Detenção: As relações de poder entre encarcerados e carcereiros a partir dos estudos de Goffman e Foucault

AutorJohanna Gondar Hildenbrand - Lobelia da Silva Faceira - Sebastião Meirelles Sant'anna
CargoMestranda do Programa de Pós Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil - Doutora em Educaçãopela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - Mestrando do Programa de Pós Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, ...
Páginas55-71
1807-1384.2014v11n2p55
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Adaptada.
DETENÇÃO: AS RELAÇÕES DE PODER ENTRE ENCARCERADOS E
CARCEREIROS A PARTIR DOS ESTUDOS DE GOFFMAN E FOUCAULT
Johanna Gondar Hildenbrand
1
Lobelia da Silva Faceira2
Sebastião Meirelles Sant'anna3
Resumo:
O artigo tem a proposta de discutir as relações de poder entre encarcerados e
carcereiros nas instituições penais a partir do filme Detenção (The Experiment, 2010,
EUA), de Paul Scheuring. Partimos dos conceitos “instituição total” e “forma-prisão”
estabelecidos por Erving Goffman e Michel Foucault, respectivamente, a fim de
refletirmos sobre a forma pela qual o poder é estabelecido e exercido entre e dentro
desses dois grupos (encarcerados e carcereiros). A partir do filme buscamos observar
as consequências do poder cedido pela instituição aos carcereiros, tidos aqui como
uma equipe dirigente, e de que forma esse mesmo poder age no grupo dos
prisioneiros levando-o progressivamente à modificação da subjetividade enquanto
anulação do eu civil.
Palavras-chave: Instituição. Poder. Prisão. Cinema.
1 APRESENTAÇÂO
O artigo pretende discutir as relações de poder entre prisioneiros e carcereiros
nas instituições penais a partir da sustentação teórica e dos conceitos de Erving
Goffman e Michel Foucault, tendo como critério de definição dos autores a relevância
de suas obras na análise da instituição prisão e das relações de poder. Logo, não é
proposta do artigo realizar uma revisão de literatura sobre a temática prisão, mas a
análise das relações de poder a partir do filme Detenção (The Experiment, 2010,
EUA), de Paul Scheuring.
O filme, baseado no Experimento de aprisionamento de Stanford realizado na
década de 70 nos Estados Unidos e liderado pelo doutor Philip Zimbardo, consiste em
1 Mestranda do Programa de Pós Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Bolsista pela CAPES. E-mail: johanna_gondar@hotmail.com
2 Doutora em Educaçãopela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Professora da Escola de
Serviço Social e do Programa de Pós Graduação em Memória Social da Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: lobeliasfaceira@yahoo.com.br
3 Mestrando do Programa de Pós Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: sebastiaothauzs@hotmail.com
56
R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.11, n.2, p.55-71, Jul./Dez. 2014
um thriller ficcional sobre uma experiência comportamental promovida por uma
instituição vinculada ao governo americano, no qual foram simuladas as condições de
vida dentro de uma prisão estadual.
Vamos, inicialmente, apresentar um resumo do filme que funcionará como
campo para nossa análise teórica: Visando receber 1.000 dólares por dia, um grupo de
homens se dispõe a passar duas semanas numa “prisão fictícia” onde o único pré-
requisito é que não tivessem passado nenhum tempo em uma prisão real.
Após uma série de testes conduzidos para a observação da propensão
individual à violência eles são encaminhados ao lugar onde fica a prisão. Lá são
divididos em dois grupos: carcereiros e encarcerados, aparentemente de forma
aleatória. O cientista condutor do experimento dita algumas regras apenas para os
carcereiros, pois cabe a eles aplicá-las, mas essas regras devem ser seguidas por
todos os participantes, caso contrário nenhum deles receberá o pagamento, visto
tratar-se de uma experiência sobre grupos que são monitorados por câmeras durante
todo o tempo.
As regras estabelecidas pelo grupo de pesquisadores são: 1. Os prisioneiros
devem comer três refeições diárias e toda a comida do prato precisa ser consumida; 2.
Os prisioneiros têm direito a trinta minutos por dia de recreação; 3. Os prisioneiros
devem estar em áreas designadas aos prisioneiros; 4. Os prisioneiros só devem falar
com os guardas quando os mesmos falarem com eles; 5. Os prisioneiros não devem
tocar nos guardas em nenhuma circunstância.
Qualquer um que quebre essas regras deve ser punido em no máximo trinta
minutos e havendo qualquer tipo de violência física, o experimento será encerrado
imediatamente e ninguém será pago. O experimento não chega a completar as duas
semanas, antes disso ele é interrompido devido aos atritos que ocorrem entre o grupo
de encarcerados e o grupo dos carcereiros.
No sentido de analisar o filme a partir do referencial teórico proposto, é preciso
entender inicialmente o que é uma instituição penal. Foucault desenvolveu o conceito
através do que ele chamou de “forma-prisão” em Vigiar e Punir (2011). No início do
capítulo intitulado “Instituições Completas e Austeras” o autor nos diz que:
A forma-prisão preexiste à sua utilização sistemática nas leis penais. Ela se
constitui fora do aparelho judiciário, quando se elaboram, por todo o corpo
social, os processos para repartir os indivíduos, fixá-los e distribui-los
espacialmente, classificá-los, tirar deles o máximo de tempo e o máximo de

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