Direito Individual do Trabalho

AutorDeusmar José Rodrigues
Páginas15-141

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1. Princípios de Direito Individual do Trabalho

Os princípios evoluíram no tempo, passando por fases bem particularizadas. Na fase jusnaturalista, os princípios não possuíam qualquer grau de normatividade. Na fase positivista, eles ingressam nos códigos, sendo ferramentas de interpretação para provocar a extensão da lei e eliminar o vazio legislativo. Na fase pós-positivista, são tratados como direito1.

Ronald Dworkin, ícone da fase pós-positivista, opondo-se à concepção positivista do Direito, entende que os princípios2são espécies de normas (teoria assentada em bases deontológicas). A distinção entre princípios e regras tem natureza lógico-argumentativa e ambos apontam para decisões particulares. As regras aplicam-se à maneira de “tudo ou nada”3e comportam exceções. Os princípios enunciam uma razão que conduz a um argumento e a determinada direção. O Direito é fruto da história e da moral. O juiz, em diálogo com as partes, deverá interpretar a história institucional como um movimento constante e partindo de uma completa e criteriosa análise da Constituição, leis e precedentes para identificar a leitura feita pela sociedade dos princípios jurídicos aplicáveis ao caso, superando a chamada “vontade do legislador”, esboçada pelo positivismo4. A possibilidade de universalização das pretensões de validade sobre a correção de uma norma depende de se atingir um consenso abrangente, capaz de ultrapassar as perspectivas particulares dos sujeitos envolvidos. Defende a bivalência em face do caso concreto. Inexiste uma terceira opção entre a afirmação de que uma proposição jurídica possa

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ser correta ou não (uma única resposta correta para o caso concreto). Na discussão sobre se determinado princípio deve ser proposto para solucionar a controvérsia, a discussão ficará restrita ao plano da confirmação ou não de sua adequação para poder ser aplicado ao caso.

Para Robert Alexy, as normas compreendem regras e princípios. A distinção entre ambos se daria em razão da generalidade dos princípios ante as regras. Considera essa abordagem quantitativa insuficiente. Propõe uma qualitativa, já que as regras se aplicam ou não (tudo ou nada), enquanto os princípios não são determinantes a favor de uma ou outra posição argumentativa. São mandamentos de otimização5. Entre princípios existe uma dimensão de peso, exigindo, para sua aplicação, um procedimento de ponderação6. O valor decisório será dado ao princípio de maior peso no caso concreto (teoria assentada em bases axiológicas). O sistema jurídico, além de conter regras e princípios, comporta um terceiro nível, no qual são feitas considerações sobre um procedimento. A argumentação jurídica, então, é vista como um caso especial da argumentação prática geral, ou seja, da argumentação moral. As regras do discurso serviriam, portanto, apenas para que se pudesse contar com um mínimo de racionalidade, mas não para obter uma resposta correta. No máximo, ter-se-ia uma decisão aproximadamente correta.

Habermas critica a maneira como Alexy entende a ponderação de princípios, por implicar uma concepção axiologizante do Direito, uma vez que a ponderação só seria possível ao se preferir um princípio a outro. Para ele, persiste a diferença entre normas (enunciados deontológicos e que visam ao que é devido) e valores (enunciados axiológicos e objetivam o que é bom, melhor ou preferível, mas condicionado a determinada cultura). Ao se afirmar que os princípios possuem natureza deontológica em razão do seu caráter devido e, operacionalmente, igualarem-se princípios a valores quanto a sua aplicação, percebe-se que a norma perde a característica de código binário para se transformar em um código gradual. À luz da teoria de Alexy, os princípios não mais indicam o que é devido, mas o que é preferível, e, assim, em nada se diferenciam dos valores7.

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A par dessa situação, um setor da doutrina (LTr 70-04/4178) critica veementemente a concepção antiga por relegar aos princípios o mero papel de preenchimento de lacunas (art. 4º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro – LINDB, e art. 8º da CLT). Com razão, a doutrina moderna, efetivamente, proclama o caráter normativo dos princípios, os quais, com as regras, formam as normas jurídicas.

A Constituição Federal de 1988, democraticamente, normatiza os princípios no art. 5º, § 2º, extirpando dúvidas sobre se seriam ou não normas jurídicas. Efetivamente, os princípios são normas jurídicas.

1.1. Da Proteção

O Princípio da proteção9, no magistério de Américo Plá Rodriguez (Princípios de Direito do Trabalho; LTr, 2004), se refere ao critério fundamental que orienta o Direito do Trabalho, pois este, ao invés de inspirar-se num propósito de igualdade, responde ao objetivo de estabelecer um amparo preferencial a uma das partes: o trabalhador. Expressa-se na a) regra in dubio pro operario10;

  1. na regra da norma mais favorável; e c) na regra da condição mais benéfica. É a projeção do direito fundamental de igualdade (material) das partes no Direito do Trabalho.

1.2. Da Norma Mais Favorável

Segundo Maurício Godinho Delgado (Curso, LTr, 2006), deve-se optar pela norma mais favorável nas seguintes situações:
I) na elaboração da regra: age como critério de política legislativa na fase pré-jurídica;
II) na fase jurídica: atua como critério de hierarquia em caso de conflito de normas e como critério de interpretação, permitindo a escolha da interpretação mais favorável ao trabalhador11, se existentes alternativas consistentes.

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Critérios para aferição da norma mais favorável:
I) teoria do conglobamento: prepondera o instrumento normativo mais vantajoso em seu conjunto12. O art. 62013da CLT diz que as condições estabelecidas em convenção, quando mais favoráveis, prevalecerão sobre as estipuladas em acordo. Todavia, o acordo negociado para reduzir direitos, como permitem os incisos VI, XIII e XIV do art. 7º da Constituição Federal, prevalecerá, por força da maior constitucional excepcional;
II) da acumulação/atomista: seleciona-se casuisticamente em cada instrumento jurídico o direito mais favorável (cláusula por cláusula14);

III) do conglobamento orgânico ou por instituto (ou incindibilidade dos institutos): a solução do conflito passaria pela escolha do instituto mais benéfico, como acena o art. 3º, II, da Lei nº. 7.064/82;
IV) adequação (à vida da empresa): no choque entre acordo e convenção coletivos, dar-se-ia preferência para a norma mais específica, dentro da ideia que lei geral não revoga lei especial; e
V) cronológica: no embate de normas coletivas, deve prevalecer a mais recente, pois negociada com base em nova realidade.

1.3. Da Imperatividade das Normas Trabalhistas

Se as normas desse ramo especial do Direito visam proteger o prestador de serviço hipossuficiente, não faria sentido que elas pudessem ser dispositivas,

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ou seja, pudessem ter sua aplicação obstada pela vontade das partes, principalmente pelo tomador de serviço. Daí que prevalecem as normas obrigatórias ou cogentes em detrimento das dispositivas. Estas, se beneficiarem o empregado, podem existir validamente, sendo exemplo o art. 472, § 2º, da CLT.

1.4. Da Indisponibilidade dos Direitos Trabalhistas

Decorre da imperatividade (CF/88, art. 7º, VI).

A indisponibilidade, em regra, alcança os direitos previstos em normas de ordem pública. Nos direitos oriundos de contrato, a indisponibilidade é diferente. Abrange:
I) renúncia, que é ato unilateral de disposição de direitos e, em geral, não admitida no Direito do Trabalho, salvo lei em contrário, v.g.: renúncia à antiga estabilidade com opção pelo FGTS e renúncia tácita do dirigente sindical que...

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