A disciplina legal dos salários

AutorPedro Proscurcin
Ocupação do AutorDoutor em Direito pela PUC/SP. Professor de Direito na FECAP/SP
Páginas227-242

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1. Salário

Legalmente, o salário é a contraprestação paga diretamente pelo empregador pela prestação dos serviços do empregado. Na análise de Manus, o salário compreende os aspectos económicos e sociais. O salário, na visão liberal, é fator de custo de produção, como a matéria-prima, por exemplo. Marx não vê o salário como a compra do trabalho. O que ocorre é uma compra e venda da força física e mental dispendida pelo trabalhador, na qual o empresário, "utilizando-a como bem entender e até quando não mais o interesse, em razão do lucro que extrai", obtém a mais-valia que enseja a acumulação do capital. Os socialistas, explica Manus, não percebem no salário uma relação de compra e venda da força de trabalho, pois não há o lucro do capitalista extraído do trabalho na produção, mas sim uma compensação "a ser distribuída a cada um, de acordo com suas necessidades". O autor aduz, ainda, uma nova visão do salário como elemento de proteção social mais amplo, incluindo a sua função previdenciária187.

Segundo o art. 457 e os seus §§ 1a e 2a da CLT, o salário pago pelo empregador pode compreender uma importância fixa, comissões, percentagens, gratificações, abonos, ajudas de custo e diárias para viagem.

A parte fixa dos salários é aquela que está garantida como pagamento independentemente de outros fatores na prestação do trabalho. Abono significa adiantamento salarial. A própria lei já denominou de "abono de emergência" uma concessão salarial por conta dos próximos reajustes salariais das categorias de trabalhadores. Hoje, nas negociações coletivas, quando o patronato não quer que parte da concessão salarial integre definitivamente os salários, isto é, que seja incorporado aos salários algum percentual do reajuste, os dirigentes sindicais de empresários e de empregados apelidam essa fórmula de abono salarial.

Temos empresas que chamam de abono o adiantamento salarial pago em meados do mês. Outras preferem chamar esse pagamento simplesmente de adiantamento ou vale.

As comissões são utilizadas no pagamento salarial do pessoal do comércio nas áreas de vendas. Geralmente é uma percentagem ajustada que incide sobre o valor dos produtos vendidos. A ideia que se tem é que comissões e percentagens sejam sinónimas. Porém, pode ocorrer que a percentagem não seja um número incidente

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sobre o valor de vendas como a comissão, mas também a fixação de metas sobre vendas ou produção de produtos realizados em lapsos de tempo anteriores, mês, quinzena, semestre, ano ou eventual época. No caso de vendas, poderá ser uma combinação entre os dois fatores. A comissão poderá variar de acordo com o percentual obtido sobre a venda do período anterior tomado como referencial.

As gratificações assumem caráter de recompensa pela dedicação do empregado. Mas não devemos esquecer certas práticas de gratificações por resultados obtidos. Nesse tópico, entram os prémios, que muitas vezes se confundem com as gratificações. Os prémios estão vinculados a certos fatores como produção, presença, qualidade, eficiência, entre outros. O prémio está ligado geralmente ao desempenho individual. A gratificação e o prémio podem variar quanto ao valor pago. Independentemente do valor, a habitualidade do pagamento faz que integrem o salário para todos os efeitos.

As ajudas de custos e as diárias são pagas em razão do deslocamento do trabalhador para realizar o seu trabalho. Essas verbas são adiantadas para que o empregado pague o hotel, as refeições, táxi, entre outras coisas necessárias. O costume é a prestação de contas após o serviço ou viagem. Mas a lei determina que caso a ajuda ou a diária excedam cinquenta por cento do salário, elas deverão integrá-lo. A leitura do § 2a do art. 457 da CLT é indispensável.

Por força do art. 468 da CLT e, da Constituição Federal, inciso VI, do art. 7a, os salários são irredutíveis. Unicamente por meio de negociações sindicais (art. 7a, inciso VI, da Constituição Federal) os salários poderão ser alterados, nas quais obviamente haverá contrapartidas a serem negociadas, do contrário não há convenção ou acordo. Para se lançar mão do comando constitucional, deverá existir uma grave e insuperável justificativa para a sua aplicação. A restrição de direitos impõe severa interpretação restritiva. A restrição tem de ter autorizada relevância social qualificativa por se tratar de um direito social fundamental. Não é porque houve um acordo conjuntural que o assunto morre e é encerrado.

