Execução de Título Provisório: Instrumento de Efetividade e Tempestividade Processuais

AutorJúlio César Bebber
Páginas128-140

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1. ConsideraçÕes iniciais

A vida se transforma veloz e continuamente e impõe, por isso, novas dinâmicas. As pessoas têm pressa e exigem soluções adequadas e úteis para os seus problemas. Por isso, em tempos de pós-modernidade é preciso mais que apenas aplicar a lei e a legitimidade da jurisdição, em razão dessa circunstância, passa a repousar na eficiência e na tempestividade de seus pronunciamentos.

O sistema legal autoriza a execução imediata e completa de obrigação por quantia certa fixada em título judicial provisório (CLT, art. 899; CPC, art. 475-I, § 1º). A ausência de compreensão de que a efetividade e a tempestividade processuais são direitos constitucionais fundamentais protegidos pela (denominada) execução provisória1, e a interpretação preconceituosa e exagerada dos ônus e limitações impostos

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nos arts. 899 da CLT e 475-O do CPC, entretanto, desestimulam a utilização desse valioso instrumento processual e encorajam a prática de atos tendentes a retardar o cumprimento da obrigação.

Novas atitudes dos órgãos judiciários, portanto, são imprescindíveis para que acompanhem a atual realidade jurídica, que pode ser resumida como a da busca de um processo de resultados justos. Daí o interesse e a importância de estudar o presente tema, ainda que sucintamente, com vista ao debate e à refiexão.

2. Efetividade e tempestividade processuais

A efetividade e a tempestividade processuais são garantias constitucionais (CF, 5º, XXXV e LXXVIII) e:

  1. enunciam:

    (i) o afastamento do processo do plano meramente conceitual e técnico, a fim de torná-lo instrumento (político, social e jurídico) destinado a produzir transformações positivas e concretas no mundo empírico2.

    O processo, então, deve ostentar capacidade de propiciar àquele que tiver razão uma situação mais vantajosa do que possuía anteriormente ao ingresso em juízo3. Deve, pois, servir à realização da justiça subs-tancial, assegurando o maior grau de utilidade possível4;

    (ii) que o processo, embora exija certa duração no tempo, não deve permanecer pendente além do necessário, do essencial e do justo5. A demora excessiva na duração do processo torna a justiça inoperante.

  2. como direitos fundamentais, vinculam o Estado (eficácia vertical) e os particulares (eficácia horizontal) e não podem ser ignoradas. Em outras palavras: a efetividade e a tempestividade processuais são normas constitucionais que ostentam supremacia6 e revitalizam todas as normas

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    processuais infraconstitucionais que têm de ser interpretadas segundo o espírito constitucional.7

    Como as normas processuais infraconstitucionais (especialmente a CLT) ainda não assimilaram integralmente as garantias constitucionais, nem tampouco há condições para que isso ocorra em curto prazo, essa falha no sistema legal tem de ser suprida interpretativamente pelos juízes, cujo dever é o de implementar os desejos da Constituição. Esse dever, como ressaltado pelo Tribunal Constitucional da Espanha, "não é apenas moral. Trata-se de um dever jurídico-constitucional, uma vez que os juízes e tribunais têm a (...) obrigação de proteção eficaz do direito fundamental"8.

3. Execução de título definitivo e provisÓrio

A execução pode ser fundada em título definitivo ou provisório. Daí a razão das expressões usualmente utilizadas: execução definitiva e execução provisória. Não é a execução, porém, que é definitiva ou provisória, mas o título que a embasa. São:

  1. definitivos os títulos sobre os quais não há discussão sobre a certeza da obrigação, que somente poderá ser atingida por meio de ação autônoma (v. g.: ação rescisória). São eles, entre outros: os títulos extrajudiciais (CLT, art. 876, segunda parte); os acordos homologados judicialmente (CLT, art. 876, primeira parte); a sentença condenatória imutável - sentença com trânsito em julgado (CLT, art. 876, primeira parte)9;

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  2. provisórios os títulos sobre os quais há discussão sobre a certeza da obrigação, que poderá ser atingida por meio de recurso. São eles: a sentença e o acórdão condenatórios impugnados por recurso recebido sem efeito suspensivo (CLT, art. 899).

    Adequadas seriam, então, as expressões: execução fundada em título definitivo e execução fundada em título provisório.

