberania mediante a
qual o Estado dirime litígios, podendo a decisão ter força de coisa julgada (v. Coisa julgada)(1).
Há princípios concernentes à jurisdição. Segundo o da investidura, a jurisdição só pode
ser exercida por quem nela esteja legitimamente investido, isto é, conforme o que a propósito
disponha o direito positivo. Pelo do território, a jurisdição depende da existência de um lugar
no qual possa ser exercida como o território de um Estado. Pelo da indelegabilidade, o juiz não
pode delegar a outra pessoa os poderes jurisdicionais de que está investido. Pelo da
inafastabilidade, a lei não pode excluir da apreciação do judiciário qualquer conflito de interesses.
Conforme o princípio do juiz natural, não deve haver tribunais de exceção. As pessoas devem
ser julgadas por juízes imparciais, investidos conforme as regras do direito positivo. Pelo princípio
da inércia, a jurisdição depende de iniciativa dos interessados (v. n. 26.5). Pelo princípio da
perpetuação da jurisdição, sendo fixada a competência concernente à matéria ou à pessoa, não
pode ser alterada a critério das partes ou do juiz.
A jurisdição abrange mais do que a declaração do Estado de que uma das partes em
conflito tem razão. Compreende ainda a tutela jurisdicional ou proteção efetiva do Estado a
quem é titular de um direito, isto é, possibilidade de obrigar o vencido a cumprir a decisão
estatal (coerção), pagando, por exemplo, sua dívida(2).
Não se confundem jurisdição e poder judiciário. Este é o complexo dos órgãos estatais a
que compete precipuamente a solução dos conflitos de interesses, mas sem o monopólio dessa
atividade. Consoante o direito positivo, pode dar-se que a solução de algumas lides seja atri-
buída ao legislativo ou mesmo ao executivo. No Brasil, por exemplo, alguns crimes são julgados
pelo Legislativo (CF 52, I e II).
(1) COUTURE, Eduardo J. Fundamentos del derecho procesal civil. 3. ed. Buenos Aires: Depalma, 1973. p. 4. A
jurisdição é instituto diverso da tutela jurisdicional , que é a proteção efetivamente dada pelo Estado àquele que é
titular de um direito (CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, v. I, p. 75).
(2) ALVIM, J. E. Carreira. Teoria geral do processo. 8. ed. 2002. p. 68 e ss.
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PRÁTICA DO PROCESSO TRABALHISTA
Por outro lado, o poder judiciário normalmente pratica vários atos administrativos e
podem ser-lhe incumbidos atos legislativos. Os tribunais trabalhistas, por exemplo, julgando
dissídios coletivos, exercitam funções legislativas.
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7Funções legislativa, administrativa e jurisdicionalFunções legislativa, administrativa e jurisdicional
Funções legislativa, administrativa e jurisdicionalFunções legislativa, administrativa e jurisdicional
Funções legislativa, administrativa e jurisdicional. O ato jurisdicional e o administrativo
distinguem-se do legislativo, porquanto este cria a norma jurídica, o direito objetivo, ao passo
que os demais apenas a aplicam.
É complexo distinguir o ato jurisdicional do administrativo, em sua essência, e, pois, a
função jurisdicional da executiva, muitos tendo sido os critérios para tanto propostos, entre os
quais avulta o que caracteriza a jurisdição como atividade de substituição: diante de um conflito
de interesses o Estado se substitui à vontade dos litigantes e dos cidadãos em geral, vontade
que passa a ser a do Estado, o qual soluciona o conflito de acordo com o direito positivo.
Os atos estatais visando a solucionar os conflitos de interesses com a possibilidade de
formação da coisa julgada são atos jurisdicionais, ainda que a contenda termine sem haver a
coisa julgada, como sucede quando o autor desiste do processo com o assentimento do réu.
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8Jurisdição graciosa e contenciosaJurisdição graciosa e contenciosa
Jurisdição graciosa e contenciosaJurisdição graciosa e contenciosa
Jurisdição graciosa e contenciosa. A jurisdição contenciosa é a propriamente dita. A
graciosa, voluntária, administrativa, gratuita ou intervolentes consiste na prática de atos adminis-
trativos que são atribuídos aos órgãos estatais cujas funções básicas importam no exercício de
atos de jurisdição. Mediante a jurisdição graciosa o Estado não dirime conflitos de interesses, e
sim homologa acordos, nomeia pessoas para exercerem certos encargos (um depositário, por
exemplo) etc. Realiza, enfim, atos que poderiam ser atribuídos a autoridades administrativas
mas que, para maior garantia dos interessados, são incumbidos aos órgãos judiciários.
A jurisdição voluntária não é jurisdição porque não traduz atividade de um órgão do
poder público visando à composição de conflitos de interesses. Não é voluntária porque muitas
vezes, em hipóteses que são classificadas na categoria em exame, a pessoa designada para praticar
determinado ato, como a nomeada depositária, por exemplo, é coagida a aceitar o encargo,
embora não o queira, se as escusas que apresentar não forem aceitas.
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9PrPr
PrPr
Processoocesso
ocessoocesso
ocesso. Submetido um conflito de interesses ao pronunciamento do Estado, este tem o
dever de solucioná-lo, o que faz obedecendo a certas diretrizes, a um critério, sistema ou método,
a uma ordem, enfim. Esse método é o direito processual.
Na aplicação do método estatal de solucionarem-se contendas, vários atos se praticam
em obediência à ordem instituída pelo sistema adotado: a pessoa que toma a iniciativa de
dirigir-se ao Estado (autor ou reclamante) apresenta seu pedido, a pessoa com que o autor
litiga (réu ou reclamado) defende-se, provas são produzidas, o juiz profere sentença etc. A
sequência desses atos é o processo, que não se confunde com o direito processual. Este é uma
diretriz, uma determinação estatal, um sistema; aquele, uma série de atos ordenados de acordo
com tal método.
Como o direito processual também rege a prática de atos de jurisdição graciosa, pode-se
dizer que o direito processual é o método pelo qual o Estado compõe interesses, podendo estes
estar ou não em conflito. Apenas em um sentido mais estrito, o direito processual é um sistema
pelo qual o Estado exerce a função jurisdicional, dirimindo conflitos de interesses.

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