Os direitos fundamentais ao meio ambiente laboral diante da governança global

AutorSimone Nunes Freitas Araújo - Laira Beatriz Boaretto
CargoMestre em Direito pela UNIMEP. Pesquisadora da Capes-PROSUP - Mestranda em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep)
Páginas162-183
OS DIREITOS FUNDAMENTAIS AO MEIO AMBIENTE LABORAL DIANTE DA
GOVERNANÇA GLOBAL
FUNDAMENTAL RIGHTS TO THE WORK ENVIRONMENT IN FRONT OFGLOBAL
GOVERNANCE
Simone Nunes Freitas Araújo1
Laira Beatriz Boaretto2
Resumo: O artigo discorre sobre o descomedido desen volvimento mundial, que traz em seu bojo problemas
urbanos, os quais depreciam a qualidade ambiental e, por conseguinte, o meio ambiente de trabalho. Por seu
turno, ao mesmo tempo em que se percebe um problema ambiental a nível global, nos deparamos com uma
distância em que se encontram as iniciativas públicas e privadas de uma solução definitiva da questão, mormente
porque afeta o siste ma econômico mundial, que apenas se preocupa em galgar mais e maiores mercados,
ignorando os direitos fundamentais. Nesse sentido, analisa o desapreço com a saúde do trabalhador posto em
xeque diante dos elevados índices de acidentes laborais e acometimento de doenças ocupacionais, o que deixa
claro que o direito fundamental ao meio ambiente de trabalho desafia a governança diante do custo dessa
realidade e do impacto que gera na feroz competitividade imposta pelas regras do mercado mundial. O desafio é
aprimorar as condições de governança, local a global, valendo-se dos regimes multilaterais, de instrumentos de
comando-controle (associados a Poder Público regulamentado e gestor de interesses de toda a sociedade) e de
instrumentos econômicos (através dos quais o mercado e as empresas assumem os custos ambientais e sociais de
suas respectivas atividades).
Palavras-chave: direito fundamental, meio ambiente do trabalho, governança global, saúde do trabalhador.
Abstract: The article discusses the overblown world development that brings with urban
problems, which detract from the environmental quality and therefore the working environment, of different
categories. Meanwhile, while we perceive a serious environmental problem globally, we are faced
with an immeasurable distance in which they are the public and private initiatives of a final settlement of the
question, especially because it affects theworld economic system, which only bother to climb more and
larger markets, ignoring the fundamental rights. Accordingly, analyzes the disaffection with the workers'
health called into questionbefore the high rates of oc cupational accidents and occupational
diseasesimpairment which makes it clear that the fundamental ri ght to work en vironmentchallenges facing the
governance of the cost and impact of this reality that generates the fierce competition imposed by the rules of the
global market.
The challenge therefore is to develop and improve governance conditions, local to global, including taking
advantage of the multilateral regimes, tools, command-control (ie, associated with the Government regulated
and managerinterests of the whole society) and of economic instruments (through which the market and
companies take environmental and social costs of their activities).
Keywords: fundamental right, environment labour, global governance, occupational health.
Considerações iniciais
O advento da Revolução Industrial (1760-1830) e a implementação de um modelo
capitalista calcado no liberalismo alteraram sobremaneira as relações entre empregador e
empregado, o que se propagou como um movimento destinado a mudar profundamente toda a
história da humanidade, tornando-se o marco inicial da moderna industrialização.
Com a invenção da máquina, galpões, estábulos e velhos armazéns eram rapidamente
transformados em fábricas, colocando-se no seu interior o maior número de máquinas de
1 Mestre e m Direito pela UNIMEP. Pesquisadora da Capes-PROSUP. Pós-Graduada em Direito e Processo do
Trabalho pela Faculdade Anhanguera e graduada em Direito pela Universidade Presidente Antônio Carlos. Tem
experiência na área de Direito Publico e Privado, com ênfase em Direito do Trabalho e Civil. E- mail:
snfaraujo@gmail.com.
2 Mestranda em Direito pela Universidade Metodista de P iracicaba (Unimep). Graduada em Direito do Trabalho
e Previdenciário pela Faculdade ESAMC-Campinas. Especialista em Gestão e Estratégia Empresarial pela
UNICAMP. Tem experiência na área de Direito P úblico e Privado, com ênfase em Direito do Trabalho e Civil.
