Das incapacidades

AutorBassil Dower, Nelson Godoy
Ocupação do AutorProfessor Universitário e Advogado em São Paulo
Páginas108-133

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8. 1 Capacidade de direito e capacidade de exercício

Enquanto feto, inexiste a pessoa. Nascendo com vida, torna-se titular de direito, não importa se com menos de nove meses, nem o grau de seu

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desenvolvimento psíquico, nem se é homem, mulher, doente ou sadio. É a chamada capacidade jurídica ou de direito, "aquela condição legal que o capacita à faculdade dos direitos e obrigações existentes em potencialidade".66

Existem pessoas que não podem, por si mesmas, exercer quaisquer atos da vida civil senão por intermédio de seu representante legal; existindo outras que podem praticar tais atos da vida civil, pessoalmente, mas têm que estar acompanhadas de seu representante legal. São os absolutamente incapazes e os relativamente incapazes, respectivamente. O enfermo mental, por exemplo, embora tenha capacidade jurídica, não tem a faculdade de praticar pessoalmente os negócios jurídicos. Falta-lhe a capacidade de exercício. Não pode comparecer pessoalmente para praticar um ato jurídico. Se praticá-lo nulo é o seu ato por absolutamente incapaz.

Com relação aos relativamente incapazes, o tribunal já decidiu que o "relativamente incapaz deve ser pessoalmente citado, com a assistência dos responsáveis" (in RT 652/96), isto porque o relativamente incapaz deve comparecer pessoalmente para praticar o ato jurídico, desde que acompanhado do seu representante legal.

Não devemos esquecer da existência da classe dos capazes, portadores da capacidade de exercício ou de fato, que é a aptidão que tem o homem de agir por si mesmo, desacompanhado, em todos, os atos da vida civil. Essas pessoas adquirem essa espécie de capacidade no momento em que deixa de ser incapaz.

A situação acima pode ser reproduzida por um círculo que corresponde à existência das pessoas portadoras de capacidade jurídica, os sujeitos de direitos, que constituem, por exemplo, a população de uma nação. Suponhamos que a metade desses habitantes seja os incapazes e, a outra, os capazes. Conjecturemos, ainda, que a metade dos incapazes seja formada pelos absolutamente incapazes e pelos relativamente incapazes, meio a meio, conforme os círculos abaixo: há o circulo maior das pessoas portadoras da capacidade de exercício, que são os capazes, e outros dois menores, os incapazes, que não possuem capacidade de exercício: os absolutamente incapazes e os relativamente incapazes. A diferença está que os absolutamente incapazes não podem comparecer, pessoalmente, para praticar um ato jurídico, enquanto que os relativamente incapazes podem comparecer pessoalmente, desde que assistidos do seu representante legal.

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Concluindo, todos os seres humanos têm capacidade jurídica, mas só os capazes têm capacidade de exercício.

Reprisando o que foi dito acima, tem-se que a sociedade brasileira encontra-se composta de capazes e incapazes. Aqueles que podem exercer por si mesmos os atos da vida civil, são chamados de capazes; os que não podem exercer por si mesmos, são os absolutamente incapazes, e os que só podem com a assistência de seus representantes legais, são os relativamente incapazes.

8. 2 Os capazes e os incapazes

"A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil" (CC, art. 5º). Ou seja, os homens, ao completarem dezoito anos, não sendo doentes mentais, adquirem capacidade plena, podendo, pessoalmente, praticar todos os atos da vida civil. São os capazes. Podem, então, pessoalmente, vender e comprar bens, fazer doações, outorgar procuração a um advogado etc.

Há aqueles que não podem exercer pessoalmente os direitos, ou aqueles que só podem fazê-lo com a assistência de seus responsáveis. Resulta, pois, que há duas espécies de incapacidade ou se apresentam em duas categorias: os absolutamente e os relativamente incapazes, como vimos anteriormente.

8. 3 Os absolutamente incapazes

"Em se tratando de menores impúberes, são absolutamente incapazes para a outorga de procuração, tanto por instrumento particular, como por instrumento público, eis que inibidos de emitir consentimento como requisito integrativo à validade do respectivo ato jurídico. Logo, - concluiu o tribunal - não pode exigir que os mesmos

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outorguem procuração para advogado. A postulação é feita por quem os representa legalmente, no caso a mãe, que outorgou mandato válido para advogado procurar em juízo" (in RT 709/168).

