Do juiz

AutorBassil Dower, Nelson Godoy
Ocupação do AutorProfessor Universitário e Advogado em São Paulo
Páginas371-394

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Do Juiz

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DO JUIZ

Sumário: 25.1 Apre se nta ç ã o / 25.2 A po siç ã o do juiz na s so c ie da de s o rg a niza da s / 25.3 Situa ç ã o do juiz na re la ç ã o pro c e ssua l
25.4 Po de re s que po ssui o juiz / 25.4.1 Po de r de po líc ia / 25.4.2 Po de r jurisdic io nal / 25.5 De ve re s do juiz / 25.5.1 De ve r de dirig ir o pro c e sso c o nfo rme a s dispo siç õ e s do Có dig o / 25.5.2 Ob rig a ç ã o de de c idir e de de spac har / 25.5.3 De c idir a lide no s limite s e m que fo i pro po sta
25.5.4 Impe dir a prá tic a de simula ç ã o o u a prá tic a ma lic io sa do Dire ito / 25.5.5 Orde nar as dilig ê nc ias ne c e ssárias à instruç ã o do pro c e sso e inde fe rir a s inúte is e pro te la tó ria s / 25.5.6 Indic a r na se nte nç a o s mo tivo s q ue lhe fo rma ra m o c o nve nc ime nto da de c isão / 25.5.7 Co nc luir o julg a me nto do s pro c e sso s c uja instruç ã o ho uve r inic ia do e m a udiê nc ia / 25.5.8 De c la ra r-se suspe ito o u impe dido no s c a so s pre visto s e m le i / 25.6 Re spo nsa b ilida de do juiz po r pe rda s e da no s.

25.1 APRESENTAÇÃO

Sujeito do processo são o juiz e as partes. Destas já focalizamos anteriormente; agora trataremos da figura principal da relação processual: o juiz, que é a pessoa natural investida de atribuições jurisdicionais para dirimir a lide. É o principal sujeito da relação processual e, apesar de atuar como órgão do Estado, não está no processo em nome próprio como pessoa física, mas como mero representante do Estado.

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25.2 A POSIÇÃO DO JUIZ NAS SOCIEDADES

ORGANIZADAS

Compreende-se quão difícil é a atuação do juiz nas sociedades organizadas, se entendermos que sua missão consiste em distribuir justiça, em dar a cada um o que é seu, através da aplicação da lei em cada caso concreto, podendo, com isso, enfrentar a ira dos poderosos contra o seu arbítrio.

Por ser ele um dos sujeitos da relação processual, é freqüentemente alvo de críticas e incompreensão. Não pode envolver-se nas causas para não comprometer a justiça de suas sentenças, nem pode ficar isolado e distante dos problemas que abalam o homem, pois assim não poderia compreendê-los. A complexidade de sua profissão torna-o duro e inacessível, para poder assim ser justo e encontrar a verdade na penosa tarefa que lhe cabe na sociedade.

Para que o juiz possa atuar com imparcialidade, o próprio direito constitucional houve por bem dar-lhe diversas garantias, como a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade dos seus vencimentos (art. 95). Munidos desses poderes, o magistrado pode tornar-se, durante o seu exercício jurisdicional, o verdadeiro intérprete das normas legais e aplicá-las às situações de fato.

Enfim, como representante do Estado e como homem público e servidor da pátria, é apontado como exemplo de moral e de ética, o centro controlador e fiscalizador do bem-estar de seus comarcanos.

25.3 SITUAÇÃO DO JUIZ NA RELAÇÃO

PROCESSUAL

A relação processual de natureza litigiosa é jurídica por ligar o autor, o réu e o juiz, de modo recíproco, todos eles tendo ao mesmo tempo, direitos e deveres mútuos consoante determinam as leis processuais. O juiz não é propriamente sujeito em nome próprio, porém agente do próprio Estado, com atribuição específica de julgar e aplicar a lei aos casos concretos. Por essa razão, ele se coloca ao lado e acima das partes, em posição de absoluta imparcialidade, como terceiro desinteres-

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sado, independente, eqüidistante dos interesses das partes. Não é o dominus litis, mas o agente da soberania nacional que se encontra na relação jurídica processual, devido ao fato de a lei vedar ao particular a auto-tutela.

Em suma, na relação jurídica processual, o juiz é um dos sujeitos processuais (sujeito passivo); nunca é parte no conflito, por não ter qualquer interesse na decisão da causa, exceto o de solucionar o litígio.

Na jurisdição de natureza voluntária, a função do juiz consiste em auxiliar os interessados a alcançar a realização de um ato jurídico, tomar providências para proteger os incapazes, ou documentar um ato.185

25.4 PODERES QUE POSSUI O JUIZ

Todos os juízes são representantes do Estado e exercem a sua função em nome da soberania estatal, visando obter a harmonia social, rompida transitoriamente por conflitos de interesses entre alguns dos componentes da sociedade. Para o desempenho dessa alta missão e para poder cumprir com eficácia e imparcialidade as suas funções, o juiz dispõe do poder de polícia e do poder de jurisdicional. Este último existe para que o magistrado possa exercer com autoridade e eficiência o primeiro. Vejamos esses dois poderes separadamente:

25.4.1 Poder de polícia

O juiz representa o Estado e é quem dirige o processo, conforme as disposições das leis processuais. Para manter a ordem e o ambiente de respeito no desenrolar do processo, tem o juiz o poder de polícia, uma vez que está investida da autoridade judiciária. Através desse poder ele assegura a ordem dos trabalhos forenses, caso haja intromissão perturbadora de pessoas estranhas ao processo. Por exemplo, o magistrado tem autoridade para determinar a prisão daqueles que resistem ao serem convidados a deixar a sala (parágrafo único do art. 795 do CPC).


