Das Espécies de Execução

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas2086-2316

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Seção I - Execução para a entrega de coisa certa
1. Generalidades

O Código de Processo Civil de 1939, mantendo uma tradição que vinha desde o famoso Regulamento n. 737, de 1850 (na verdade, um Código de Processo Comercial, instituído pelo Governo do Império e que passou a ser aplicado às causas civis, por força do Decreto n. 763, de 19-9-1890, emitido pelo Governo Republicano Provisório), continha, no Título IV do Livro III, disposições a respeito “Da execução por coisa certa, ou em espécie” (sic). Essa expressão legal se encontrava, contudo, comprometida pelo substantivo espécie, que não estabelecia a necessária correlação lógica com o adjetivo certa.

O diploma processual civil vigente, rompendo com essa imprecisa tradição terminológica, denominou o Capítulo II do Título II do Livro II de “Execução para a Entrega de Coisa”, falando em coisa certa na Seção I e coisa incerta na Seção II.

Diz-se certa a coisa que se encontra perfeitamente individuada, que se identifica segundo as suas características, não sendo, por isso, confundível com qualquer outra; incerta é a coisa que se determina apenas por seu gênero e quantidade, não possuindo traços distintivos capazes de identificá-la.

Por princípio, a coisa certa é sempre infungível, do mesmo modo como são fungíveis (ou seja, substituíveis por outras, da mesma espécie, qualidade e quantidade: CC, art. 85) as incertas.

A execução destinada à entrega de coisa corresponde às obrigações de dar (ad dandum) em geral, pouco importando que o direito a ser tornado efetivo seja de natureza real ou pessoal. Conforme leciona Alcides de Mendonça Lima, a finalidade da execução para a entrega de coisa se revela mediante três modalidades de prestação, que constituem espécies distintas da entrega: dar, prestar e restituir. “Na ideia de dar, não se trata, evidentemente, de transferir o domínio, sendo o termo usado em sentido amplo. O bem, pela obrigação assumida pelo devedor ou pela condenação imposta, já passou a ser do credor ou já foi reconhecido o direito que esse sobre o mesmo tinha. O devedor deverá apenas entregar o que não é seu, embora com ele sempre estivesse. Prestar tem o sentido

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de ser feita uma coisa para, ao concluí-la, entregar ao credor. E, finalmente, restituir corresponde a devolver o que já é do credor, mas que cedeu a posse ao devedor, sem que esse se resolva a entregar a coisa a seu dono” (ob. cit., v. VI, tomo II, p. 762).

Não visa a execução em exame, todavia, à expropriação dos bens patrimoniais do devedor e sim a fazer com que este entregue a coisa, certa ou incerta, a que foi condenado a realizar; caso o devedor não cumpra a obrigação, não se cogitará de penhora - ato constritivo próprio da execução por quantia certa -, e sim de expedição de mandado de busca e apreensão, sendo o bem móvel, ou de imissão na posse, sendo imóvel (CPC, art. 625).

Cumpre indagar, nesta quadra de nossa exposição, se a execução para a entrega de coisa certa é cabível no processo do trabalho, sabendo-se que a CLT é, rigorosamente, omissa a respeito da matéria. A resposta a isso está ligada de maneira íntima ao problema da competência da Justiça do Trabalho para apreciar as ações possessórias previstas no CPC. Não estamos nos referindo aos embargos de terceiro, ação de natureza caracteristicamente possessória, hoje admitida, de maneira pacífica, neste processo especializado, e sim à manutenção e reintegração de posse e ao interdito proibitório (CPC, arts. 926 a 933).

As controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais acerca do tema são ainda intensas, conquanto se perceba uma tendência de reconhecer-se à Justiça do Trabalho competência para apreciar ações possessórias. Pela nossa parte, entendemos que, se a pretensão dessa índole estiver diretamente relacionada com o contrato de trabalho, ou decorrer de cláusula deste, aberta estará a possibilidade de a Justiça do Trabalho examiná-la, sem que isso implique transvazamento dos limites de sua competência, estabelecidos constitucionalmente (art. 114). Em muitos casos, e. g., o empregado ocupa determinado imóvel, pertencente ao empregador, que lhe é cedido não a título de locação, mas sim de prestação salarial in natura (CLT, art. 458); em tantos outros, o empregado tem os seus instrumentos de trabalho (ferramentas, mostruários, etc.) retidos arbitrariamente pelo empregador (em regra, após a terminação da vigência contratual); nas situações ora enunciadas - e em diver-sas outras, reveladas pelo dinamismo da realidade das relações jurídicas subjetivas que soem ser estabelecidas entre empregados e empregadores -, a parte legalmente legitimada poderá deduzir, na Justiça do Trabalho, pretensão de natureza possessória, destinada a reaver o bem, móvel ou imóvel, indevidamente retido pela outra.

Transitando em julgado a sentença condenatória do réu, o autor, agora transmudado em credor, estará habilitado a promover a consequente execução para a entrega de coisa certa (se este...

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