Considerações sobre a terceirização no direito brasileiro

AutorGisele Leite
CargoMestre em Direito (UFRJ) Doutora em Direito (USP)
Páginas20-25

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A terceirização pode ser entendida como transferência de certas ati-vidades periféricas do tomador de serviços, passando a ser exercidas por empresas distintas e especializadas.

Na ótica do direito do trabalho verifica-se o trabalhador prestando serviços ao tomador, mas possuindo relação jurídica distinta do vínculo trabalhista. E, assim, a relação passa a ser triangular ou tri-lateral posto que na terceirização o empregado da empresa prestadora executa serviços para o tomador.

Identifica-se o contrato de trabalho entre o empregado e o empregador que é uma empresa prestadora de serviços. O vínculo entre o tomador (quem terceirizou as atividades) e a empresa prestadora decorre de outro contrato, de natureza civil ou comercial e cujo objeto é a prestação de serviços empresariais.

Havendo terceirização de atividade ou serviço pela administração pública, tem-se a figura do contrato administrativo firmado com a prestadora de serviço e em geral precedido de licitação.

A terceirização expõe um panorama diferenciado, pois, tradicio-nalmente, a relação jurídica de emprego é bilateral, ou seja, contém apenas os sujeitos como empregado e empregador, que é também o tomador do serviço.

A terceirização é fenômeno verificado com grande frequência, tida como uma solução hábil para a diminuição de custos e para prover maior eficiência, produtividade e competitividade na prestação de serviços que correspondem aos ob-jetivos fartamente almejados pela globalização.

No âmbito trabalhista existem restrições impostas à terceirização tendo em vista respeitar as garantias inerentes à relação empregatí-cia, e de forma a preservar o valor constitucional do trabalho (previsto expressamente nos arts. Io, inciso IV, e 170, caput, da CF/1988) e, ainda em respeito ao magno princípio da dignidade da pessoa humana, que é um dos fundamentos da república brasileira.

O Tribunal Superior do Trabalho possui verbete sobre a terceirização, a Súmula 331: "Contrato de prestação de serviços. Legalidade (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011

1 - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo direta-mente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lein. 6.019, de 03.01.1974).

II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta oufun-dacional (art. 37, II, da CF/1988). III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei n. 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à

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atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a respon-sabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n. 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalizagáo do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida respon-sabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. VI - A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abran-ge todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral."

A terceirização conforme frisa a vigente ordem econômica e social, e que assumiu a nobre missão de realizar a justiça social com base na valorização do trabalho como condição da dignidade humana, a harmonia e solidariedade entre as categorias sociais de produção e a expansão das oportunidades de emprego produtivo, desmeretiza muito dos princípios consagrados pelo direito do trabalho e mesmo provoca sua involução.

A terceirização no direito do trabalho, conforme o Enunciado 256 do TST aprovado em setem-bro de 1986, expunha que esta era apenas admitida como exceção, ou seja, em forma restrita, somente nas duas hipóteses previstas em lei (trabalho temporário e serviço de vigilância).

Em dezembro de 1993, referido verbete foi substituído pelo Enunciado 331 do TST, que apresenta nítida ampliação quanto à possibi-lidade de terceirização considerada lícita, conforme se verifica em seu inciso III. Além disso, o inciso IV da Súmula 331 atribui mera responsabilidade subsidiária à empresa tomadora, e não solidária, a qual é mais coerente com o escopo de proteção, inerente ao direito ao trabalho.

Resta evidente, portanto, essa mo-dificacáo da jurisprudência no plano histórico, em prejuízo dos princípios fundamentais do direito do trabalho. Aliás, na atual Súmula 331 tem-se como lícita a contrata-ção de serviços de vigilância (Lei 7.102/83), de conservação e limpe-za, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta (inciso III da Súmula 331 do TST).

Assim, a terceirização de ativi-dade-fim, em princípio, não é admitida.

É relevante esclarecer o que vem a ser atividade-meio, que é aquela de mero suporte, que não integra o núcleo ou essência das atividades empresariais do tomador, sendo atividade-fim, portanto, aquela que a compõe.

Quanto à pessoalidade. que é requisito da relação empregatí-cia mencionado no art. 2o, caput, da CLT, significa a prestação de serviços pelo próprio trabalhador (pessoa física conforme o art. 3o da CLT), sem que...

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