Agricultura familiar e ?reas de preserva??o permanente: uma an?lise a partir da concep??o dos colonos de Botuver?/SC.

AutorC?ntia Uller-G?mez - Maria Jos? Reis - Luiz Fernando Scheibe
CargoDoutora em Ci?ncias Humanas pelo Programa de P?s-Gradua??o Interdisciplinar em Ci?ncias Humanas (PPGICH) da UFSC - Doutor em Geoci?ncias pela Universidade de S?o Paulo, USP - Doutora em Ci?ncias Sociais pela Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, professora aposentada da UFSC
Páginas179-217
R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.6, n.1, p. 179-217, jan./jul. 2009
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AGRICULTURA FAMILIAR E ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE: UMA
ANÁLISE A PARTIR DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS COLONOS DE
BOTUVERÁ/SC1.
FAMILY FARMING AND AREAS OF PERMANENT PRESERVATION: AN
ANALYSIS BASED ON THE COLO NOS’ SOCIAL REPRESENTATIONS IN
BOTUVERÁ/SC.
AGRICULTURA FAMILIAR Y ÁREAS DE PRESERVACIÓN PERMANENTE: UN
ANÁLISIS A PARTIR DE LAS REPRESENTACIONES SOCIALES DE LOS
COLONOS DE BOTUVERÁ/SC.
Cíntia Uller-Gómez 2
Luiz Fernando Scheibe3
Maria José Reis4
RESUMO:
Neste trabalho analisamos as representações sociais de agricultores familiares de
Botuverá (SC), auto-identificados como “colonos”, a respeito do uso das margens
dos cursos d‟água, e o significado do plantio de espécies florestais exóticas
(sobretudo eucalipto) em seus estabelecimentos rurais. Constatamos que as áreas
ciliares são tidas como áreas produtivas para a família, a partir de um conjunto de
valores, correspondentes, de um modo geral a uma certa campesinidade, e de modo
específico à sua condição de colonos. O plantio de espécies exóticas como os
eucaliptos, por sua vez, aparece com mais intensidade nos estabelecimentos em
que os referidos valores camponeses já não têm tanta importância nas decisões
tomadas, e naqueles estabelecimentos em que já não se depende exclusivamente
do uso da terra. Concluímos que estratégias de conservação ambiental devem
considerar as necessidades práticas e os aspectos simbólicos dos agricultores
familiares, através da construção conjunta de alternativas de uso conservacionista,
valorizando o aspecto de que nos estabelecimentos em que os valores relativos à
referida campesinidade se fazem mais presentes, é maior a tendência em conservar
a biodiversidade.
Palavras-chave: Agricultura familiar; Mata ciliar; Áreas de preservação permanente.
1 Este artigo tem como base um dos capítulos da tese de doutorado de Cíntia Uller-Gómez,
Agricultura familiar e participação na gestão das águas na Bacia do Itajaí (SC, Brasil), no Programa
de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas, da UFSC, 2006, elaborada sob a
orientação do Prof. Dr. Luiz Fernando Scheibe e a co-orientação da Profa. Dra. Maria José Reis.
2 Doutora em Ciências Humanas pelo Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências
Humanas (PPGICH) da UFSC, Engenheira Agrônoma. E-mail: cintiaug@yahoo.com.br
3 Doutor em Geociências pela Universidade de São Paulo, USP, Professor Titular do Depto.
Geociências da Universidade Fedeeral de Santa Catarina, UFSC e dos Programas de Pós-
Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas (PPGICH) e em Geografia. E-mail:
scheibe2@gmail.com
4 Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, professora
aposentada da UFSC e Titular da Universidade do Vale do Itajaí, UNIVALI, colaboradora do
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFSC. E-mail: masereis@hotmail.com
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ABSTRACT:
The purpose of this study is to analyse the colonos social representations in
Botuverá (SC), concerning the use of the margins of the water courses and the
meanings of exotic forestry species planting (eucalyptus, above all) in their rural
establishments. Examining the heart of peasantry values in general and, in particular,
the values expressed by the colonos, we found that the margins of water courses are
considered as productive areas for the family. On the other hand, the planting of
exotic forestry species appears with more intensity in the rural establishments where
the above-mentioned peasant values do not greatly influence the decision-making
process, as well as in those establishments that do not exclusively depend on the
use of the land. We have concluded that the strategies for environmental
preservation should take into account the family farmer‟s practical needs and
symbolic aspects, creating joint alternatives of conservative use, valuing the fact that
there was a greater interest in preserving the biodiversity in the establishments
where the peasant categories were more evident.
