Comentários sobre a Lei, Artigo por Artigo (Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996)

AutorLuiz Antunes Caetano
Páginas147-182

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LEI Nº 9.307, DE 23 DE SETEMBRO DE 1996

Capítulo I Disposições Gerais

"Art. 1º As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis."

Toda pessoa, ou uma empresa, firma comercial, sociedade, associação ou entidade civil que tenha capacidade jurídica para contratar, convencionar qualquer negociação com outra, tendo por objeto bens ou serviços, direitos civis ou comerciais de ordem patrimonial, que deles dispõem, isto é, podem vender, comprar, dar, ceder, locar, fornecer, emprestar, etc., podem valer-se da arbitragem.

Arbitragem é um dos meios alternativos de solução de conflitos, controvérsias, disputas, diferenças ou contendas entre as pessoas em razão do contrato ou do negócio que realizaram, excluindo o Poder Judiciário. Enfim, pode ocorrer desentendimento entre elas. E esse desentendimento há de ser resolvido. E poderá sê-lo pela arbitragem, que é uma justiça privada. É feita por e entre particulares.

Nela, querendo, podem escolher um só árbitro para dirimir o conflito, ou cada um escolhe o seu; a decisão é rápida, no máximo em 180 dias.

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Também é sigilosa. Dela não há qualquer publicidade. Não há formalidades. É simples. De relativa ou nenhuma dificuldade, dependendo da questão a ser resolvida.

Por tudo isso, na arbitragem não há adversidade de uma ação judicial perante o Poder Judiciário. Certo que há normas e regras para escolha do(s) árbitro(s) e, para o andamento da arbitragem até seu final, que se dá com a "sentença arbitral".

Embora não haja exigência legal, salvo se as partes conheçam muito o procedimento arbitral e a singeleza do conflito enseje, então, a arbitragem ad hoc, é necessário que as partes procurem um dos órgãos arbitrais institucionais ou entidades especializadas para, sob seu regulamento, instituir a arbitragem entre elas. As partes podem e devem conhecer e discutir previamente esses regulamentos (cada entidade tem o seu). Podem discuti-los, contrariá-los, modificá-los ou instituir suas próprias regras.

"Art. 2º A arbitragem poderá ser de direito ou de eqüidade, a critério das partes."

As partes podem determinar que o procedimento e a sentença arbitral sejam fundamentados pelas normas e legislação de Direito nacional, estrangeiro, ou até regras corporativas. Ou, ainda, por eqüidade, se quiserem, quando a sentença arbitral, por escolha das partes, deverá fundamentar-se na boa razão e na ética, tornando mais benigno e humano o rigor da lei, amoldando a circunstância da questão, atendendo a um sem prejudicar o outro. Bem simples. Pelo bom senso.

"§ 1º Poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública."

Mais abertura na escolha pelas partes de regras no procedimento arbitral. Podem estabelecer suas próprias regras. A escolha das regras é livre. Por certo, desde que não haja ofensa aos bons costumes e à ordem pública (ver "Introdução à terminologia jurídica").

"§ 2º Poderão, também, as partes convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio."

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As partes podem convencionar que a sentença arbitral, conforme e de acordo com a natureza do conflito, seja ditada segundo os princípios gerais de direito, usos e costumes de prática das partes e, ainda, se for o caso, sob regras, tratados, convenções, ou mesmo regulamentos de órgãos ou instituições de arbitragem de comércio internacional.

Capítulo II Da Convenção de Arbitragem e seus Efeitos

"Art. 3º As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral."

A lei diz que as partes podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante dois atos: (a) cláusula compromissória e (b) compromisso arbitral, que são convenções de arbitragem.

Não há imposição, assim, da instituição da arbitragem por um ato formal. Houvesse imposição, a expressão estaria substituída por devem, ou, mais impositivamente, têm de. De tal sorte, se a simplicidade do conflito ou controvérsia admitir, a instituição da arbitragem pelas partes pode ser verbal, ou até constituir-se ad hoc. Ad hoc, expressão latina, quer dizer "para isso". Então, as partes e/ou árbitro(s) instituem "para isso" solução do conflito delas nas normas e regras de arbitragem. Fica esclarecido, todavia, desde já, que a sentença arbitral será sempre expressa em documento escrito.

