A Garantia Constitucional do Postulado da Efetividade desde o Prisma das Sentenças Mandamentais

AutorDarci Guimarães Ribeiro
Ocupação do AutorDoutor em Direito pela Universitat de Barcelona; Especialista e Mestre pela PUC/RS; Professor Titular da Unisinos e do Programa de Pós-Graduação em Direito
Páginas135-160

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SUMÁRIO: 1 Noções Gerais. 2 O Postulado da Efetividade. 3 As Sentenças Mandamentais. 3.1 Origem. 3.2 Contribuição da Doutrina Brasileira. 3.3 Características. 3.4 Diferença das Demais Espécies de Sentenças. Bibliografia.

“¿Te parece posible que subsista sin arruinarse
aquella ciudad en la que las sentencias
pronunciadas nada pueden, sino que son
despojadas de su autoridad y
destruidas por los particulares ”,
Sócrates, apud Platão, Critón. Trad. por Maria Rico Gómez. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1994, p. 13 (50b).

1 Noções Gerais 1 Noções Gerais1 Noções Gerais 1 Noções Gerais1 Noções Gerais

A sociedade brasileira vive um momento peculiar de transformação social. A partir dos anos 90, novos fatores sociais passam a destacar-se na sociedade civil organizada, sugerindo, por conseguinte, novas demandas sociojurídicas. Neste início de século XXI, deparamo-nos com várias crises nas sociedades de um modo geral e, em especial, na sociedade brasileira; estas crises evidenciam uma necessidade urgente de revisão de paradigmas1,

* Doutor em Direito pela Universitat de Barcelona; Especialista e Mestre pela PUC/RS; Professor

Titular da Unisinos e do Programa de Pós-Graduação em Direito; Professor Adjunto na PUC/ RS; Advogado; Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual Civil; Membro Representante do Brasil no Projeto Internacional de Pesquisa financiado pelo Ministério da Educação e Cultura – MEC – da Espanha.

1 De acordo com a clássica opinião do criador do conceito, Tomas Kuhn, podemos entender paradigma como: “as realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência”, A estrutura das revoluções científicas. Trad. por Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. São Paulo: Perspectiva, 2003, p. 13.

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CONSTITUIÇÃO, JURISDIÇÃO E PROCESSO

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bem como a construção de novos modelos, capazes de atenderem a uma demanda cada vez mais crescente e urgente de prestação de tutela jurisdicional. O acesso à justiça é inevitável e pressupõe um revisionamento nos sistemas jurídicos atuais. É neste contexto que emerge a construção de um direito processual constitucional2que passa a refletir estas e outras questões, e gera um espaço de reflexão crítica dos problemas que afligem o processo como instrumento constitucional de realização da justiça3, que, além de denunciar os problemas sociais, deverá anunciar possibilidades concretas de acesso à justiça, buscando sempre unir teoria e prática.

Modernamente, os processualistas, preocupados com o fenômeno da efetividade do processo, estão recorrendo ao caminho inverso daquele utilizado pela doutrina processual do início do século, pois enquanto estes perseguiam o afastamento do processo a respeito do direito material, aqueles perseguem uma aproximação entre processo e direito4. Esta aproximação se deve, basicamente, a dois fatores: de um lado, o

2 Neste particular, convém esclarecer algumas confusões terminológicas acerca dos institutos de Direito Processual Constitucional e Direito Constitucional Processual. Em que pese determinado setor da doutrina negar relevância prática a esta distinção – entre os quais, Paulo Medina, Direito Processual Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 5; – ou simplesmente negar a existência do Direito Constitucional Processual – entre eles, Rodríguez Domínguez, Derecho Procesal Constitucional: precisiones conceptuales. In: Derecho Procesal Constitucional. 4. ed., México: Porrúa, 2003, t. I, p. 490; Marcelo Cattoni, Uma justificação democrática da jurisdição constitucional brasileira e a incontitucionalidade da Lei nº 9.686/99. In: Rev. Fac. Dir. Univ. Fed. Paraná, 2001, n. 36, p. 177 a 207 e Willis Guerra Filho, Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. 4. ed., São Paulo: RCS, 2005, Cap. I, p. 7 e 8 – o certo é que o tema apresenta grande importância prática, na medida em que possibilita a criação de um novo ramo do Direito Processual, o Direito Processual Constitucional. Este novo ramo do Direito Processual, mais do que permitir o enlace entre Processo e Constituição, revela uma mudança paradigmática na forma de conceber o próprio Direito Processual que passa a ser visto não mais como um simples instrumento de realização do ordenamento jurídico (concepção objetiva) ou dos interesses em conflito (concepção subjetiva), mas como um Direito Fundamental. Esta nova postura permite aos operadores do direito (re)interpretar os institutos processuais à luz da Constituição.

