Um dos Caminhos para uma Ordem Jurídica Justa

AutorValdenir Cardoso Aragão
Ocupação do AutorAdvogado em Rio Grande/RS; Especialista em Direito Empresarial pela PUC/RS.
Páginas623-643

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Jurídica JustaJurídica Justa
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SUMÁRIO: Introdução. 1 Justiça. 1.1 Conceito de Justiça. 1.2 Justiça como Equidade. 1.3 Justiça Social. 2 Acesso à Justiça. 2.1 O Acesso à Justiça: um Direito Fundamental. 2.2 Conceituação de “Acesso à Justiça”. 2.3 Acesso à Justiça e o Poder Judiciário. 3 Juizados Especiais Cíveis. 3.1 O Surgimento da Lei nº 9.099/95 como Facilitadora do Acesso à Justiça. 3.2 Princípios dos Juizados Especiais. 3.2.1 Princípio da Oralidade. 3.2.2 Princípio da Simplicidade e da Informalidade. 3.2.3 Princípio da Economia Processual.
3.2.4 Princípio da Celeridade. 4 Considerações Finais. 5 Bibliografia.

Introdução

IntroduçãoIntrodução
IntroduçãoIntrodução

“A idéia de justiça está presente em todos momentos, é motivo de reflexão em todos os povos, em todos os tempos, é um desejo marcado no sonho de cada pessoa.”1De acordo com uma abordagem ampla, o acesso à justiça tem o sentido de uma assistência judiciária essencial ao bom andamento da justiça como um todo, e também fora dela, com ou sem conflito específico, uma assistência que possa cobrir inclusive serviços de informação e de orientação, juntamente com um estudo crítico, por vários especialistas do saber humano, do ordenamento jurídico existente, buscando soluções para sua aplicação mais correta e justa.

Quando se fala na expressão “acesso à justiça”, pensa-se, logo, numa Justiça eficaz, acessível aos que precisam dela e em condições de dar

* Advogado em Rio Grande/RS; Especialista em Direito Empresarial pela PUC/RS; Pesquisador do Núcleo de Pesquisas (CNPQ) “Limites da Jurisdição” junto ao Programa de Pós-Graduação em Direito da PUC/RS; Mestrando em Direito pela PUC/RS.

1 TORRES, Jasson Ayres. O acesso à justiça e soluções alternativas. Porto Alegre: Livraria do

Advogado, 2005, p. 23.

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respostas imediatas às demandas; enfim, uma Justiça capaz de atender a uma sociedade que esta em constantes transformações.

Entretanto, o acesso à justiça não fica somente reduzido ao sinônimo de acesso ao Judiciário e suas instituições, mas sim, a uma ordem de valores e direitos fundamentais ao ser humano.

Dessa forma, é necessário conceituar o significado da palavra justiça, identificada como uma ordem de valores e direitos fundamentais, assim como o acesso à justiça que constitui a principal garantia dos direitos subjetivos, em torno do qual sustentam todas as garantias destinadas a promover a efetiva tutela dos direitos fundamentais amparados pela nossa Constituição.

Não obstante, para que se possa falar em um efetivo acesso à justiça é compreensível que exista um direito material legítimo voltado a realização da justiça social, de instituições estatais preocupadas com a solução de problemas sociais munidas da plena realização do direito, concretizado através de Poder Judiciário em perfeita sintonia com a sociedade.

1 Justiça 1 Justiça1 Justiça 1 Justiça1 Justiça

1.1 Conceito de Justiça
1.1 Conceito de Justiça1.1 Conceito de Justiça


1.1 Conceito de Justiça1.1 Conceito de Justiça

Afinal, o que vem a ser justiça Justiça social, justiça para os pobres, para os pequenos, justiça para todos, justiça para os indigentes, justiça para os fracos, justiça para os excluídos. Conceituar justiça é uma difícil tarefa, ter justiça é assemelhar-se com o justo, o correto, o mais certo, o mais seguro Qual seria o conceito de uma sociedade justa

Questões que trazem à tona o significado de Justiça, palavra que tem sua simbologia apresentada em forma de uma deusa que possui os olhos vendados, que está segurando em uma de suas mãos uma espada e, na outra mão, a balança. Ela representa a imparcialidade que deve ser essencial para mediação entre partes em conflito, significando tratamento igual consoante às regras correspondentes, isto é, todos são iguais perante a lei, os olhos vendados demonstram a igualdade, a balança representa atribuir a cada pessoa exatamente o que lhe cabe, e finalmente a espada simboliza a dupla tarefa, a de punir e proteger.