4. Execução completa e incompleta

A execução pode ser completa ou incompleta, segundo a possibilidade de esgotamento dos seus atos. Será:

  1. completa a execução quando houver permissão para o esgotamento dos atos destinados à satisfação da obrigação retratada no título executivo, seja ele definitivo ou provisório. Ex.: execução de sentença condenatória impugnada por recurso recebido sem efeito suspensivo em que o exequente presta caução (CPC, art. 475-O, III - segunda parte), ou em que a caução é dispensada (CPC, art. 475-O, § 2º);

  2. incompleta a execução quando não houver permissão para o esgotamento dos atos destinados à satisfação da obrigação retratada no título executivo, seja ele definitivo ou provisório. Nesse caso, veda-se a prática de atos que abranjam o levantamento de depósito em dinheiro e alienação de domínio (CPC, art. 475-O, III - primeira parte). Ex.: execução de sentença condenatória transitada em julgado suspensa para processamento de impugnação (CPC, art. 475-M).

Não se deve confundir nem identificar, portanto, execução completa com execução definitiva e execução incompleta com execução provisória. A execução, como ressaltado acima, pode ser completa (esgotar todos os seus atos), mesmo fundada em título provisório10, e incompleta, mesmo fundada em título definitivo.

5. Execução de título provisÓrio no processo do trabalho

A execução fundada em título provisório no processo do trabalho está prevista no art. 899 da CLT, que assim dispõe: "os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo (...), permitida a execução provisória até a penhora".

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Trata-se de regra autossuficiente?

Duas são as principais correntes existentes:

  1. a primeira, que sustenta que a regra do art. 899 da CLT é autossuficiente e nega, por isso, a aplicação subsidiária do art. 475-O do CPC (que julga incompatível com o sistema processual trabalhista)11;

  2. a segunda, que sustenta que a regra do art. 899 da CLT é insuficiente, sendo, por isso, suprível pela aplicação subsidiária do art. 475-O do CPC (absolutamente compatível com o sistema processual trabalhista).12

Em nome de um legalismo (formalismo) injustificável e extremado, a corrente que sustenta a autossuficiência do art. 899 da CLT produz um comportamento contemplativo e gera estancamento, uma vez que revela exclusiva preocupação com a questão dogmática (conformação com a sistematização exegética), deixando de lado o novo sistema constitucional (que informa e fundamenta o direito processual), a mudança de paradigmas (processo de resultados justos), a realidade e a angústia das pessoas.

Não se deve ignorar a autonomia do direito processual do trabalho. Essa autonomia, entretanto, não pode ter função meramente científica, sob pena de refrear o desenvolvimento. Embora autônomo, o direito processual do trabalho não cons-

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titui um reino independente. E, por isso mesmo, a generalidade do art. 899 da CLT autoriza a utilização de algumas regras e parâmetros objetivos do art. 475-O do CPC.

6. Execução de título provisÓrio - regras e parâmetros objetivos

À execução de sentença (e acórdão) condenatória impugnada por recurso recebido sem efeito suspensivo (título provisório) aplicam-se as mesmas disposições da execução de título definitivo (CPC, art. 475-O, caput). Como, porém, a existência de recurso importa em pendência da declaração de certeza da obrigação, o sistema legal estabelece algumas regras. São elas:

1ª regra: a execução de título provisório deve ser iniciada de ofício, a despeito da literalidade do art. 475-O, I, do CPC.

Apesar de o inc. I do art. 475-O do CPC dizer que a execução de título provisório corre por iniciativa do exequente, deverá o juiz, de ofício, dar início a ela (CLT, art. 878), uma vez que representa mecanismo para atingir a efetividade e a tempestividade processuais, que são direitos fundamentais (CF, art. 5º, XXXV e LXXVIII) com eficácia vertical. Vale dizer: obrigam o Estado, que tem o dever de atuar para sua concretização. A iniciativa na execução de título provisório, portanto, não constitui prerrogativa da parte. Há, entretanto, quem objete a iniciativa oficial13, tendo em vista que o exequente se obriga:

  1. a reparar os danos que o executado vier a sofrer caso a sentença seja reformada ou anulada, cabendo a ele, por isso, decidir se deseja correr o risco14. O fato de o exequente responder objetivamente pelos prejuízos causados ao executado não retira do juiz a possibilidade de atuar de ofício. O autor também responde objetivamente pelos danos que a medida cautelar causar ao réu (CPC, art. 811, I) e, mesmo assim, faculta-se a atuação oficial do juiz (CPC, art. 798);

  2. a apresentar as peças processuais indispensáveis à formação de autos suplementares (CPC, art. 475-O, § 3º). Embora também já tenha feito

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    essa afirmação15, simples refiexão lógica revelou-me a concluir pela sua incorreção, uma vez que nada impede (e tudo recomenda) que o juiz determine ao interessado ou à secretaria que apresente ou extraia as peças processuais necessárias à formação de autos suplementares.

    2ª regra: o exequente se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido (CPC, art. 475-O, I).16

    Duas observações são necessárias:

  3. a responsabilidade do exequente pelos prejuízos causados com a execução de título provisório é objetiva17, uma vez que...

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