Dispensa Arbitrária ou sem Justa Causa

AutorAmauri Mascaro Nascimento/Sonia Mascaro Nascimento
Páginas420-427

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1. Noções introdutórias

A — CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE EMPREGO. A continuidade da relação de emprego é um dos objetivos maiores do direito do trabalho, como expressão da ideia de segurança, aspirada por todos, comprometida sempre que o emprego do trabalhador é atingido pela dispensa.

É possível dizer que a dispensa é um mal que deve ser evitado sempre que possível, daí as medidas de proteção da relação de emprego, em maior ou menor grau, adotadas pelos sistemas jurídicos.

De que modo deve ser prestada eficaz proteção ao trabalhador contra a despedida? Essa fascinante questão envolve o problema já examinado da estabilidade no emprego, além de outras medidas. Compreende, também, o estudo das demais técnicas destinadas a dificultar ou dar certa ordem às dispensas, principalmente as coletivas.

Já examinamos as modificações que o nosso sistema vem sofrendo e que culminaram com as novas diretrizes constitucionais. Convém agora acrescentar alguns aspectos do problema.

A Constituição Federal de 1988 (art. 7º, I) traça o princípio que informa a nossa ordem jurídica ao dispor:

“São direitos dos trabalhadores, urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
I — relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos.”

Por sua vez, a mesma Constituição, nas Disposições Transitórias (art. 10, I), elevou de 10% para 40% o pagamento calculado sobre o FGTS devido pelo empregador que despedir arbitrariamente ou sem justa causa, e a Lei Complementar n. 110, de 29.6.2001, acrescentou um percentual de 10%, com o nome de contribuição social, a ser depositado na conta do empregado.

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A análise dos textos legais transcritos pressupõe mais de uma observação.

A relação de emprego, tanto de trabalhadores urbanos como rurais, é por princípio da Lei Maior protegida, valorizada, defendida, dando-se, assim, expressão ao princípio da continuidade do vínculo jurídico. Vale dizer que a ideia é a continuidade como algo que deve ser preservado. O emprego é um bem jurídico tutelado pela lei.

O Brasil ratificou a Convenção n. 158 da OIT, sobre proteção do empregado nas dispensas imotivadas. Porém, em 1996, a denunciou, o que limita sua vigência até um ano depois da denúncia.

A proteção da relação de emprego é voltada contra dispensas arbitrárias ou sem justa causa. Surge aqui a necessidade de uma brevíssima apreciação sobre as figuras em questão. Trata-se de um só mesmo ou de dois conceitos? Dispensa arbitrária é o mesmo que justa causa?

B — DISPENSA ARBITRÁRIA E JUSTA CAUSA. Dispensa arbitrária e justa causa são qualificações diferentes, porque não seria lógico o legislador utilizar-se de duas expressões para designar um só conceito. Portanto, têm significados não coincidentes.

Ficando, por ora, apenas nos estudos iniciais e que devem ser completados com a lei ordinária, é possível concluir que, enquanto a dispensa arbitrária é qualificação do ato praticado pelo empregador, justa causa, ao contrário, o é da ação ou omissão do trabalhador. A arbitrariedade é daquele. A justa causa é deste.

Arbitrária seria, por exemplo, a despedida sem a observância de um procedimento que a lei complementar pode traçar para as situações em que, em razão de crise econômica, a empresa se vê diante da necessidade de se desfazer de muitos empregados. É comum, em outros países, uma série de exigências da lei ou das convenções coletivas para que a dispensa se legitime, com a prévia apresentação de um plano de dispensas pelo empregador, a rigorosa observância de uma ordem preferencial de dispensas de modo a preservar os trabalhadores com maior antiguidade ou idade, a negociação com o sindicato etc.

De outro lado, o conceito de justa causa é conhecido. É algo familiar ao direito brasileiro. Comecemos a examiná-lo pelo estudo dos sistemas de justa causa.

C — SISTEMAS DE JUSTA CAUSA. Há sistemas jurídicos chamados genéricos nos quais não existe enumeração das figuras de justa causa. A lei limita-se a conceituar justa causa ou, sem conceituá-la, simplesmente indicar os seus efeitos. Exemplifique-se com a Lei do Contrato de Trabalho de Portugal, com a seguinte noção legal: “Considera-se justa causa o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho”. Outro exemplo é o da lei da França, que permite as dispensas individuais havendo causa real e séria. Não é demais acrescentar a lei da Alemanha, segundo a qual a dispensa é autorizada por motivo de justificado interesse social. Em cada caso concreto, o conteúdo desses conceitos é preenchido segundo a avaliação dos interessados, cabendo a interpretação definitiva ao juiz.

Em outros sistemas jurídicos, denominados taxativos, a lei enumera as hipóteses de justa causa, às vezes, tipificando-as, isto é, descrevendo o fato; outras vezes, simplesmente denominando-o sem descrevê-lo, como em nosso direito.

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Nada impede ainda que o sistema jurídico de um país adote um critério misto, combinação das duas formas anteriores.

Como em nossa lei é seguido o critério taxativo, não é de maior importância conceituar justa causa. É mais importante indicar as suas figuras e explicar o nomen juris usado pela lei. Outra consequência do sistema taxativo é que só será justa causa aquela contida em lei. Não nos parece viável dar validade a figuras de justa causa previstas...

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