Da advocacia

AutorHélio Vieira - Zênia Cernov
Páginas297-324

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Capítulo I Da atividade de advocacia
Seção I Da Atividade de Advocacia em Geral

Art. 1º A atividade de advocacia é exercida com observância da Lei n. 8.906/94 (Estatuto), deste Regulamento Geral, do Código de Ética e Disciplina e dos Provimentos.

A advocacia é uma profissão regulamentada, regida pelo Estatuto da Advocacia e da OAB, cuja regência é suplementada pelo presente Regulamento Geral, pelo Código de Ética e Disciplina e pelos provimentos expedidos pelo Conselho Federal. A submissão dos advogados a esses últimos decorre da autorização legal que a Lei n. 8.906/94 conferiu à entidade para autorregular-se quanto à sua estrutura administrativa e funcionamento (art. 78) e quanto à disciplina (art. 33), obrigando-os a cumprir os deveres definidos nesses instrumentos normativos, no exercício de suas atividades. A ampla autonomia que foi conferida à OAB, outorgando-lhe como finalidades o munus público de defender a democracia, a legalidade e os direitos humanos, entre outros valores jurídicos, e a responsabilidade de promover a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados, sem, contudo, atrelá-la a vínculos com a administração pública ou hierarquias de qualquer ordem, impõe grande responsabilidade na regulamentação dessa profissão, tão grandiosa a ponto de merecer status constitucional de serviço essencial à Justiça. O advogado, ora é aplaudido, ora é execrado pela sociedade. No Império Romano, eram os advogados que exerciam os cargos mais cobiçados, e essa condição provocava grande debate entre as classes sociais. A advocacia brasileira teve participação ativa nos maiores eventos históricos de nosso país e sempre foi a mais forte voz em defesa da democracia. A autonomia de que se reveste a OAB e o poder regulamentar que lhe foi outorgado fazem com que a atividade seja regida precipuamente pela Lei n. 8.906/89 e seus próprios atos normativos internos, afastando a incidência de leis outras que regem outras atividades, ainda que de prestação de serviços. Disso dessume-se, por exemplo, a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à atividade da advocacia. Conforme bem definido pelo plenário do Conselho Federal da OAB, "a Lei n. 8.906/89 esgota toda a matéria, descabendo a aplicação subsidiária do CDC" (Súmula n. 2), corolário do princípio que deve ser sempre aplicado de que a lei especial (Estatuto da OAB) exclui a lei geral no que diz respeito à regulamentação da profissão do advogado. Na mesma linha de pensamento, tem-se concluído que o prazo prescricional das infrações disciplinares, previsto no art. 43 do EAOAB, prevalece sobre as regras gerais: "O lapso prescricional a ser observado é o constante do art. 43 do Estatuto da Advocacia, que é lei especial e posterior ao art. 109 do Código Penal, que é lei geral." (TRF 1ª Região, AC 73712120034013500, Rel. MIGUEL ÂNGELO DE ALVARENGA LOPES, 6ª turma suplementar, publ. e-DJF1 18/10/2013). Sempre homenageando o poder de autorregulamentação conferido à OAB, a força coercitiva do Regulamento Geral tem sido amplamente e reiteradamente acatada pelo Poder Judiciário e, dentre os vários precedentes, destacamos: a) legalidade das regras atinentes ao processo

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eleitoral: "(...) 2. Há expressa previsão legal, tanto na Lei n. 8.906/94 quanto no Regulamento Geral, no sentido de que as eleições no âmbito da OAB devem se dar pela apresentação de chapa completa, por meio da escolha de todos aqueles que irão compor os órgãos de direção da instituição, e não somente do presidente e do vice. 3. O Regulamento Geral não extrapolou o seu poder regulamentar, tendo em vista que devidamente autorizado a fixar a forma, os critérios e os procedimentos para a eleição" (TRF 1ª Região, AC 0042160-24.2000.4.01.3800, Rel. WILSON ALVES DE SOUZA, 5ª turma suplementar, e-DJF1 17/05/2013); b) legalidade da exigência de encontrar-se adimplente com as anuidades para exercer o direito de voto: "(...) A OAB, autarquia especial, ostenta legitimidade para estabelecer requisitos formais habilitando os seus associados a exercitarem o direito de voto, fixando requisitos em lei e regulamentos, porquanto autorizado pelo exercício do Poder Regulamentar da Administração." (STJ, REsp 907868/PE, Rel. Min. LUIZ FUX, 1ª turma, publ. DJe 02/10/2008). Sem se afastar das previsões contidas no Estatuto e no seu próprio Regulamento Geral, igualmente é reconhecida a imperatividade dos provimentos expedidos pelo Conselho Federal, os quais, ora suplementam o Estatuto e esse próprio Regulamento, ora regulamentam alguns de seus institutos (como a prestação de contas, o Exame de Ordem e as eleições), ora suprem suas omissões. SÚMULA N. 02 DO CFOAB - Pleno: "ADVOCACIA. CONCORRÊNCIA. CONSUMIDOR. 1) A Lei da advocacia é especial e exauriente, afastando a aplicação, às relações entre clientes e advogados, do sistema normativo da defesa da concorrência. 2) O cliente de serviços de advocacia não se identifica com o consumidor do Código de Defesa do Consumidor - CDC. Os pressupostos filosóficos do CDC e do EAOAB são antípodas e a Lei 8.906/94 esgota toda a matéria, descabendo a aplicação subsidiária do CDC."

