Os contratos inominados e o novo código civil

AutorHaroldo Malheiros Duclerc Verçosa
Páginas31-36

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1. A disciplina dos contratos inominados na doutrina A liberdade de contratar

O art. 425 do Novo Código Civil (NCC) dispôs que é lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais nele fixadas. Tal regra era desnecessária, uma vez que os contratos inominados ou atípicos desde muito tempo vêm sendo livremente celebrados no Brasil com fundamento nos princípios constitucionais de liberdade das convenções e de iniciati-, va, expressões da autonomia privada (CF, arts. 52, II, e 170, caput). A utilidade da regra do NCC está na indicação do regime jurídico ao qual os contratos inominados se sujeitam, no atendimento àqueles princípios.

Enzo Roppo (O Contrato, Coimbra, Almedina, 1988, p. 132) esclarece que o operador económico do capitalismo necessita ser livre: (i) na fixação, a seu arbítrio, dos termos concretos da operação realizada; (ii) na decisão de efetuar ou não uma certa operação; (iii) na escolha de sua efetivação com uma ou outra contraparte; e (iv) no decidir realizar um determinado "género" de operação ao invés de outro.

O limite da liberdade de contratar é a lei, em sentido amplo, e essa liberdade de contratar aparece sob dois aspectos:

  1. liberdade de estruturação do conteúdo do contrato, facultando-se aos interessados criar as mais diversas obrigações, aumentando ou diminuindo o "esquema legal" não cogente; e

  2. liberdade de não prender-se às espécies contratuais reguladas em lei, facultada a criação de tipos contratuais novos.

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1. 1 A criação de contratos atípicos

A criação de contratos atípicos corresponde a um novo conteúdo, que é colocado pelas partes na "moldura" fixa (cornice), correspondente à sua estrutura geral. Fran-cesco Messineo (// Contratto in Generé) e outros autores desenvolveram importantes estudos no campo da teoria geral do contrato. A partir da identificação de uma estrutura imutável é possível alcançar qualquer objetivo económico por meio do estabelecimento de relações jurídicas entre duas ou mais partes, regulando-as na medida de suas necessidades. Essa estrutura está presente no conceito de contrato insculpido no art. 1.321 do CC italiano de 1942: "Contrato é todo acordo de vontades entre duas ou mais partes com a finalidade de constituir, regular ou extinguir uma relação jurídica de natureza patrimonial".

Os contratos atípicos são formados: (i) pela utilização de elementos originais, não presentes em espécies anteriores; e (ii) pela fusão de elementos próprios de outros contratos, por mudança de elementos típicos ou secundários destes (contratos mistos).

Para efeito da formação de contratos atípicos podem ser combinados:

  1. contratos completos;

  2. prestações típicas inteiras;

  3. elementos mais simples.

    Dessa forma, encontramos as seguintes possibilidades de combinação:

  4. um contrato completo e um elemento simples de outro contrato;

  5. um contrato completo e prestação típica de outro contrato;

  6. prestações típicas de dois ou mais contratos;

  7. prestações típicas e elementos simples de contratos diversos;

  8. etc.

    Como se sabe, frequentemente o legislador recolhe um contrato atípico e o tipifica por meio de lei especial. A tipifica-ção, muitas vezes, é incompleta ou imper-feita do ponto de vista do tratamento jurídico do contrato. Nesses casos, caberá ao usuário utilizar-se da estrutura do contrato e preencher o restante do conteúdo com os elementos de seu interesse, dentro dos limites da lei.

    De outro lado, não se deve confundir contrato misto com união de contratos (contratos coligados).

    Enquanto o contrato misto é caracterizado pela unidade da causa, nos contratos coligados cada qual apresenta a sua causa própria, atingindo-se um determinado objetivo pela soma dos seus resultados.

    A coligação pode dar-se por meio de uma união: (i) meramente externa (instrumental e sem interdependência); (ii) com dependência (embora mantendo a sua individualidade, não se fundindo uns com os outros, os resultados são desejados pelas partes como um todo); e (iii) alternativa, na medida em que um ou outro subsistem na dependência de uma...

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