Consumo, comunicação e humanismo

AutorJoatan Marcos de Carvalho
CargoDesembargador do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR)
Páginas47-60

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I Introdução

A abordagem pretendida com este trabalho situa-se na área de interpenetração do direito do consumo que é tocada por fatos ou conteúdos do direito da comunicação, mais especificamente, pela publicidade.

Para isso, iniciamos com uma rápida análise da comunicação social, fazendo uma diferenciação entre propaganda e publicidade e estabelecendo alguns contornos para esta última, no que interessa à relação de consumo.

Em seguida, tratamos dos aspectos legais, buscando estabelecer uma verticalidade lógica entre os vários níveis normativos que fundamentam as relações de consumo.

Uma vez estabelecidas as proteções legais que regulamentam o trato entre os fornecedores e consumidores, passamos à análise dos problemas que surgem dessas relações.

Veremos, então, como podem ser solucionados os conflitos que surgem dessas relações, através dos aparatos que se destinam a essa finalidade.

E, para finalizarmos, procuraremos incursionar em direção aos caminhos que levam ao futuro das relações de consumo, sempre tendo em conta o aspecto da publicidade que envolve a questão.

II Propaganda e publicidade

O que é propaganda? Muito embora haja inúmeras definições do que seria propaganda, o mais importante é distinguirmos propaganda de publicidade, do comercial, do reclame, do anúncio etc. A propaganda, segundo Jacques Ellul1, é fenômeno que ocorre tanto nos "estados democráticos" quanto nos Estados totalitários; muitas vezes de forma mais intensa, subliminal e mais eficaz em países democráticos.

É indiscutível que, presentemente, é difícil conceituar países com regimes puros, em que a democracia seja plena, ou mesmo que o totalitarismo seja dominante. Na China, por exemplo, embora não sejam plenas as liberdades democráticas, o país possui uma forte economia de mercado.

Podemos ficar somente neste exemplo, porque bem sabemos que atualmente vivemos em um mundo globalizado e que estamos sujeitos ao sistema neoliberal, de forma que mesmo nos países menos e mais democráticos existe uma "economia dita de mercado".

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Avelãs Nunes2, professor jubilado de economia política da Universidade de Coimbra, costuma dizer que o neoliberalismo é uma doutrina tão envolvente e peculiar que se adapta a qualquer sistema político e forma de governo. É bem verdade que ele previa a ruptura do modelo, o que efetivamente ocorreu; entretanto, como se sabe, o sistema está se refazendo e os novos pressupostos é tema que merece análise, muito embora não nesta ocasião.

De qualquer modo, é importante saber que tanto propaganda como publicidade são manifestações que ocorrem em praticamente todos os países do mundo, não importando qual a orientação política ou ideológica a que, alegadamente, esteja sujeito.

Como visto, a publicidade é ocorrência de países democráticos de direito, relativamente democráticos de direito; ou de qualquer outra natureza. Tampouco importa aqui adentrarmos em considerações a respeito do que seria um estado democrático de direito.

Basta, para os limites desta abordagem, conceituar democracia como o regime que se exercita através de um pluralismo de representações civis, com poderes constituídos relativamente harmônicos, em que uma Constituição com princípios sociais, políticos e econômicos é respeitada.

Para nos atermos a um exemplo simples, vamos dizer que as veiculações político-partidárias são exemplos de propaganda; e as veiculações que incentivam o consumo de bens e serviços são manifestações publicitárias.

III A publicidade

A comunicação tornou-se na sociedade contemporânea não só uma de suas características, mas uma de suas faces mais intensas. Através dela as pessoas ficam sabendo as últimas notícias, acontecimentos, novidades sobre pessoas, produtos, serviços, enfim dos acontecimentos do mundo.

O desejo e a necessidade de consumir, seja de bens indispensáveis à subsistência como os dispensáveis e supérfluos, encontram na comunicação o meio para que cheguem ao conhecimento do consumidor.

O professor José Francisco de Faria Costa3afirmou, por ocasião de uma greve na Universidade de Coimbra, no final de 2003, que o movimento só passou a existir quando a notícia foi veiculada pelos órgãos de comunicação.

Desta tarefa necessária e útil se encarrega a comunicação. Entretanto, a publicidade não é apenas informação, é persuasão, convencimento.

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Ao veicular-se um anúncio publicitário não se espera apenas informar o consumidor, mas sim vender o que está sendo anunciado.

Não se pode afastar da publicidade o seu caráter comercial, que tem por finalidade despertar no público alvo o desejo da compra, levando-o à ação de aquisição.

Muitas vezes temos necessidade de um bem, um produto ou um serviço; podemos necessitar de um veículo, uma caneta, um aparelho de telefonia fixa ou móvel; a esta necessidade básica a publicidade busca emprestar elementos para a satisfação do desejo.

Neste espaço é que há lugar para as griffes, marcas, assinaturas e para os autores e seus direitos.

A publicidade dita institucional busca exatamente isso: fixar, no imaginário dos consumidores, as marcas, as griffes, os estilos de vida oferecidos pelas empresas. Todos os anos são publicadas as relações (o ranking) das marcas mais valiosas.

A publicidade promocional visa a divulgação de um produto ou serviço, por meio da apresentação e descrição de suas características e utilidades; fazendo com que o consumidor tenha conhecimento do que está sendo oferecido ao mercado.

Só a título ilustrativo, vale mencionar algumas técnicas publicitárias, como o teaser (provocação) - publica-se um pré-anúncio que desperta a curiosidade do destinatário, para o anúncio complemento que se seguirá; o puffing, que é o exagero publicitário - (certamente nenhum veículo normal vence rampas superiores a 45 graus de inclinação, muito embora sejam mostrados em locais que o acesso seria impossível).

Na publicidade comparativa o anunciante confronta seu produto ou serviço com os demais produtos existentes no mercado. Há vedação quando a publicidade denigre o produto da concorrência, visando alcançar vantagem para o seu produto.

Uma das formas mais envolventes de propaganda é o merchandising, que é a publicidade de produtos ou serviços em vídeo, áudio ou artigos impressos em sua situação normal de consumo, sem declarar ostensivamente a marca.

Não nos cabe aqui exaurir ou detalhar as formas de publicidade e propaganda, as mídias ou meios pelos quais elas são vinculadas; o propósito é dar uma ideia geral, para que, na continuidade, possamos analisar, também em linhas gerais, as irregularidades que são vedadas.

Ao veicular-se um anúncio publicitário não se espera apenas informar o consumidor, mas sim vender o que está sendo anunciado

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IV Aspectos legais

A questão tem aspectos e foros internacionais. A Uncitral (United Nations Commisssion on International Trade Law) tem disciplinado a matéria, que também foi regulamentada tanto pelo Conselho da Europa como pela União Europeia, basicamente pela Convenção do Conselho da Europa e pela Diretiva sobre Televisão Transfronteiras, hoje denominada Diretiva da Comunicação Social Audiovisual...

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