Democracia, integração e paz na América do Sul

AutorAdriano Portella de Amorim
CargoAdvogado, Mestre em Direito e Políticas Públicas, Especialista em Direito Processual Civil e Professor de 3º Grau (Antropologia Jurídica, Ética Profissional e Direito Administrativo)
Páginas215-259
DOI: 10.5102/prismas.v8i1.1164
Democracia, integração
e paz na América do Sul
Adriano Portella de Amorim1
Resumo
O objetivo do presente trabalho consiste em conjugar integração e paz na
América do Sul, considerando a relevância da democracia para a formulação de
políticas. Para tanto, adota-se como método a abordagem de bibliograa especiali-
zada, construindo-se formulações argumentativas conjugadas com o objetivo cen-
tral do texto. São elencados fatores que merecem ser observados na composição de
regras e na construção de consensos. A pesquisa se limita à abordagem conceitual,
com aproximações práticas entre integração e paz. O valor do trabalho reside na
demonstração de que o aspecto econômico do Mercado Comum do Sul (Merco-
sul) necessita considerar a integração como fenômeno dependente da segurança e
da estabilidade regionais, prevenindo-se conitos por meio da ampliação da legiti-
midade política e da capacidade de solução pacíca das controvérsias, no contexto
da defesa comum dos países do bloco.
Palavras-chave: Democracia. Integração. Mercosul. Defesa.
1 Introdução
O presente artigo trata da relevância da democracia no processo de conso-
lidação e aperfeiçoamento do Mercosul, com ênfase aos princípios da atual Carta
Política brasileira que regem as relações internacionais do país, na busca da inte-
gração sul-americana de nações. A abordagem tem a intenção de combinar o for-
talecimento do regime democrático brasileiro com as questões afetas aos aspectos
de segurança e defesa, na linha de preservação da paz, do desenvolvimento e da
estabilidade regional.
1 Advogado, Mestre em Direito e Políticas Públicas, Especialista em Direito Processual Civil
e Professor de 3º Grau (Antropologia Jurídica, Ética Prossional e Direito Administrativo).
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Adriano Portella de Amorim
O trabalho não pretende apresentar as experiências democráticas ou ins-
titucionais vivenciadas pelos demais países que integram a região ou que, direta-
mente ou não, participam do Mercosul. Quando imprescindíveis ao contexto do
tema, essas noções serão mencionadas, na conjugação entre os desaos contem-
porâneos que se colocam diante do Brasil, especialmente quanto à força da legiti-
midade de sua Constituição, não apenas no exercício da soberania interna, mas da
exteriorização de seus postulados diante das demais nações, suscitando a reexão
sobre as pretensões do país, a compreender as nuances da representação política e
da sociedade civil.
Para tanto, será feita a abordagem de determinadas facetas dos aspectos
econômicos da globalização, passando-se pela importância do Mercosul no pro-
cesso de integração, pelos princípios de direito comunitário e de integração no
contexto da soberania, nalizando com a abordagem da política de defesa como
um caminho de preservação da paz a partir da democracia.
2 Desequilíbrios e sobrevivências
As trocas e os intercâmbios entre os povos, as nações e os países são práticas
experimentadas desde os tempos mais remotos, marcados pelo espírito de cola-
boração e – quiçá, principalmente – pela dominação que, dentre outras variáveis,
tem por mecanismos o uso da força, da supremacia do poder econômico e da in-
terferência nos assuntos de natureza política. Com o caminhar da humanidade,
essas ações se tornaram sosticadas, porém seus métodos opressivos resistem e ga-
nham novos matizes que inuenciam as negociações políticas e econômicas, com
reexos nas demais expressões de poder. Filiando-nos ao contexto argumentativo
de Amorim,2 Aguiar,3 Eisler4 e Comparato5 constata-se que, quem tem quer mais,
2 AMORIM, Adriano P. de. Como pensar a defesa nacional?: uma alternativa para a
construção de princípios consensualizados de justiça. Revista Jurídica da Presidência da
República. Brasília, v. 9, n. 84, p.104-116, abr./maio, 2007. e, também, na dissertação de
mestrado intitulada AMORIM, Adriano P. de. Política de defesa na democracia brasileira:
desao ao direito e ao político. Brasília. 259 f. 2008. Dissertação (Mestrado)-Programa de
Mestrado em Direito do Centro de Ensino Unicado de Brasília, Brasilia, 2008.
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Democracia, integração e paz na América do Sul
quem tem pouco não quer perder o que tem e quem nada tem precisa pedir e se
submeter às prerrogativas construídas por aqueles que detêm o conhecimento ou o
poder. A solidariedade e o ato de compartilhar ainda são vistos como gestos deme-
ritórios, rotulados como ameaças à soberania e aos interesses nacionais, com reper-
cussões que atingem qualquer pretensão dirigida a processos de ampla integração.
O avanço tecnológico está intimamente ligado ao processo de globaliza-
ção. Ocorre que nem sempre a tecnologia está a serviço do bem-comum, ou seja,
não raras vezes, suas ferramentas funcionam para separar economicamente nações
ricas e pobres, estabelecendo dependências e estagnações, como assinalou Jagua-
ribe.6 Esses fatores geram assimetrias de difícil reparação interna e externamente.
No caso brasileiro, as recentes discussões a respeito da revisão dos parâme-
tros de utilização da hidroelétrica de Itaipu, das operações da Petrobras na Bolívia
e do alegado valor universal da Amazônia revelam fatos e rupturas que desaam o
direito e o político, na transcendência dos limites geopolíticos do cone sul. No caso
de Itaipu, perquire-se o equilíbrio entre a rigidez do contrato e a distribuição equi-
tativa de seus resultados. As renarias da Petrobras em solo boliviano colocaram na
agenda político-econômica as assimetrias entre a iniciativa privada e a soberania ex-
terna do Brasil e de outras nações. A região amazônica traz a polêmica que polariza
a ambivalência entre preservar e desenvolver, na inversão do argumento que no pas-
sado condicionava a soberania à exploração econômica dos territórios, que serviu
de legitimação à colonização, à invasão e à anexação de territórios.7 Não há receita
para solucionar esses temas senão a composição e a formação de consensos que pos-
sam convergir para a concretização de interesses nacionais, regionais e multilaterais.
3 AGUIAR, Roberto A. R. de. Os lhos da echa do tempo: pertinência e rupturas. Brasília:
Letraviva, 2000.
4 EISLER, Riane Tennenhaus. O cálice e a espada: nossa história, nosso futuro. Via Optima,
1998.
5 COMPARATO, Fábio Konder. Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. São
Paulo: Companhia das Letras, 2006.
6 JAGUARIBE, Helio. O Brasil ante o século XXI. In: Carvalho, Joaquim F. de (Org.). O
Brasil é viáve?: uma análise de aspectos críticos da realidade brasileira, seguida de esboço
de diretrizes estratégicas para um projeto nacional. São Paulo: Paz e Terra, 2006. p. 191-210.
7 Essas reexões têm inspiração em FERRAJOLI, Luigi. A soberania no mundo moderno:
nascimento e crise do estado nacional. São Paulo: M. Fontes, 2002; em RIBEIRO,

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