É da natureza da arbitragem a voluntariedade (querer)eaconsensualidade (contratar) das partes para submissão de seus conflitos ao procedimento. Está fundamentada no princípio da autonomia da vontade das partes. Logo, deve-se escrever e assinar o que está combinado e acertado. Assim, como atos formais da instituição da arbitragem, são o "compromisso arbitral" e a "cláusula compromissória", a nossa lei, para não dar lugar a discussões jurídico-acadêmicas, entende por "convenção arbitral" qualquer uma das formas.

A cláusula compromissória, aquela que substitui a de eleição do foro arbitral no contrato, bem como o compromisso arbitral, aquele

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fora e aquém do contrato, obrigam as partes. Se uma das partes, em decorrência de conflito oriundo do contrato, ou sob o compromisso, como autora da ação judicial, recorrer ao Poder Judiciário, a este faltará competência. A outra parte, então ré nessa ação, na contestação, preliminarmente, pode e deve alegar perante a autoridade judicial que recebeu a ação proposta, e que dela ele não poderá conhecer e deverá declarar sua "incompetência" (ver "Introdução à terminologia jurídica": competência).

"Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato."

A cláusula compromissória previne e dispõe que, se eventual dúvida ou questão surgir de um contrato escrito, verbal, por carta, e-mail, etc., ela seja dirimida por arbitragem (ver Anexo X).

Repita-se que a doutrina e a jurisprudência, ditada esta pelos Tribunais do Poder Judiciário, já pacificaram que, uma vez eleito o Juízo Arbitral, seja pela cláusula compromissória ou pelo compromisso arbitral, os juízes de Direito têm de declinar da sua "competência" (ver "Introdução à terminologia jurídica").

"§ 1º A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira."

A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, mas não só por uma cláusula contratual, podendo ser em documento outro, que se refira ao contrato e, assim, incorporando-a.

"§ 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula."

"Art. 5º Reportando-se as partes, na cláusula compromissória, às regras de algum órgão arbitral institucional ou entidade especializada, a arbitragem será instituída e processada de acordo com tais regras, podendo, igualmente, as partes estabelecer na própria cláusula, ou em outro documento, a forma convencionada para a instituição da arbitragem."

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A cláusula compromissória constante de um contrato escrito, ou por documento em separado, nomeando o órgão arbitral institucional ou entidade especializada (ver "Introdução à terminologia jurídica") para sob seu regulamento dirimir o conflito, e com todos os requisitos vamos denominar de "cheia". A que não contiver a nomeação, ou tiver falta de algum requisito, vamos chamar de "branca" ou "vazia".

Na hipótese de uma cláusula "branca", em que não há indicação de órgão arbitral institucional ou entidade especializada, ou de algum outro requisito, é facultado às partes estabelecerem na própria cláusula, aditando-a, ou em documento apartado, as regras de instituição de sua arbitragem, fazendo-a uma cláusula compromissória "cheia".

É importante a redação perfeita de uma cláusula compromissória, sendo, assim, "cheia", evitando-se discussão perante o Juiz de Direito e, por conseqüência, adiando o início do procedimento arbitral, como faz certo o próximo artigo da Lei.

"Art. 6º Não havendo acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem, a parte interessada manifestará à outra parte sua intenção de dar início à arbitragem, por via postal ou por outro meio de comunicação, mediante comprovação de recebimento, convocando-a para, em dia, hora e local certos, firmar o compromisso arbitral."

No caso de uma cláusula compromissória "branca", se as partes não se acertarem quanto ao modo e meio de a arbitragem dar início para dirimir o conflito existente, a parte interessada deve manifestar a intenção de instituí-la e convocar a outra parte para em dia, hora e local indicado assinar o "compromisso arbitral".

Por certo, sendo a cláusula "branca" e referindo-se a compromisso arbitral, entende-se que a parte deve cumprir os requisitos do art. 10 da Lei já na convocação, isto é, apresentar sua proposta de compromisso arbitral "cheio", com todos os requisitos.

"Parágrafo único. Não comparecendo a parte convocada ou, comparecendo, recusar-se a firmar o compromisso arbitral, poderá a outra parte propor a demanda de que trata o art. 7º desta Lei, perante o órgão do Poder Judiciário a que, originariamente, tocaria o julgamento da causa."

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Se a parte...

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