E-mail: laira@arboaretto.adv.br.
fiação e tecelagem. Assim, enquanto os donos das fábricas acumulavam bens, o obreiro
abandonado pelo Estado, não passava de simples meio de produção, e a sua dignidade
fundamental de pessoa humana não interessava aos chefes industriais de então. Os salários
eram muito baixos, não havia estabelecimento de um mínimo civilizatório, as jornadas de
trabalho eram as mais extenuantes possíveis,3 rompia-se o contrato de trabalho por parte dos
patrões sem qualquer indenização, sem falar no problema gritante do péssimo estado dos
locais e condições de trabalho, que afetava a saúde do trabalhador, principalmente mulheres e
crianças.4
Verifica-se, assim, a predominância na época da ideologia da não interferência no livre
desenvolvimento da manufatura e do comércio, ou seja, dominava amplamente o princípio
liberal do laisser faire, pois se implementava um modelo capitalista voraz pouco ou quase
nada efetivamente preocupado com o direito fundamental ao meio ambiente laboral.
Nas grandes cidades inglesas os acidentes do trabalho eram numerosos, provocados
por máquinas sem qualquer proteção, movidos por correias expostas, situação esta que foi
gradativamente se agravando, até o ponto de o Parlamento Britânico criar uma comissão de
inquérito que, após longa e tenaz luta, conseguiu em 1802 a Lei de Peel (Ato de Saúde e da
Moral dos Aprendizes), que buscou regulamentar condições mínimas de higiene.5
Nessa visão, em 1831, formam uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que elaborou
um relatório demonstrando a necessidade urgente de medidas de proteção aos trabalhadores, e
assim pelo impacto deste relatório sobre a opinião pública, foi baixado em 1833 o Factory Act
(Lei das Fábricas), tida como a primeira legislação eficiente no campo da proteção ao
trabalhador, transformando o processo de industrialização objeto de estudo dico,
encartando normas de intervenção nas empresas para minimizar o atrito danoso do trabalho ao
homem.6
Na França, em 1848, firmou-se uma nova Constituição francesa, composta, de um
lado, entre o liberalismo e o socialismo democrático. Importando destacar a instituição de
deveres sociais do Estado para com a classe trabalhadora e os necessitados em geral,
estabelecido no artigo 13, que aponta para a criação do que viria ser o Estado do Bem-Estar
Social, no século XX.
Nessa linha, o liberalismo da primeira dimensão de direitos passou a ser contestado no
plano ideológico, em virtude das críticas dos socialistas e dos comunistas; no plano político,
por intermédio da declaração francesa de 1848, primeiro ensaio das reformas sociais, no plano
legislativo, por meio de leis protetivas e com o reconhecimento da licitude da atuação dos
sindicatos, até então afastados do cenário das lutas reinvindicatórias, em face das ideias de
prevalência da vontade individual.
Com objetivo na luta pelo progresso e pela emancipação humana, em setembro de
1864 nasceu formalmente em Londres a Associação Internacional dos Trabalhadores, também
chamada Primeira Internacional de Trabalhadores, fundada por iniciativa dos poucos que
naquela época compreendiam a verdadeira natureza da questão social e a necessidade de
subtrair os trabalhadores à direção dos partidos burgueses. Nesse processo evolutivo de
proteção ao trabalhador foi criada, em 1900, a Associação Internacional para a Proteção Legal
dos Trabalhadores, na cidade de Paris, por ocasião do Congresso Internacional de Legislação
do Trabalho, e instalada na Suíça, principal responsável por sua criação, que, por meio de
diversas reuniões e criação de Seções Nacionais, assentou as diretrizes para a implantação das
3 BELFORT, Fernando José Cunha. Meio Ambiente do Trabalho. São Paulo: LTr,2003. p. 72.
4 GROTT, João Manoel. Meio Ambiente do Trabalho: prevenção e salvaguarda do Trabalhador. Curitiba:
Juruá, 2008. p.29.
5 Idem, p. 108-109.
6 Idem.

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