O Estado democrático de direito e as minoriasMarco Aurélio Mendes de Farias Mello

AutorDaniel Castro Gomes da Costa
Páginas31-40

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Em sessão realizada em 7 de dezembro de 2006, às vésperas do início de mais uma legislatura, consideradas as eleições gerais ocorridas em outubro daquele ano, o Supremo teve a oportunidade de apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.351-3/DF, na qual figuravam como requerentes o Partido Comunista do Brasil - PC do B, o Partido Democrático Trabalhista - PDT, o Partido Socialista Brasileiro - PSB e o Partido Verde - PV e a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.354-8/DF, ajuizada pelo Partido Social Cristão - PSC, nela havendo sido admitidos como terceiros o Partido Popular Socialista - PPS e o Partido Socialismo e Liberdade - PSOL.

A discussão básica estampada nos processos dizia respeito à harmonia ou não do art. 13 da Lei dos Partidos Políticos - Lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995 - com a Constituição Federal, versando o tema da popularmente denominada "cláusula de barreira".

Além do mencionado dispositivo, atacavam-se também, por arrastamento, em razão de expressões a remeterem ao citado artigo, os incisos II do art. 41 e II do art. 56, bem como a cabeça dos artigos 48 e 49 e a cabeça e incisos do art. 57.

O preceito possuía a seguinte redação:

Art. 13 - Tem direito a funcionamento parlamentar, em todas as Casas Legislativas para as quais tenha elegido representante, o partido que, em cada eleição para a Câmara dos Deputados, obtenha o apoio de, no mínimo, cinco por cento dos votos apurados, não computados os brancos e os nulos, distribuídos em, pelo menos, um terço dos Estados, com o mínimo de dois por cento do total de cada um deles.

Vê-se que o art. 13 em questão, relativamente ao funcionamento parlamentar nas Casas Legislativas, previa que o partido político deveria preencher dois requisitos. O primeiro deles referia-se à quantidade dos votos válidos atinentes às cadeiras da Câmara dos Deputados. Então, havia de se ter o mínimo de cinco por cento da totalidade dos votos apurados, não computados os brancos e os nulos. Atendida essa condição,

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surgia novo óbice a ser ultrapassado. Era preciso que os cinco por cento dos votos estivessem distribuídos em nove Unidades da Federação, mostrando-se necessária ainda a quantidade mínima de dois por cento em cada uma delas. Eis, então, os pressupostos para que o partido político, em verdadeira corrida de obstáculos, alcançasse o funcionamento parlamentar:

a) obtenção de cinco por cento dos votos válidos para a Câmara dos Deputados, considerada a votação em todo o território nacional, afastados os brancos e os nulos;

b) distribuição desse percentual mínimo em pelo menos um terço dos Estados brasileiros;

c) conquista, em cada um dos nove Estados, de, no mínimo, dois por cento.

A exigência, além de estar ligada ao funcionamento parlamentar, repercutia, também, no fundo partidário e no tempo disponível para a propaganda da agremiação política. Sob o ângulo econômico-financeiro, ante o disposto no art. 41 do diploma analisado, a divisão do fundo, no tocante aos partidos que lograssem votação mínima e aos demais, havia de se fazer mediante equações extremadas:

a) noventa e nove por cento deveriam ser rateados entre os partidos que preen-chessem os requisitos previstos no art. 13 em comento;

b) a percentagem ínfima de um por cento seria distribuída entre todos os partidos que tivessem estatutos registrados no Tribunal Superior Eleitoral, inclusive os já beneficiados com a fatia maior.

Vale dizer: os partidos que atendessem ao disposto no citado art. 13 participariam do rateio de cem por cento do fundo partidário, enquanto os que não atingissem os patamares versados concorriam, em partes iguais e juntamente com os primeiros, à divisão do valor resultante do percentual de um por cento do fundo partidário.

A outra restrição corria à conta do denominado programa partidário. Conforme estabelecia o art. 48 da Lei nº 9.096/95, aos partidos que não preenchessem os requisitos do art. 13 reservar-se-ia, em cada semestre, espaço de dois minutos para a propaganda eleitoral, limitado à cadeia nacional. Já os demais partidos, aqueles que conseguissem cumprir as exigências do art. 13, estavam autorizados a realizar um programa em rede nacional e outro em rede estadual, no semestre, com duração dez vezes maior, ou seja, de vinte minutos cada qual, gozando ainda do direito a inserções de trinta segundos ou um minuto, em âmbito nacional e estadual, perfazendo, por semestre, quarenta minutos - art. 49 da Lei nº 9.096/95.

Na qualidade de relator de ambas as ações diretas, proferi voto conjunto, consignando a plena procedência do que apontado como extremos quer sob o ângulo do funcionamento parlamentar, excluído no que não alcançados os patamares do art. 13, quer quanto à participação no fundo partidário, praticamente neutralizada em face das percentagens de noventa e nove por cento e de um por cento para rateio geral, quer em relação à propaganda partidária, tendo certos partidos o direito de veiculá-la apenas em cadeia nacional e por dois minutos em cada semestre, dispondo outros, para

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tanto, em rede nacional e estadual, de tempo dez vezes maior, além de contarem com as inserções a totalizarem, por semestre, também nos dois âmbitos, quarenta minutos em cada qual.

As regras de repercussão ímpar tiveram a eficácia projetada no tempo, presentes os arts. 56 e 57 das Disposições Finais e Transitórias da Lei nº 9.096/95. A plena eficácia dos artigos atacados seria alcançada a partir da legislatura que se iniciou em 2007.

Comecei a argumentação, asseverando que, dos vinte e nove partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral, apenas sete haviam alcançado e suplantado o patamar de cinco por cento dos votos para a Câmara dos Deputados em todo o território nacional, distribuídos de tal forma a perfazer pelo menos dois por cento em cada qual de nove Estados. Eis os partidos que lograram cumprir os ditames legais: a) Partido dos Trabalhadores - PT; b) Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB; c) Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB; d) Partido da Frente Liberal - PFL (atual Democratas); e) Partido Progressista - PP; f) Partido Socialista Brasileiro - PSB;

g) Partido Democrático Trabalhista - PDT.

Em síntese, caso prevalecesse, sob o ângulo da constitucionalidade, o disposto

no art. 13 da Lei nº 9.096/95, somente essas agremiações políticas teriam funcionamento parlamentar, participariam do rateio de cem por cento do saldo do fundo partidário, gozariam, em cada semestre e em cadeias nacional e estadual, de espaço de vinte minutos para a propaganda eleitoral e desfrutariam de inserções, por semestre e também em redes nacional e estadual, de trinta segundos ou um minuto, totalizando oitenta minutos no ano. As demais ficariam à míngua, vale dizer, não contariam com o funcionamento parlamentar, dividiriam, com todos os outros partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral, a percentagem de um por cento do fundo partidário e, no tocante à propaganda partidária, teriam...

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