"Lei 12.683/12, que altera a Lei 9.613/98, para tornar mais eficiente a persecução penal dos crimes de lavagem de dinheiro. Inaplicabilidade aos advogados e sociedades de advogados. Homenagem aos princípios constitucionais que protegem o sigilo profissional e a imprescindibilidade do advogado à Justiça. Lei especial, Estatuto da Ordem (Lei 8.906/94), não pode ser implicitamente revogado por lei que trata genericamente de outras profissões. Advogados e as sociedades de advocacia não devem fazer cadastro no COAF, nem têm o dever de divulgar dados sigilosos de seus clientes que lhe foram entregues no exercício profissional. Obrigação das Seccionais e Comissões de Prerrogativas Nacional e estaduais de amparar os advogados que ilegalmente sejam instados a fazê-lo." (CFOAB, Órgão Especial, Consulta n. 49.0000.2012.006678-6, Relª. DANIELA RODRIGUES TEIXEIRA (DF), publ. DOU 23.08.2012, p. 71).

Art. 2º O visto do advogado em atos constitutivos de pessoas jurídicas, indispensável ao registro e arquivamento nos órgãos competentes, deve resultar da efetiva constatação, pelo profissional que os examinar, de que os respectivos instrumentos preenchem as exigências legais pertinentes. Parágrafo único. Estão impedidos de exercer o ato de advocacia referido neste artigo os advogados que prestem serviços a órgãos ou entidades da Administração Pública direta ou indireta, da unidade federativa a que se vincule a Junta Comercial, ou a quaisquer repartições administrativas competentes para o mencionado registro.

· Vide art. 1º, § 2º, do EAOAB - p. 20.

Os atos constitutivos de pessoas jurídicas só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes, se vistados por advogado, sob pena de nulidade. A norma não buscou criar um empecilho ao registro das pessoas jurídicas, nem uma nova forma de arrecadação de honorários, mas buscou proteger os sócios das pessoas jurídicas, terceiros a ele ligados e a sociedade em geral, no sentido de que tais atos constitutivos efetivamente contenham previsão quanto a aspectos relevantes e obrigacionais que devem reger uma sociedade. Por tal motivo é que nosso Regulamento determina que o visto do advogado deve resultar da efetiva constatação, pelo profissional que os examinar, de que os respectivos instrumentos preenchem as exigências legais pertinentes, a fim de que atos constitutivos mal elaborados, omissos ou com disposições ilegais ou conflituosas entre si não sejam levados a registro. Não há necessidade de que o advogado participe da elaboração do ato constitutivo, mas de que examine e constate que este preenche as exigências legais, com especial atenção para que seus termos não conflitem com disposições do Código Civil e Código do Consumidor. Conforme o procurador do Banco Central do Brasil AFRÂNIO CARLOS MOREIRA THOMAZ, "Na qualidade de profissional que lida diretamente com o Direito, e em sintonia com o art. 1º, II, da própria Lei 8.906/94, o advogado é, em tese, a pessoa mais credenciada para confeccionar o contrato social - o que fará com base nas informações recebidas dos sócios. Mas, quando não for assim, na hipótese de os sócios lhe apresentarem um contrato redigido previamente por eles mesmos, é claro que o advogado sério e responsável somente assinará esse ato constitutivo após acurada leitura, na qual deverá se certificar da legalidade de seus termos, e se estes realmente expressam com fidelidade os desígnios e interesses dos sócios, recomendando eventuais alterações e acréscimos que se fizerem necessários" (Considerações acerca da obrigatoriedade da aposição do visto de advogado em atos constitutivos de sociedades empresárias,

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Revista EMERJ, vol. 11, n. 44, 2008). Estão impedidos de exercer tal ato os advogados que prestem serviços a órgãos ou entidades da administração pública direta ou indireta da unidade federativa a que se vincule a Junta Comercial, ou a quaisquer repartições administrativas competentes para o registro, o que evita, a um só tempo, que estes indiretamente "dispensem" a exigência do visto efetuando tal ato, ou que captem em seu favor o exercício de tal atividade. A violação a esse impedimento caracteriza infração disciplinar (Art. 34, inc. I, do EAOAB).

"1 - Visto do advogado. Atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas. Não há necessidade, para aludido visto, que o advogado tenha participado da elaboração, total ou parcial, do respectivo instrumento. Basta, para...

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