Dos dissídios coletivos - (arts. 856 a 875)

AutorEduardo Gabriel Saad
Ocupação do AutorAdvogado, Professor, Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Ex-Procurador Chefe do Ministério Público do Trabalho, em São Paulo
Páginas1272-1304

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SEÇÃO I Da instauração da instância

Art. 856.

A instância será instaurada mediante representação escrita ao presidente do Tribunal. Poderá ser também instaurada por iniciativa do presidente, ou, ainda, a requerimento da Procuradoria da Justiça do Trabalho, sempre que ocorrer suspensão do Trabalho.

NOTAS

1) Ver nossa nota ao art. 616.

2) Dissídio Coletivo. Petição inicial: Várias questões defluem do dispositivo aqui sob comentário. Examinemos as principais delas.

Diz o preceito, imperativamente, que a peça inicial do processo de dissídio coletivo é a representação escrita da associação sindical, seja ela de empregados ou de empregadores. Inadmite, portanto, uma representação verbal como acontece e é aceito nos dissídios individuais.

Em consonância com o disposto no § 2º do art. 114 da Constituição Federal, com nova redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/2004, "recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente".

Alguns intérpretes dessa norma constitucional chegaram a dizer que só as organizações sindicais poderiam instaurar a instância do dissídio coletivo e, decorrentemente, ficaria invalidado o artigo em epígrafe na parte em que dá, ao Presidente do Tribunal do Trabalho ou à Procuradoria da Justiça do Trabalho, a iniciativa do processo em questão sempre que ocorrer a paralisação do trabalho.

A Lei Maior confere às associações sindicais uma faculdade e não uma prerrogativa ou, melhor explicitando nosso pensamento, não declara ser exclusivamente daquelas associações o direito de instaurar a instância do dissídio coletivo.

Destarte, não conflita com o sobredito dispositivo constitucional o que se contém no art. 856 da CLT e que ora examinamos. Assim, em nosso entendimento fica mantido o direito do Presidente do Tribunal do Trabalho ou da Procuradoria da Justiça do Trabalho de dar início ao processo de dissídio coletivo quando tiver lugar a cessação coletiva de trabalho.

No caso particular do Ministério Público do Trabalho, cabe-nos observar que, mercê da Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, tem ele a faculdade de requerer a instância do dissídio coletivo quando este ameaçar a ordem jurídica ou o bem-estar coletivo em paralisação do trabalho em atividade considerada essencial. Essa norma foi alçada ao patamar constitucional, como se infere da leitura do § 3º, do art. 114, com redação dada pela EC n. 45/04: "Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito". Se a paralisação não for em atividade essencial, com possibilidade de lesão a interesse público, por certo que fica o Parquet manietado diante de um conflito coletivo de trabalho.

2.1) Sindicato de funcionários públicos. Impossibilidade de ajuizar dissídio coletivo: Iterativa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pela impossibilidade jurídica de o sindicato de funcionários públicos propor ação de dissídio coletivo. Isso porque é reconhecido que inexiste lei que discipline o direito de greve do servidor público, como previsto na Constituição.

Alega-se, na Corte Suprema, que as disposições constitucionais atinentes ao orçamento vedam ao Poder Judiciário a decretação de aumentos de vencimentos do funcionalismo.

De outra parte, a Justiça do Trabalho não seria competente para conhecer e julgar tal ação.

É impetrável, na hipótese, o mandado de injunção. Se acolhido pela Corte Suprema, resultará, apenas, numa recomendação ao Congresso Nacional para que regulamente o correspondente dispositivo constitucional.

2.2) Dissídio Coletivo de Greve. Deliberação em assembleia e comunicação ao empregador: Consoante a Lei n. 7.783, de 28.6.89, a decisão tomada pela assembleia de paralisar o trabalho deve ser comunicada aos empregadores com 48 horas de antecedência se a atividade não for essencial e, se o for, será de 72 horas o pré-aviso. Esse diploma legal deixa claro, em seu art. 3º, que é obrigatória a negociação coletiva antes da deflagração da greve.

O artigo sob comentário não conflita com o art. 9º, nem com o art. 114, II, da Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/ 2004. É conservada a faculdade de a Presidência do Tribunal do Trabalho instaurar, de ofício, a instância do dissídio coletivo quando ocorrer a cessação coletiva do trabalho em atividade essencial, ou não, à sociedade. Já o Ministério Público do Trabalho, por força da nova redação do § 3º, do art. 114, dada por essa mesma Emenda, só pode requerer a instauração da instância no caso da greve ser desencadeada em atividade essen-cial à sociedade.