185 Alfredo de Araújo Lopes da Costa, Direito Processual Civil Brasileiro, vol. I, nº 78.

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Veja, também, os princípios dos arts. 15 e 125, III, do mesmo Código.

O art. 15 estabelece ser "defeso às partes e seus advogados empregar expressões injuriosas nos escritos apresentados no processo, cabendo ao juiz, de ofício ou a requerimento do ofendido, mandar riscá-las". Assim, em havendo tais expressões, é dever do juiz não admitilas, tanto que a lei lhe atribui ação de ofício.

Art. 125, III, por sua vez, lhe permite não só prevenir, mas ainda reprimir qualquer ato contrário à dignidade da Justiça.

Existem muitos outros princípios que dão ao juiz certos poderes. Chamamos a atenção para o conteúdo dos arts. 445 e 446 do mesmo Código:

Art. 445. "O juiz exerce o poder de polícia, competindo-lhe:

I – manter a ordem e o decoro na audiência;

II – ordenar que se retirem da sala da audiência os que se comportarem inconvenientemente;

III – requisitar, quando necessário, a força policial".

Art. 446 - “Compete ao juiz em especial:

I – dirigir os trabalhos da audiência;

II – proceder direta e pessoalmente à colheita das provas;

III – exortar os advogados e o órgão do Ministério Público a que discutam a causa com elevação e urbanidade”.

25.4.2 Poder jurisdicional

O poder jurisdicional é exercido pelo juiz, como sujeito da relação processual e compreende: a) os ordinários ou instrumentais, destinados ao desenvolvimento do processo; b) os instrutórios, que visam à colheita da prova dos fatos; c) os finais, que incluem os decisórios e os executórios.

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Através deste poder, o juiz pode, por exemplo, determinar a condução à força, caso a testemunha intimada deixe de comparecer à audiência; também conseguir meios para a colheita de provas a fim de fundamentar a sua decisão. Sem esse poder, o magistrado não poderia dar andamento rápido aos processos.

25.5 DEVERES DO JUIZ

São deveres do juiz, seguindo o roteiro do Código:

1) Dirigir o processo conforme as disposições do Código;
2) Decidir e despachar;
3) Decidir a lide nos limites em que foi proposta;
4) Impedir a prática de simulação ou a prática maliciosa;
5) Ordenar as diligências necessárias à instrução do processo, e indeferir as inúteis e protelatórias;

6) Indicar na sentença os motivos que lhe formaram o convencimento da decisão;

7) Concluir o julgamento dos processos, cuja instrução houver iniciado em audiência;

8) Declarar-se suspeito nos casos previstos em lei.

Vejamos cada situação de per si:

25.5.1 Dever de dirigir o processo conforme as

disposições do Código


“Não pode a parte, sob qualquer pretexto, nem mesmo sob alegação de querer imprimir maior celeridade ao processo, avocar para si os autos e, contando ou não com a aquiescência da serventia, mas sem a devida autorização judicial, neles inserir qualquer espécie de manifestação ou cota, posto que a direção do processo é exclusividade do juiz (CPC, art. 125), e somente ele é quem tem poderes para autorizar as partes a se manifestarem nos autos, sob pena de malferimento à regra contida no art. 161 do CPC(in RT 794/330).

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Realmente, nos termos do art. 125 do CPC, o juiz deverá dirigir o processo conforme as determinações do Código, tendo em vista quatro aspectos fundamentais:

I – assegurar às partes igualdade de tratamento;

II – velar pela rápida solução do litígio;

III – prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da Justiça;

IV – tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes.

O Juiz não se submete a nenhuma relação de subordinação, não estando sequer incluído no rol dos funcionários adstritos ao dever de obediência hierárquica. Só está sujeito à sua consciência e à lei. E, ao assumir a direção do processo, tem o dever de assegurar, acima de tudo, tratamento igualitário às partes na relação jurídico-processual. "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,...", diz o art. 5.º da Constituição Federal. E o processo não seria instrumento de justiça, "se ambas as partes não tivessem atribuições e deveres processuais mais ou menos idênticos".186

Também deve o juiz velar pela rápida solução do litígio, vigiando para que os processos não se paralisem em cartório por culpa do serventuário e adotando medidas necessárias ao bom andamento dos feitos.

Falando sobre o problema de atos atentatórios à dignidade da Justiça, o autor do anteprojeto do Código processual, o saudoso Prof. Alfredo Buzaid, fez a seguinte observação: "Por esse instituto, de larga...

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