Efeitos do Ruído no Organismo

AutorTuffi Messias Saliba
Ocupação do AutorEngenheiro Mecânico. Engenheiro de Segurança do Trabalho. Advogado. Mestre em Meio Ambiente. Ex-professor dos cursos de Pós-Graduação de Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho. Diretor Técnico da ASTEC ? Assessoria e Consultoria em Segurança e Higiene do Trabalho Ltda.
Páginas91-101

Page 91

Ver Nota78

Neste capítulo, pretendemos fazer uma pequena abordagem acerca do tema ruído, sob o ângulo médico. Na verdade, o tema é extenso e não teríamos a pretensão de esgotá-lo em poucas linhas. Preferimos tecer comentários breves que pensamos poder ser entendidos sobretudo por proissionais não médicos, já que os médicos (especialmente os do trabalho) têm nesse tema um campo frequente de estudo.

Logo a princípio, vamos apenas lembrar que ruído, tecnicamente, não é sinônimo de barulho. “Ruído” é uma mistura de sons; “barulho”, por sua vez, é o som que incomoda (logo, esse último conceito inclui componentes subjetivos). “Som” é a vibração capaz de ser detectada pelo ouvido humano (entendendo-se “vibração”, grosseiramente, como o movimento, para um lado e para outro, das partículas de um corpo). Neste texto, usaremos o termo “ruído”, já consagrado pelo uso.

Mas como se forma o som no ouvido humano? De modo resumido, é o seguinte: a audição humana se processa graças à ação do chamado “aparelho auditivo”, ou seja, um conjunto de estruturas com funções diferentes e complementares que resultam na capacidade de uma pessoa perceber e entender um som. O aparelho auditivo é dividido em três partes: ouvido externo, ouvido médio e ouvido interno. A energia que produzirá o som é recebida no ouvido externo (conhecido popularmente como “orelha”) e se propaga através de um pequeno “corredor”, ainda pertencente ao ouvido externo, que é o “meato acústico externo”, até uma membrana chamada “tímpano”. Ao

Page 92

receber a energia que vinha se propagando, o tímpano se movimenta. Os seus movimentos são transmitidos por uma pequena cadeia de três ossículos (os menores ossos do corpo humano, que compõem o ouvido médio com o tímpano e dois pequenos músculos) até o ouvido interno. O ouvido interno preenche uma cavidade situada na estrutura óssea do crânio, tem componentes distintos e ainda é preenchido por um líquido. Dentre os componentes do ouvido interno, destacase aquele conhecido como “cóclea”. No interior da cóclea, há uma estrutura chamada “órgão de Corti”, que contém milhares de células sensoriais conhecidas como “células ciliadas”.

Quando essas células são apropriadamente estimuladas (pela energia que vem se propagando pelos ouvidos externo e médio), geram impulsos nervosos, que são transmitidos ao cérebro pelo chamado “nervo auditivo”. Esses impulsos são “decifrados”: a pessoa percebe o som.

Quando a energia (vibração) que excita as células ciliadas da cóclea é resultado da cadeia de eventos descrita acima, dizemos que houve a chamada “condução aérea” do som. Quando o som vibra dire-tamente o crânio e/ou vibra as paredes do meato acústico externo, que estimulam a cóclea, ocorre a “condução óssea”. O órgão sensitivo inal, a cóclea, é o mesmo: somente varia o caminho para a sua excitação.

Não devemos confundir “condução aérea” ou “condução óssea” com “hipoacusia condutiva” e “hipoacusianeurossensorial” (ou sensorioneural). A hipoacusia (diminuição da capacidade de audição) pode ser devida a uma lesão ou obstáculo no ouvido externo ou médio; nesses casos, podemos dizer que se trata de uma hipoacusia condutiva, ou seja, o som não está sendo adequadamente conduzido até o órgão sensorial que é a cóclea (ex.: excesso de cera no ouvido externo, otites etc.). Se a hipoacusia for decorrente de uma lesão no ouvido interno ou do nervo auditivo, então será denominada hipoacusianeurossensorial, ou seja, não está havendo funcionamento adequado da cóclea e/ou do nervo auditivo. A hipoacusia também pode ser mista, isto é, tanto a porção condutiva quanto a porção neurossensorial apresentam-se com problemas.

Como qualquer outra função do corpo humano, há um ponto de equilíbrio para o funcionamento adequado do aparelho auditivo. Como qualquer outra função do nosso corpo, tanto o aparelho auditivo precisa ser exercitado e estimulado para o seu desenvolvimento e aprimoramento, como sofrerá exaustão se for por demais exigido e exposto a agentes que possam lesá-lo. Além disso, é necessário lembrar que o aparelho auditivo pode sofrer uma diminuição gradual de sua acuidade em

Page 93

virtude do próprio envelhecimento da pessoa (é o que se denomina “presbiacusia”). O aparelho auditivo ainda pode ter comprometimento no seu “conforto” e mesmo no seu funcionamento, em virtude da própria poluição sonora, presente sobretudo nos grandes centros urbanos (trânsito, discoteca, competições com veículos motorizados, fones para ouvir música, aparelhos eletrodomésticos etc.).

Como parte integrante e nada dispensável do organismo humano e sendo suscetível a lesões e perdas, devemos nos preocupar com a manutenção da audição em níveis pelo menos adequados à boa convivência humana. No caso do ruído no ambiente de trabalho, especiicamente, é inadmissível haver perdas auditivas gratuitas, já que são conhecidos alguns elementos que podem impedir o surgimento ou a progressão dessas perdas (diminuição do tempo de exposição ao ruído, redução do ruído ambiental, uso efetivo de EPI etc.). Havendo lesão, sobretudo de maior monta, há prejuízo para a economia orgânica e uma função previamente normal, ou dentro de certo limiar pode progredir para um quadro de deiciência auditiva. A existência de lesão já garante, por si só, o direito à arguição de indenização pelo dano sofrido. É importante lembrar que a diminuição da acuidade auditiva induzida pelo ruído ainda não é reversível (assim como aquela causada pelo envelhecimento normal da pessoa). É igualmente importante, então, que a pessoa não seja exposta desnecessariamente a esse potencial de lesão em sua capacidade auditiva — há de se prevenir.

Não devemos perder de vista que tanto a legislação trabalhista como a previdenciária tratam do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT