Caução

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas2543-2552

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1. Introdução

Pelo sistema do Código de Processo Civil, a caução pode ser prestada por qualquer pessoa, inclusive por terceiro (art. 828). Segundo o nosso entendimento, contudo, no processo do trabalho somente o empregador pode ser compelido a dar caução; exigir que esta fosse prestada pelo trabalhador seria violentar as singularidades do processo especializado e impedir a ampla utilização das medidas cautelares, pois é ressabido que o trabalhador, de maneira geral, não se encontra em condições de submeter-se à caução, seja real ou fidejussória.

Estamos a referir-nos, por certo, à caução como contracautela, de que cuidam os arts. 799 e 804 do CPC, vale dizer, àquela que é imposta pelo juiz; nada impede, pois, que em determinada situação o trabalhador se disponha a prestá-la espontaneamente, uma vez que, por qualquer motivo excepcional, se encontra em situação financeira ou econômica que o permita a isso. Uma tal exceção, porém, não invalida as razões que sustêm o nosso parecer quanto à incompatibilidade com o processo do trabalho da exigência para que o trabalhador realize o caucionamento (contracautela).

À guisa de princípio, conseguintemente, podemos estabelecer que no âmbito deste processo a caução: a) pode ser dada de modo voluntário, por qualquer das partes; b) somente pode ser imposta ao empregador; c) pode o terceiro também prestá-la, nos casos previstos em lei.

Fica claro, portanto, que de acordo com o nosso ponto de vista a ação cautelar de caução, disciplinada pelos arts. 826 a 838 do CPC, é de rara incidência no processo do trabalho, sendo mesmo inadmissível quando o trabalhador estiver figurando como réu. Considerando a possibilidade de existirem opiniões contrárias à nossa e para que os leitores não se vejam privados de uma exposição a respeito dos aspectos procedimentais dessa modalidade de ação, sobre ela discursaremos ao longo deste capítulo.

Resulta necessário sublinhar, mais uma vez, que o processo do trabalho deve aceitar, unicamente, a caução aludida no art. 805 do CPC a ser prestada pelo empregador (réu) e destinada a substituir a medida cautelar concedida em prol do empregado (autor), desde que seja adequada e bastante para evitar a lesão a direito daquele ou repará-la por inteiro.

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Ninguém haverá de opor dúvida quanto à compatibilidade dessa caução substitutiva com o processo trabalhista. Ainda assim, devemos esclarecer que dita caução: a) não pode ser imposta ao réu, pois a substituição da cautela pela caução representa uma sua faculdade, como expressa o art. 805 do CPC (“poderá”, diz a norma citada); b) o juiz não pode concedê-la de ofício, sendo imprescindível, por isso a provocação — requerimento — pelo interessado (réu). Foi esta uma das conclusões (LXVIII) extraídas no Simpósio de Curitiba, em 1975.

2. Conceito

Originário da forma latina cautio, o vocábulo caução sugere, na ordem legal, a ideia de cautela, de prevenção contra um dano provável. Ela representa a garantia ou a segurança que uma pessoa dá a outra para o cumprimento de alguma obrigação, assumida por força de cláusula contratual relativa a negócio jurídico, público ou privado.

O seu objetivo é, assim, assegurar a solvabilidade do devedor.

Transposta ao campo processual, a caução indica a providência acautelatória que se impõe a uma das partes, ou se permite prestá-la voluntariamente, com a finalidade não de assegurar o adimplemento de certa obrigação e sim de evitar danos ou lesões graves a direito da outra. Corolário de que na caução de índole processual não entra em jogo nenhum vínculo obrigacional oriundo de relação jurídico-material é que — no sistema do processo civil — o próprio autor na ação cautelar pode ser compelido a prestá-la, mesmo que, na ação de mérito (principal), esteja a exigir do réu a reparação de algum dano por este provocado (indenização, etc.).

Daí a observação que fizemos de que no plano processual a caução visa, essencialmente, a ressarcir os danos que a concessão da medida acautelatória possa vir a causar ao réu ou requerido (CPC, arts. 799 e 804); nesse caso, ela possui inequívoca função de contracautela — o que já não ocorre com a referida no art. 805 do mesmo Código, que, como dissemos, é prestada pelo réu com o objetivo de substituir a providência acautelatória outorgada em benefício do autor. Para isso, dispensa-se a ação de cautela (que seria ajuizada pelo autor), sendo suficiente um simples requerimento do réu ao juiz.

Acentua Carnelutti que embora o traço de prevenção seja inerente às cautelas em geral, nem todas elas são conteúdo da ação de cautela, pois esta, na dogmática processual, identifica-se com o objeto próprio do processo cautelar que é servir instrumentalmente a outro processo e não tutelar, de maneira imediata, o direito subjetivo (ob. cit., p. 356).

3. Classificação

Poderíamos classificar a caução sob diversos aspectos; para atendermos aos propósitos deste livro, entretanto, é bastante que o façamos à luz de dois critérios: a) da natureza; e
b) da origem da obrigação de prestá-la.

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3.1. Quanto à natureza

Segundo a natureza jurídica, a caução pode ser real ou fidejussória.

A caução real se opõe, de certo modo, à pessoal e consiste na garantia que se dá sobre bens móveis (penhor), em dinheiro (depósito) ou mediante imóveis (hipoteca): a caução fidejussória é a fiança pessoal prestada por terceiro, perante o credor, com o intuito de garantia da satisfação da dívida ou da obrigação afeta ao devedor, caso ele não a pague ou não a cumpra. O vocábulo fidejussória (de fide e jubere) bem revela que essa espécie de caução é sempre prestada por terceira pessoa.

3.2. Quanto à origem

Adotando como critério a origem da obrigação de prestá-la, a caução pode ser legal, negocial e processual.

A caução legal é assim denominada porque a sua prestação decorre exclusivamente de norma de direto material ou processual. Como exemplos dessa modalidade, temos: 1. a que é exigida para a execução provisória da sentença (CPC, art. 475-O, I a III); 2. a do arrematante, no pagamento a prazo (CPC, art. 690, § 1.°); 3. a do embargante, nos embargos de terceiro, para obter a medida in limine (CPC, art. 1.051). Dessa (que não são as únicas previstas no direito comum) apenas a última é cabível no processo do trabalho, onde: a) a execução provisória da sentença se dá sem que se possa exigir do exequente a prestação de caução; b) o prazo para que o arrematante complemente o valor do lanço oferecido é de 24 horas, não exigindo a lei que, para isso, preste caução (CLT, art. 888, § 4.º).

Nessas duas últimas hipóteses, eventual imposição a que o exequente ou o arrematante dêem caução provocaria sensível abalo nos alicerces ideológicos do processo do trabalho, motivo por que constitui ditame de bom-senso dispensá-la nos casos concretos. Já a caução a cargo daquele que apresenta embargos, na qualidade de terceiro, e deseja obter, de plano, um mandado de manutenção ou restituição é plenamente conciliável com esse processo, andando em bom caminho os juízes que a exigirem. Uma tal caução respeita o interesse e o direito do credor-exequente, reconhecidos por sentença passada em julgado e revestida da autoridade que lhe é imanente.

Negocial é a caução que uma pessoa dá a outra, em garantia do integral cumprimento de determinada obrigação, oriunda de contrato ou negócio jurídico, como o penhor, a hipoteca, a fiança. Mostra-se de remotíssima — embora não impossível — ocorrência nas relações materiais trabalhistas essa caução.

Diz-se processual da caução que é dada com a finalidade de garantia do processo; essa é a característica das medidas cautelares em geral. Exemplos de caução cautelar estão...

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