Controle jurídico do comportamento ético da administração pública no Brasil

AutorProf . Paulo Modesto
CargoProfessor de Direito Administrativo da Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Páginas1-11

Professor de Direito Administrativo da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e da Universidade Salvador (UNIFACS). Coordenador do Curso de Especialização em Direito Público da UNIFACS. Membro do Ministério Público da Bahia, do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo (IBDA) e do Instituto dos Advogados da Bahia (IAB). Conselheiro Técnico da Sociedade Brasileira de Direito Público (SBDP). Vice-Presidente do Instituto de Direito Administrativo da Bahia (IDAB). E-mail: paulomodesto@yahoo.com.

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I - Apresentação

Ilustríssimo Coordenador deste Painel, Prof. FREDERICO PARDINI, dignos colegas debatedores, Prof.a. MARIA CELESTE GUIMARÓES COSTA e Prof. CARLOS VITOR ALVES DELAMÔNICA, eminente Prof. PLÍNIO SALGADO, Presidente do Instituto Mineiro de Direito Administrativo e grande responsável pelo sucesso deste evento, a quem agradeço a honra do convite para participar destes debates; prezado amigo Prof. VALMIR PONTES FILHO, atual Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo; demais professores, procuradores, membros da magistratura, do Ministério Público, advogados, consultores jurídicos, estudantes do direito administrativo.1

II - Introdução

O tema do controle da administração pública apresenta ampla significação por tocar diretamente com algo encartado na raiz do direito administrativo. Trata-se da relação fundamental entre governantes e governados. Page 2

Em razão dessa inelutável dualidade de sujeitos, a própria ciência do direito administrativo terminou historicamente enfatizando ora um ora outro pólo da relação, e todos nós, ainda que inconscientemente, fazemos o mesmo, em maior ou menor medida. Fala-se então nas ideologias implícitas no direito administrativo.

Com efeito, para uns o direito administrativo nada mais é senão o direito privilegiado do Estado, o direito das prerrogativas exorbitantes do Poder Público, o direito especial do Estado (o que pode ser chamado também enfoque "ex parte principe"). Para outros, porém, em posição diametralmente oposta, o direito administrativo é antes direito defensivo do cidadão frente ao Estado, direito especial da cidadania (enfoque "ex parte populi"). Essas ideologias condicionam em grande parte a interpretação no direito público, e, em especial, dos institutos de direito administrativo. No Brasil, por fatores variados, inclusive pela forma predatória de nossa colonização, predominou sempre uma compreensão autoritária do direito administrativo, que enfatizava antes as perrogativas excepcionais do poder público do que os deveres jurídicos da Administração e as garantias do administrado. Hoje, felizmente, assistimos na doutrina ao menos o maior destaque às garantias, aos instrumentos de controle do poder, a preocupação com os deveres substanciais e formais da administração, com o afivelamento da conduta do Estado, inclusive sob o ângulo da moralidade administrativa.

Os desmandos a que fomos submetidos durante o regime militar e depois por administradores que se arvoraram a donos e iluminados senhores da coisa pública talvez nos tenham ensinado que o exercício do poder no Estado, para ser serviço, atividade de destinação pública, em favor da coletividade e não dos exercentes transitórios do poder, exige antes de tudo responsabilidade e controle.

A rigor, responsabilidade e controle são dois termos expressivos de uma mesma relação jurídica. Responsabilidade diz sobre a situação jurídica do sujeito controlado face ao sujeito controlante. Controle é termo que apreende a situação jurídica do controlante ante o controlado.

No direito administrativo a sujeição a controle é algo inerente ao próprio exercício da atividade, pois esta é vista como função, atividade finalista, dirigida ao interesse de terceiros, cometida ao agente se e enquanto prestante à proteção dos interesses tutelados na lei.

A relação de administração, como se sabe, encarecida como foi no Brasil por autores como os eminentes Profs. CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO e ADILSON ABREU DALLARI, como noção categorial do direito administrativo, encontrou na obra de RUY CIRNE LIMA a mais escorreita tradução.

Para CIRNE LIMA, a voz administração, seja no direito privado, seja no direito público, designa "a atividade do que não é senhor absoluto", cujo traço característico seria "estar vinculada, -não a uma vontade livremente determinada, - porém, a um fim alheio à pessoa e aos interesses particulares Page 3 do agente ou órgão que o exercita" . E, por isso mesmo , consoante o mestre gaúcho, "a relação de administração somente se nos depara , no plano das relações jurídicas, quando a finalidade a que a atividade de administração se propõe, nos parece defendida e protegida, pela ordem jurídica, contra o próprio agente e contra terceiros'. (Princípios de Direito Administrativo. 6a ed. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais, 1987, p. 21).

Ora, dizer "defendida e protegida" a finalidade pública contra o próprio agente e contra terceiros é pretender resguardá-la contra vícios de atuação; é,pois, controlar a atuação da administração.

Ante o exposto, não é nada surpreendente a imensa gama de recursos, lamentavelmente nem sempre efetivos, por razões políticas e culturais, existentes para o controle da administração pública no Brasil.

Entre esses fatos culturais, isto sim surpreendente, conta-se o enorme desconhecimento das alternativas de controle propiciadas pelo adequado manejo dos princípios cogentes da administração pública, alguns dos quais enunciados expressamente no art. 37 da Constituição da Federal.

No Brasil temos o costume de tratar superficialmente os princípios constitucionais, quando não simplesmente menosprezá-los como disposições meramente declamatórias, imprecisas e indetermináveis no seu conteúdo. Nos acostumamos a tratar com obviedades, classificando e subclassificando os preceitos jurídicos, sem o esforço de adensar o seu conteúdo diretivo, identificar os seus usos efetivos, pelos tribunais e demais operadores jurídicos, como se fosse possível o total alheamento da doutrina ao direito efetivamente vivido.

No tema do controle da administração quase sempre nos limitamos a classificar o controle em: A) controle interno (realizado por órgãos integrantes de uma mesma estrutura funcional) e em controle externo (realizado por órgão estranhos a estrutura do sujeito controlado), B) preventivo, concomitante ou sucessivo (vale dizer, o controle que antecede, é contemporâneo ou posteriori ao ato controlado); C) controle objetivo (dirigido a atos funcionais, verificando a sua validade jurídica) e subjetivo (dirigido aos titulares dos órgãos de atuação, como na remoção, nomeação, destituição, etc.)...

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