Temos de reler a Constituição. Ninguém se esquecerá de que, superada a conjuntura desfavorável, deverão ser repostas as perdas do período de crise, pois a Constituição preconiza a melhoria das condições de vida, a redução das desigualdades, a valorização do trabalho e da livre-iniciativa, a justiça, a solidariedade e a dignidade da pessoa humana. Não será sobre a miséria alheia que construiremos a sociedade do futuro. O direito cumpre seu papel na sociedade pondo em prática os valores e a força normativa da Constituição Federal em qualquer país.

2. Remuneração

Há confusão geral na sociedade entre o significado do salário e da remuneração. As pessoas se valem das duas expressões como se se tratasse da mesma coisa. Não é assim no direito. Aqui, temos de nos valer da técnica legal. Na CLT, salário e remuneração são coisas diferentes. Vimos que salário é a contraprestação paga diretamente pelo patrão ao empregado.

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É muito simples compreendermos a remuneração. Basta a leitura da cabeça do art. 457 da CLT: "Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço [o que já vimos em detalhe no item anterior], as gorjetas que receber." Gorjetas! O que são gorjetas? O § 3a do art. 457 responde: "Considera--se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente [não o patrão, portanto] ao empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao cliente, como adicional de contas, a qualquertítulo [geralmente 'serviços'], e destinada à distribuição aos empregados".

Nesse sentido, pela lei, remuneração significa a soma do salário mais as gorjetas que receber de clientes, isto é, de terceiros, ou o valor cobrado pela empresa para ser distribuído aos empregados. Imediatamente lembramo-nos de restaurantes e lanchonetes. Ocorre que existem inúmeras possibilidades de trabalhos que ensejam o pagamento de gorjetas: estacionamento, posto de gasolina, oficinas de conserto, serviços de entrega, para não nos alongarmos na lista. O segmento de serviços tende a evoluir para essa modalidade de contraprestação. As pessoas de modo geral valorizam a dedicação e qualidade na prestação dos serviços.

3. Formas de contratação de salário

A cláusula salarial do contrato de trabalho pode ter diferentes formatos. Os mais usuais, além dos que já vimos, são: a) unidade de tempo: hora, dia, semana, quinzena e mês. Todo pagamento não poderá ultrapassar o período de um mês, nos termos categóricos do art. 459 da CLT; b) unidade de produção: peça, peso188, área, conserto ou obra; c) unidade de tarefa: realização de um produto ou mais, conforme o ajuste prévio contra determinado salário. Cumprida a tarefa, ainda que antes do término da a jornada, o trabalhador é liberado do serviço.

Precisa ser ressaltado que na omissão da fixação do salário no contrato de trabalho o mesmo será equivalente ao de outro empregado com a mesma função. Não havendo função equivalente, terá de ser pago o salário de função semelhante (art. 460 da CLT).

4. Cálculo do salário: mês e dia

O art. 64 da CLT, adaptado à jornada prevista na Constituição, explica que o mensalista saberá o valor-hora de seu salário, por exemplo, para saber o que receberá se fez horas extras, dividindo o salário mensal contratual com a duração referida no art. 58, isto é, oito diárias e 44 semanais por 30 vezes o número dessa duração, mas sendo o número de dias inferior a 30, adotam-se os dias trabalhados no mês (parágrafo único do art. 64). Como na semana a jornada é de 44 horas para seis dias, a jornada diária será de sete horas e 20 minutos, o que perfaz 220 horas.

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O DSR - Descanso Semanal Remunerado do mensalista está embutido no seu salário, sendo vedado qualquer desconto, salvo o do dia do seu não comparecimento injustificado ao serviço. A simples leitura dos arts. 6a, e § 2a, do art. 7a, da Lei n. 605/49, coloca claramente a impossibilidade do desconto, malgrado certas empregadores queiram interpretar às avessas o comando meridiano da norma.

Para o diarista, o critério é dividir o ganho diário pelo número de horas efetivas do dia (art. 65). O espaçamento dos pagamentos não pode ser superior a trinta dias e as outras formas de cálculo em função da atividade devem ser medidas de modo que o salário não sofra altos e baixos, pois a lei preconiza a utilização da média aritmética dos salários dos meses anteriores para os pagamentos mensais. Os compromissos familiares são uniformes e compatíveis com essa média salarial mensal.

Não esqueçamos que há atividades nas quais os pagamentos são quinzenais e mesmo semanais. O costume e a condição social dos trabalhadores desses setores económicos acabam definindo tais práticas, seja pelo...

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