Uma das primeiras concepções de justiça foi atribuída por Aristóteles, funda-se em virtude e bem comum. Os procedimentos jurídicos seriam

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UM DOS CAMINHOS PARA UMA ORDEM JURÍDICA JUSTA 625 tão mais justos e, conseqüentemente mais legítimos, na medida em que fossem capazes de produzir o ideal de vida e o sentido do bem comum. Segundo Aristóteles, a justiça seria “uma virtude completa, porém não em absoluto e sim em relação ao nosso próximo. Por isso a justiça é muitas vezes considerada a maior das virtudes.”2Para Jasson Ayres Torres “o ideal de justiça é valorizado por quem procura o Poder Judiciário para resolver um problema e encontra a aplicação do direito com segurança e respeito. A indagação sobre o significado de justiça tem levado os estudiosos a muitas reflexões.”3Agnes Heller4observa que a justiça precisa ser impessoal e imparcial, não podendo se influenciada pelo sentimento de gostar ou não gostar, por paixão ou interesse, nem ser de tal modo influenciada por caridade, piedade ou grandeza de coração. Precisa ser justa, e por vezes até cruel, diz o autor:

Ser justo (no sentido do conceito formal de justiça) é resultado de prática. É preciso aprender o hábito de ser justo. “Imparcialidade” não implica que não se possa perseguir interesses, que não se possa gostar de alguns e desgostar de outros, que não se possa ser apaixonado, ciumento ou invejoso, que não se possa ter “bom coração”. Significa apenas aplicar as mesmas normas e regras consistentemente, independente do interesse pessoal e envolvimento emocional (cordial e positivo, ou não). Em geral, presume-se que pessoas altamente emotivas são menos capazes de praticar justiça [...]. Ser justo significa cobrir uma certa área, não iluminando um único ponto. Pessoas genuinamente justas são quase sempre conscientes do caráter estimativo de justiça, Se, acidentalmente, cometem uma injustiça devido à ignorância, avaliação incorreta, ao falso caráter de informação disponível (se forem iludidas), elas retificarão isso, fazendo um julgamento justo de si próprias e pedindo desculpas ao ofendido5.

Otfried Hoffe6acentua que o convívio humano possui dois lados, os quais correspondem a dois conceitos de justiça. Um com relação a

2 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução: Leonel Vallandro e Gerd Bornheim. São Paulo: Abril Cultural, Coleção “Os Pensadores”, 1984, p. 122.

3 TORRES, Jasson Ayres. Op. cit., p. 21.

4 HELLER, Agnes, Além da justiça. Tradução: Savannah Hartmann. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998, p.27.

5 Idem, p. 29-30.

6 HOFFE, Otfried. O que é Justiça. Tradução: Peter Naumann. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2003, p.
33.

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instituições e sistemas sociais, a moral devida é denominada justiça institucional ou objetiva, no caso do direito e do Estado, também denominada justiça política. No caso do entendimento personalista ou subjetivo, justiça significaria aquela honradez que não cumpre as exigências da justiça institucional apenas ocasionalmente e por medo de castigos, mas de forma voluntária e constantemente.

Para Norberto Bobbio a palavra Justiça é baseada em um conceito normativo, “é um fim social, da mesma forma que a igualdade ou a liberdade, ou a democracia ou ao bem-estar.”7O conceito formal de justiça é a aplicação consistente e contínua das mesmas normas e regras a cada um dos membros de uma comunidade social aos quais elas se aplicam. A conseqüência da sua não observância do regramento é a autocontradição8.

Assim, há dois caminhos distintos a percorrer para se deixar agir, julgar e classificar sob a direção da máxima justiça. O primeiro, se as normas e regras não são aplicadas aos membros de um grupo social particular ao qual elas deveriam ser aplicadas e, em segundo, se a aplicação de normas e regras que deveriam ser aplicadas é inconsciente ou descontínua.

Agnes Heller9dá um exemplo bem simples de conceito formal de justiça. Ele explica que para entrar em determinado curso de Direito de uma universidade, existe uma regra determinada, no qual um aluno precisa alcançar no seu Certificado de Segundo Grau a soma de 340 pontos ou mais. Destacando que tal regra não torna todos os alunos “parecidos”, nem mesmo com relação à sua capacidade mental, mas igualados pela regra, pois, assim, atinge a todos. Dessa forma, qualquer aluno que atinja essa pontuação ou mais e não for admitido no curso de Direito, haverá um caso de injustiça.

1.2 Justiça como Eqüidade
1.2 Justiça como Eqüidade1.2 Justiça como Eqüidade


1.2 Justiça como Eqüidade1.2 Justiça como Eqüidade

A justiça como eqüidade aparece na obra Teoria da Justiça, lançada em 1971, do pensador americano John Rawls, enfoca a justiça como base de um novo contrato social. Ele aborda um ponto de vista ético-normativo

7 BOBBIO, Norberto; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Brasília: Universidade de Brasília, 1992, p. 660.

8 HELLER, Agnes. Op. cit., p. 20.

9 Idem, p. 21-22.

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UM DOS CAMINHOS PARA UMA ORDEM JURÍDICA JUSTA 627 e concentra-se numa pergunta de ordem política: como construir uma sociedade moderna bem ordenada segundo os princípios da justiça10John Rawls em sua obra escreve:

A justiça é a primeira virtude das instituições sociais, como a verdade o é dos sistemas de pensamento. Embora elegante e econômica, uma teoria deve ser rejeitada ou revisada se não é verdadeira; da mesma forma leis e instituições, por mais eficientes e bem organizadas que sejam, devem ser reformadas ou abolidas se são injustas. Cada pessoa possui uma...

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