Crédito Tributário

AutorDeusmar José Rodrigues
Ocupação do AutorAdvogado (Procurador da Fazenda Nacional) e Contador
Páginas161-189

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16. 1 Comentários iniciais

O legislador do Código Tributário Nacional optou por conferir regulamentação apartada entre obrigação e crédito. Disciplinou antecedentemente a obrigação para logo em seguida regulamentar o crédito tributário. A obrigação tributária já passou sob nosso crivo. Agora deitaremos comentários sobre o crédito tributário.

O artigo 139, que abre o título do crédito tributário, trouxe esta redação: "O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta." A obrigação principal - vimo-la - implica transferir dinheiro ao fisco por motivo de solvência de tributo ou penali-dade. Ao prescrever a lei que o crédito tributário decorre da obrigação principal, quer ela dizer que o crédito está em relação de dependência para com a obrigação. Noutras palavras, não há crédito sem obrigação prévia. O crédito é consequência da obrigação. Paulo de Barros Carvalho93define crédito tributário "como o direito subjetivo de que é portador o sujeito ativo de uma obrigação tributária e que lhe permite exigir o objeto prestacional, representado por uma importância em dinheiro".

O artigo 140 anuncia a autonomia da obrigação diante do crédito. O crédito, rectius, o lançamento pode ser modificado no seu quantum

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ou na parte das garantias ou privilégios. Pode o lançamento até ser declarado nulo por vício formal que a obrigação sobrevive e novo lançamento poderá ser confeccionado.

A próxima disposição, ou seja, o artigo 141, não permite que o crédito regularmente constituído seja modificado ou extinto ou tenha sua exigibilidade suspensa fora das previsões legais. A norma faz questão de dizer que o crédito tributário rege-se pelo princípio da indisponibilidade do interesse público.

16. 2 Lançamento

Atribui-se à doutrina alemã a distinção elaborada em Direito Tributário material e Direito Tributário formal. Sobre dita dualidade tecemos diminutos comentários em tópico atrás lavrado. O significado preciso da distinção tenta construir-se partindo de premissas incomuns. Sem embargo, podemos estabelecer que as normas de Direito Tributário material criam diretamente direitos subjetivos e deveres jurídicos para os sujeitos da relação jurídica tributária. As normas de Direito Tributário formal tutelam, indiretamente, os direitos subjetivos e os deveres jurídicos e, como dissemos alhures, são instrumentais. As normas sobre o lançamento inserem-se no Direito Tributário formal.

16.2. 1 Conceito

O Código Tributário Nacional não se furtou em dar também seu conceito de lançamento. Assim, o colacionou no artigo 142, dizendo que compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento,

assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor a aplicação da penalidade cabível.

Uma realidade há e dela devemos tomar ciência. O conceito de lançamento é norma jurídica no país e pode ser revogado tácita ou expressamente por norma superior ou posterior de mesma hierarquia.

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A crítica que se faz rotineiramente sobre o Código ter rotulado o lançamento de "procedimento" parece-nos procedente. O lançamento é um ato jurídico praticado pelo agente da Administração Tributária e, quando muito, confunde-se com o ato final de um procedimento.

O conteúdo do artigo 142 também estrema a dúvida de que "Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento." Veremos que existe uma modalidade de lançamento (lançamento por homologação) na qual o sujeito passivo pratica o fato gerador, registra os dados em sua escrita oficial, promove o pagamento e denuncia os fatos ao sujeito ativo sem que fosse necessária a prévia participação do fisco. Este, de futuro e no prazo legal, revendo os fatos, homologará o procedimento do contribuinte ou extrairá lançamento suplementar. Assim, no lançamento por homologação, não haveria lançamento pela autoridade administrativa, desmentindo o preceito do CTN que o fez monopólio da autoridade tributária? Ao questionamento responde-se com a justificativa de que o procedimento não é exclusivo da autoridade, podendo o sujeito passivo conduzi-lo. O ato jurídico administrativo da homologação, que sempre haverá no lançamento por homologação, continua a ser privativo da autoridade administrativa, endossando a tese de que o lançamento é privativo da autoridade pública. Isso tornam coerentes as regras dos artigos 142 (atividade privativa da autoridade administrativa) e 150 (antecipação de pagamento sem prévio exame da autoridade).

Ainda mais avante, dizemos que o lançamento é privativo da autoridade fiscal, mas o sujeito passivo constitui crédito tributário, bem como indica a súmula 436 do STJ, sendo que o depósito judicial do valor do tributo funciona também como tal.

16.2. 2 Natureza jurídica

O objeto de nossa análise persiste, sendo o preceito do artigo 142. Dele infere-se que compete à autoridade administrativa "constituir o crédito tributário pelo lançamento". Interpretação apressada poderia levar o leitor a pensar que a lei teria reconhecido a natureza constitutiva do

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crédito tributário. Interpretação mais detida confirmará que não é essa a sua natureza.

O artigo 144 do CTN revela-nos que o lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador e rege-se pela lei então vigente. Denuncia essa disposição o caráter declaratório do lançamento. Aliás, a obrigação tributária nasce com a realização do pressuposto de fato ou fato gerador. O lançamento converte de ilíquido para líquido o quantum debeatur. Com efeito, o lançamento preserva a situação de fato e de direito existente àquela data. Os efeitos do lançamento são ex tunc. Se fosse constitutivo - e não o é - teria efeitos ex nunc.

O lançamento regularmente confeccionado produz os efeitos de

  1. elidir a denúncia espontânea e b) superar a decadência.

16.2. 3 Modalidades

Os teóricos desse ramo do Direito não se vexam em classificar o lançamento atendendo ao grau de colaboração do sujeito passivo. Se o contribuinte ou alguém por ele apresenta declaração ao fisco, o lançamento daí decorrente é por declaração ou misto, conforme art. 147 do CTN. Quando o contribuinte executa o fato gerador, calcula o montante devido, faz o pagamento e denuncia esse procedimento ao fisco, este atuará homologando ou não os atos daquele, caso em que o lançamento é por homologação, de acordo com o artigo 150. Mas se o fisco toma a iniciativa do lançamento porque o tributo exige ou porque o contribuinte não se desfez do dever, o lançamento é de ofício (ex officio) ou direto, artigo 149 do CTN.

16.2.3. 1 Lançamento por declaração

O lançamento por declaração ou misto ganhou corpo no artigo 147 da Lei Geral Tributária - CTN -, com o seguinte conteúdo:

O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensável à sua efetivação.

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A declaração a que se reporta a lei é uma obrigação acessória atribuída ao contribuinte ou a terceiro, na forma do § 2º do artigo 113. E os dados da declaração podem ser alterados a qualquer tempo, desde que a mutação seja para majorar o valor do tributo. Para redução ou eliminação do tributo, a retificação deve ser protocolizada antes da notificação do lançamento, pois presume-se verdadeira a declaração. Expedida a notificação ao devedor, este não terá como vindicar a retificação da declaração, mas poderá impugnar o lançamento tributário.

Os municípios podem instituir imposto sobre transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos à sua aquisição (ITBI), artigo 156, II, da CF/88, cujo lançamento é por declaração.

José Souto Maior Borges94confidencia-nos: no "lançamento por declaração, ter-se-á que o ato de lançamento deverá suceder a declaração do sujeito passivo ou terceiro e anteceder o pagamento do tributo".

16.2.3. 2 Lançamento por homologação

O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa, artigo 150 do CTN.

É da natureza dessa modalidade de lançamento a participação a posteriori da Fazenda Pública. O contribuinte implementa o fato...

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