Chávez, ascensão e formação de sua política

AutorFlávio Túlio Ribeiro Silva
Páginas58-69

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A eleição de Hugo Rafael Chávez Frías registra a superação de uma era na Venezuela. A despeito de seu discurso ser amplamente nacio-

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nalista, o candidato empreendeu uma campanha que procurou se distanciar dos partidos tradicionais, defendendo uma transformação no modelo político venezuelano. Este ideal critica o modelo de democracia praticada por governos anteriores. Segundo o cônsul venezuelano Edgar Gonzales, substituiu-se a democracia representativa do Punto Fijo por uma democracia participativa e protagonista na Quinta República (GONZALEZ, entrevista, 2013). Descrevia sua vitória como um movimento, como uma forma de dar abrangência maior do que uma posição partidária. Mas a tradução de ideias que empreenderiam mudanças que o tradicionalismo político recente não poderia realizar.

A alteração discutida não poderia ocorrer senão no paradigma do Estado, sua estruturação e predileção em relação a outros sujeitos da sociedade. Neste novo momento, o Estado estaria disposto a propor, gerir e possuir. A ação do Estado seria de representar o indivíduo tanto na posse do patrimônio como na representatividade das decisões. Neste sentido, seu governo avançaria no conceito de democracia participativa, no sentido de consulta direta à população. Caso procurássemos ampliar o entendimento sobre o movimento chavista, deveríamos trabalhar com conceitos de igualdade conjugada com liberdade, valorizar o corporativismo e o associativismo, tanto na atividade econômica como na social. Maturou-se a proposta de um desenvolvimento endógeno, de incentivo às incubadoras de pequenas empresas alimentadas por financiamentos como do Banco Popular (MARINGONI, 2008. p. 174).

Partindo da premissa de que o governo Chávez procurou romper a partidocracia no sentido de inviabilizar a conciliação das elites representadas por políticos tradicionais, é lógico perceber, no discurso político, a inserção no movimento do seu caráter revolucionário.

Assim disserta o historiador Augustin Blanco Muñoz29sobre este juízo:

Lo revolucionario es un concepto de vida. Y vamos a referir que significa el termino revolución: un cambio radical, total de un modelo, de una sociedad en lo político, económico, social, etc. Es concebir el

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camino necesario para Venezuela través de un cambio total radical. Una visión que también debe enfrentar todo sin eludir nada [...] no puede haber una revolución política, sin una revolución cultural, una revolución moral. Es un concepto integra para que sea de verdad revolucionario. (BLANCO MUÑOZ, Augustin. 1998. p. 115).

Coube a Chávez a absorção da profunda desconfiança para com os sujeitos que estavam associados ao modelo do antigo governo e como afirma Muñoz "para ser um revolucionário teria que enfrentar a exploração". (BLANCO MUÑOZ, 1998, p. 115). Assim, é plausível que a maioria empobrecida da população seja a principal força de apoio ao novo governo. Existe, desde o início, a admissão da luta de classes e escolha da defesa de uma faixa dos venezuelanos. Logo, se o Punto Fijo significou a política de conciliação e amenização das contradições de classes a "Quinta República", na defesa de uma classe, acirra diferenças o que reforçará as postulações e demandas dessa faixa mais baixa dos venezuelanos.

Em termos das ideologias tradicionais, inicialmente procura se distanciar de um projeto socialista já instalado anteriormente nas esquerdas latino-americanas. Segundo Chávez:

Las categorizaciones de izquierda y derecha yano son adecuadas para definir la naturaleza del cambio requerido. Considera que ha fracasado tanto la democracia liberal capitalista como el paradigma de la sociedad sin clases. (apud LANDER, 2005, p. 109).

Ainda que reconheça a relevância marxista, posiciona-se nem pró nem contra, identificando a inexistência de uma teoria formatada para as mudanças que anseia prover. Busca, portanto, transformações inseridas numa história própria, construída na base de um projeto nacional, detentora de condições específicas da Venezuela, mas fortemente contraditória ao governo multiclassista anterior e sua constituição.

Juro diante de Deus, juro diante da pátria, juro diante do meu povo e diante desta constituição moribunda cumprir as transformações democráticas necessárias para república tenha uma nova constituição adequada aos novos tempos. (Chavez apud MARINGONI, 2008. p. 113)

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O presidente eleito tinha nascido em 28 de julho de 1954, na cidade de Sabaneta, um município de pequeno porte distante 450 km da capital. Os seus pais30eram professores de escola pública. A sua família, de origem popular, encaminhou-o para academia militar com 17 anos. Aos 28 anos já servia na base da Maracay, como paraquedista, onde se tornaria tenente-coronel. Participou de uma geração de militares que não sofreu influência da Escola das Américas31no Panamá, que formou boa parte da elite militar latino-americana patrocinada pelos Estados Unidos. Chávez deve seus conhecimentos ao projeto Andrés Bello (denominado como homenagem ao educador, poeta e filósofo contemporâneo de Simon Bolívar). O programa consistia na complementação da formação militar nas universidades, formando profissionais mais bem

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preparados e mais críticos. A escola foi fundada em 1946 no período da junta coordenada por Romulo Bittencourt e diplomou até seu fechamento, em 2001, mais de 60 mil pessoas. Assim, foi nesta educação que Chávez aprofundou o conhecimento sobre Simon Bolívar e procurou incorporar seu pensamento com a ideia de liderança e integração.

Conforme disserta o historiador venezuelano Enrique Neira Fernandes, os líderes "possuem qualidades individuais, mas com capacidade de conduzir o povo através de mudanças fundamentais". A ideia de liderança é inserida no movimento chavista por sua ação centralizadora e personalista, chamando para si diversas discussões.

El líder representa, en sus ideales y conducta, un anticipo de la sociedad por Hacerse. En este sentido, es una promesa, un anticipo. Es cono una ventana abierta de cara ao futuro. Es una persona capaz de dialogar con el grupo, con mira a una esperanza. Antes de nada es un pedagogo, porque "ensena" a crear la palabra, a desarrollar los valores, a transformar la sociedad en que se vive....

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