V. nota 1.4 do art. 643, da CLT sobre a greve em atividade essencial e não essencial à sociedade. Titularidade da ação.

2.3) Frustração da negociação coletiva. Possibilidade de arbitragem: Dispõe o § 1º do art. 114, II, da Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/04, que "frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros".

O legislador constituinte, em outro ponto da Carta Magna, também dá realce ao seu desejo de que a greve seja a etapa final de um processo em que a primeira parte seja constituída de negociações coletivas. No art. 8º é estabelecido que o sindicato deve, sempre, participar da negociação coletiva.

O art. 3º da Lei n. 7.783/89 reza que "frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recurso da via arbitral" é legítima a decretação da greve. É este o dever legal de as partes buscarem a autocomposição.

A 23 de setembro de 1996, sancionou-se a Lei n. 9.307 dispondo sobre a arbitragem e destinada a dirimir os litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.

Em nossa opinião, o instituto, agora regulado por lei especial, é aplicável aos dissídios individuais e coletivos do trabalho.

É certo, porém, que se notam sérias resistências ao uso da arbitragem na esfera das relações individuais e coletivas do trabalho.

2.4) Competência da Justiça do Trabalho para executar suas próprias decisões: O caput do art. 114 da Constituição Federal/88 dizia que a Justiça do Trabalho tinha competência para apreciar "os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas". Com a Emenda Constitucional n. 45/04, houve a supressão dessa afirmação, o que poderia se pensar que a Justiça do Trabalho teria perdido o poder de executar suas próprias sentenças. Todavia, como essa Emenda afirmou no inciso IX, desse art. 114, que, mediante lei, outras controvérsias decorrentes da relação do trabalho são de competência da Justiça do Trabalho, observa-se que já existe lei ordinária nesse sentindo, qual seja a que diz caber ao juiz executar suas próprias decisões

(v. art. 659, II; art. 680, a e art. 707, c e d, todos da CLT).

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Sentença prolatada em processo individual de trabalho, sendo condenatória, é cumprida por meio da execução que obedece às disposições próprias da CLT subsidiadas pela Lei n. 6.830, de 22.9.80 e, também, pelo Código de Processo Civil (art. 15, CPC/15).

Quanto às sentenças normativas, que põem fim ao dissídio coletivo, há nesta Consolidação a ação de cumprimento. E o constituinte manifesta, claramente, sua decisão de que tal ação só é viável para cumprir uma sentença normativa e deixa de lado os pactos coletivos.

Certo é que o Texto Maior se refere a certas obrigações estranhas à relação de trabalho e criadas, até há pouco tempo, pelas sentenças normativas e mesmo por pactos coletivos.

Trata-se da cobrança da taxa assistencial e da contribuição confederativa.

Finalmente, o TST assentou serem tais contribuições estranhas à relação de trabalho e, por isso, lhe era defeso dar eficácia a tal cobrança nas sentenças normativas.

Com a superveniência da Lei n. 8.984, de 7.2.95, incluiu-se na competência da Justiça do Trabalho o julgamento de litígios que se originarem do cumprimento de convenções ou de acordos coletivos do trabalho, mesmo que neles sejam partes sindicatos ou sindicato de trabalhadores e empregador.

Essa lei está de acordo com o inciso IX, art. 114, da Constituição Federal/88, com redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/04, no sentido de competir à Justiça do Trabalho processar e julgar "outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei".

O Superior Tribunal de Justiça já vinha decidindo, com fulcro nessa nova norma legal ordinária, que competia à Justiça do Trabalho conhecer e julgar dissídios tendo por objeto a cobrança das taxas assistencial e confederativa.

A Lei n. 8.984 é constitucional. Funda-se no inciso IX do art. 114 da Constituição Federal onde se declara que a Justiça do Trabalho, tem competência de processar e julgar as ações decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.

Mas, repetimos, o Superior Tribunal de Justiça já vinha, sistematicamente, declarando caber a competência, no caso, à Justiça do Trabalho.

Por oportuno registramos aqui o fato de que a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, a 24 de setembro de 1996, "julgou o Recurso Extraordinário n. 197.911-9 PE (in Rev. LTr 60-10/1304 - de outubro de 1996) e "reconheceu que, se por um lado, o poder normativo da Justiça do Trabalho opera no branco da lei, ou seja, é normativo, estabelecendo condições de trabalho que inovam no mundo jurídico, por outro, deixou assente que as cláusulas instituídas em sentença normativa não podem sobrepor-se ou contrariar a legislação em vigor, sendo defeso à Justiça Laboral estabelecer normas ou condições vedadas pela...

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