O legislador entende que os absolutamente incapazes não têm discernimento necessário ao exercício pessoal dos próprios direitos e obrigações. Por isso, são afastados de qualquer atividade civil, não podendo praticar os atos da vida jurídica, pessoalmente. Contudo, como essas pessoas têm direitos67, por serem portadoras da capacidade jurídica, alguém lhes supre as deficiências, praticando por ela os atos materiais ou formais da vida civil. Esse alguém é o representante legal (os pais, o tutor ou curador) que age em nome do incapaz. "É nulo - diz o art. 166, I, do CC - o negócio jurídico quando: I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz".

"São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil - diz o art. 3º do CC:

I - os menores de dezesseis anos;

II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;

III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade".

Vale, a respeito, ter presente as palavras do próprio artigo da lei acima transcrito: são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente, ou seja, não podem comparecer ao ato e praticá-lo.

8.3. 1 Os menores de dezesseis anos

O legislador entende que as pessoas com menos de 16 anos de idade não possuem desenvolvimento mental suficiente para atuar por si próprias no mundo do direito civil e empresarial. Elas têm direitos, porém, não podem exercê-los pessoalmente, devendo ser representadas pelo pai, mãe ou tutor. Por exemplo, se o menor tiver que outorgar procuração ad judicia a um advogado, poderá fazê-lo através do seu representante legal, que assina a procuração em

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nome de seu representado, consoante mostra a ementa do acórdão destacado no início deste item. O Tribunal já decidiu que, "tratando-se de menor absolutamente incapaz, ocorre a representação e o representante pratica por si o ato que é de interesse do representado, podendo, pois, outorgar procuração "ad judicia" por instrumento particular" (in RT 551/72).

8.3. 2 Os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil

A lei despreza a vontade dos portadores de enfermidade ou de retardo mental, proibindo-os de comparecer, pessoalmente, para praticar os atos da vida civil. Se, por acaso, um deficiente mental comparece praticando o ato, este é nulo. A propósito, lembramos novamente o princípio do art. 166, I, do CC: "É nulo o negócio jurídico quando: I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz".

Há doente mental que possui intervalos de lucidez. Há aquele cuja enfermidade é facilmente perceptível aos olhos dos leigos. Como saber da ausência de discernimento para os atos da vida civil? Como, então, reconhecêlos na vida prática?

Depende do processo de interdição, regulado pelos arts. 1.177 e ss do CPC, com fundamento no art. 1.767 do CC, pois os atos praticados pelos alienados mentais, antes da decretação judicial de interdição, data vênia, são válidos. "Sem que previamente tenha sido interditado - decidiu o tribunal - ninguém pode ser considerado incapaz" (in RT 447/63). "Não se pode exigir de terceiros o entendimento e a desconfiança de possível incapacidade do contratante. A interdição só produz efeitos após seu acolhimento por sentença e à lei importa mais proteger terceiro de boa-fé do que interesse de incapaz.

Os negócios praticados por amental não interditado são válidos, sendo que sua anulação só pode ser pleiteada em ação própria" (in RT 618/188)68.

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É, pois, importante saber, juridicamente, quando uma pessoa é ou não um amental. Se, por exemplo, alguém compra uma casa de um doente mental interditado, o ato praticado pessoalmente por este é nulo. Mesmo que já passados 9 anos da venda, no momento em que alguém levar ao conhecimento do juiz a nulidade existente, este a declarará e, concomitantemente, também a inexistência das demais alienações para que o imóvel retorne à posse do interditado, isto porque, "na hipótese de ser o agente absolutamente incapaz, - decidiu o tribunal - sendo conseqüentemente o ato nulo, a prescrição é a normal de 20 (atualmente é de 10) anos" (in RT 684/71).

O processo de interdição regulado pelos arts. 1.177 e ss do CPC iniciase com um requerimento dirigido ao juiz, feito pelo pai, mãe, tutor, cônjuge, por algum parente próximo ou pelo Ministério Público (CPC art....

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