3 Há mais de 50 anos, Couture já destacava esta faceta do processo como instrumento de realização da justiça e infelizmente apontava o seu afastamento deste desiderato, Fundamentos del derecho procesal civil. 3. ed., Buenos Aires: Depalma, 1988, n. 93, p. 149.

4 Esta aproximação entre direito e processo traz como conseqüência, inclusive, uma nova interpretação do direito de ação que hoje se encontra plasmado nas mais diversas constituições, entre elas, a Constituição espanhola, no art. 24.1; a Constituição italiana, no art. 24.1; e a Constituição brasileira, no inc. XXXV, do art. 5º. De acordo com a acertada opinião de Rapisarda, modernamente: “Non basta, in proposito, richiamare l’attenzione sul fatto che la garanzia dell’azione atipica si trova oggi esplicitamente affermata nell’art. 24, I comma, Cost. È necessario aggiungere che l’idea dell’azione come entità astratta dal diritto sostanziale funziona come garanzia di tipicità della tutela ‘solo’ in relazione ad una logica dei rapporti tra diritto sostanziale e processo che costruisce le tecniche di tutela come mere proiezioni processuali della strutura del diritto tutelando”, Profili della tutela civile inibitória. Padova: Cedam, 1987, cap. VI, n. 2, p. 218.

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A GARANTIA CONSTITUCIONAL DO POSTULADO DA EFETIVIDADE DESDE O PRISMA DAS SENTENÇAS... 137 florescimento de novos direitos, nascidos, como é sabido, a partir da revolução tecnológica, onde a economia se expande progressivamente através de “prestações de fato”, e traz consigo, em conseqüência, o crescimento das atividades econômicas de “prestações de serviços”, que incrementam, sobremaneira, o número de prestações pessoais ou não fungíveis5; e de outro lado, a origem do Estado Democrático de Direito6, ou Welfare State7, que cria uma nova ordem de pensamento e concebe o acesso à justiça a partir da perspectiva dos justiciáveis8, ou seja, esta nova ordem de pensamento está comprometida com um processo de resultados, onde os consumidores do direito buscam instrumentos adequados à tutela de todos os direitos, com o objetivo de assegurar-se praticamente a utilidade das decisões judiciais, seja no âmbito repressivo ou preventivo.

Esta é a razão pela qual o estudo da garantia constitucional do postulado da efetividade será realizado a partir da sentença mandamental que, atualmente, é um dos meios mais eficazes na realização concreta do direito.

5 Neste particular, consultar os valiosos estudos de Calvão da Silva, Cumprimento e sanção pecuniária compulsória. Coimbra: Coimbra, 1987, n. 3, p. 24 e Rapisarda, op. cit., n. 14, p. 75 e ss.

6 Para um estudo mais detalhado do Estado Democrático de Direito, consultar REIS NOVAES, Jorge. Contributo para uma teoria do Estado de Direito. Coimbra: Coimbra, 1987, especialmente os cap. II e VI; BIDART CAMPOS, German José. Doctrina del Estado Democrático. Buenos Aires: EJEA, 1961, especialmente os cap. I e IV; CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional.
5. ed., Coimbra: Almedina, 1992, parte IV, especialmente os cap.I a III; Estado de Direito. Lisboa: Gradiva, 1999; REALE, Miguel. O Estado Democrático de Direito e o conflito das ideologias. São Paulo: Saraiva, 1998, especialmente os cap. I, II e IV; STRECK, Lenio L. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito. 2. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, especialmente os cap. I a IV, entre tantos outros autores.

7 Muitos autores não diferenciam Estado Democrático de Direito de Estado Social Democrático de Direito, mais conhecido como Welfare State. Para consultar as diversas opiniões a respeito, ver meu “Contribuição ao estudo das sanções desde a perspectiva do Estado Democrático de Direito”. In: Constituição, Sistemas Sociais e Hermenêutica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 199, nota 47.

8 Sobre o tema, consultar obrigatoriamente Cappelletti, Acesso alla giustizia come programma di riforma e come metodo di pensiero. In: Rivista di Diritto Processuale Civile, 1982, p. 243 e ss. Ver também, do mesmo autor, ‘Il processo civile come fenomeno sociale di massa’. In: Studi in Memória di Roberto Bracco. Padova: Cedam, 1976, p. 73 e ss; e Problemas de reforma do processo civil nas sociedades contemporâneas. In: Revista de Processo, n. 65, p. 130 e ss. Desde esta perspectiva, pois, é oportuno assinalar a proposta defendida por Marinoni, segundo a qual: “As tutelas, assim, devem ser classificadas de acordo com os resultados que proporcionam aos consumidores dos serviços jurisdicionais”, A antecipação da tutela. 5. ed., São Paulo: Malheiros, 1999, n. 3.3.11, p. 111.

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Este estudo nos conduzirá, necessariamente, a um redimensionamento da função jurisdicional, na medida em que essa...

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