Key-words: Family farming; Riparian vegetation; Permanent preservation areas.
RESÚMEN:
En este trabajo analizamos las representaciones sociales de los agricultores
familiares de Botuverá (SC), conocidos c omo “colonos”, con respecto al uso de las
márgenes de los cursos de agua y el significado de la plantación de especies
exóticas (sobretodo eucalipto) en sus establecimientos rurales. Constatamos que las
áreas ribereñas son aprehendidas por los agricultores como áreas productivas para
la familia a partir del conjunto de valores correspondientes a una cierta
campesinidad de manera general, y de los valores del “colono”, en particular. A su
vez, la plantación de especies exóticas c omo el eucalipto es más frecuente en los
establecimientos en que los valores campesinos mencionados ya no tienen tanta
importancia en las decisiones tomadas, y en aquellos en que la supervivencia ya no
depende exclusivamente del uso de la tierra. Concluimos que las estrategias de
conservación ambiental deben considerar las necesidades prácticas y los aspectos
simbólicos de los agricultores familiares, a través de la elaboración conjunta de
alternativas de uso conservacionista, teniendo en cuenta que en los
establecimientos en que las categorías campesinas están más presentes, era mayor
la tendencia en la conservación de la biodiversidad.
Palabras-clave: Agricultura familiar; Areas ribereñas; Areas de perservación
permanente.
1 INTRODUÇÃO
Neste trabalho procuramos compreender como os agricultores familiares de
Botuverá, no Vale do Itajaí (Santa Catarina), concebem as áreas de preservação
permanente em seus estabelecimentos rurais, assim determinadas pela legislação
ambiental brasileira, sobretudo as margens dos cursos d‟água (artigo 2o da Lei
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4771/65 Código Florestal), e os remanescentes florestais em estágios médio e
avançado de regeneração (artigo 1o do Decreto 750, de 1993).
A busca desta compreensão decorre da necessidade de serem levadas em
conta, no c aso da gestão das águas, as possíveis implicações sobre as condições
de vida dos agricultores familiares neste Vale, em sua especificidade sociocultural, a
partir da Nova Política Nacional de Recursos instituída no Brasil com a promulgação
A promulgação da referida Lei Federal trouxe importantes novidades para a
gestão das águas no Brasil. Dentre elas destacamos a atribuição de valor
econômico à água e o estabelecimento dos “comitês de bacia”5, responsáveis pelo
caráter participativo na tomada de decisões a respeito da sua gestão, no âmbito das
bacias hidrográficas, como órgãos colegiados compostos de representantes do
governo, da população e dos usuários da água.
Essa Lei, em suas diretrizes gerais, prevê a articulação da gestão das águas
com a do uso do uso e com a gestão ambiental, de forma que a legislação ambiental
pode dar suporte e legitimidade às ações pensadas para o espaço rural. Um
exemplo concreto desta articulação é o Projeto Piava “Construção de uma política
sustentável de proteção de nascentes e matas ciliares na Bacia do Itajaí”, executado
entre 2005 e 2007, iniciativa do Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do
Itajaí no qual todos os aspectos da legislação ambiental são considerados,
conferindo importância e legitimidade às ações previstas e implementadas (veja-se
Bohn, 2005).
O Comitê da Bacia do Itajaí (SC) f oi criado vinculado ao Conselho Estadual de
Recursos Hídricos, nos termos da Lei Estadual 9.748/94 e do Decreto 2.109/97, de
05 de agosto de 1997, sendo oficialmente instalado em 12 de março de 1998, em
Blumenau, quando ocorreu a primeira eleição para a sua Diretoria (conf. BOHN,
2003). Ou seja, foi constituído antes mesmo da promulgação da Lei Federal
supracitada6 e sua origem esteve fundamentalmente relacionada à possibilidade de
constituir um mecanismo regional para o controle das enchentes que historicamente
afetam a região.
5 Sobre o tema da participação na gestão das águas veja-se, entre outros, Uller-Gómez (2006),
Machado & Cardoso (2000), Cardoso (2003), Valencio & Martins (2004), Guivant & Jacobi (2003),
Caubet (2004).
6 Alguns estados brasileiros, entre eles Santa Catarina, se anteciparam à Legislação Federal criando
sua própria Política de Recursos Hídricos.

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