Capitalismo em regiões atrasadas: Agência Central de Inteligência, Departamento de Estado e Empresa Multinacional derrubam o governo de Arbens na Guatemala (1950-1954)

AutorWaldir José Rampinelli
CargoProfessor do Departamento de História da Universidade Federal de Santa Catarina
Páginas83-99
CAPITALISMO EM REGIÕES ATRASADAS: AGÊNCIA
CENTRAL DE INTELIGÊNCIA, DEPARTAMENTO DE
ESTADO E EMPRESA MULTINACIONAL DERRUBAM O
GOVERNO DE ARBENS NA GUATEMALA (1950-1954)
Waldir José Rampinelli 1
Resumo
O artigo analisa a Revolução de Outubro (1944-1954) na Guatemala que
pôs f‌im ao Estado Liberal Oligárquico, assim como a estratégia reformista
de implantação do capitalismo no país. No entanto, o governo do coronel
Jacobo Arbenz Gúzman, eleito democraticamente, encontra o poder e a
força da United Fruit Company – apoiada pela Agência Central de Inte-
ligência e pelo Departamento de Estado de Washington –, que se opõe a
qualquer tipo de reforma. O resultado do conf‌lito é a queda de um governo
democrático-burguês, a manutenção da economia do país dentro do padrão
primário-exportador e o início de um movimento guerrilheiro que vai durar
cerca de cinco décadas, com aproximadamente 220 mortos.
Palavras-chave: Guatemala, Empresa Multinacional, Estados Unidos.
Classif‌icação JEL: N46, 054
1. INTRODUÇÃO
A Capitania Geral da Guatemala, que se tornou independente da
Coroa espanhola em 1821, esteve ligada até 1839, ainda que de modo
incerto, às Províncias Unidas da América Central2. A partir de então, a
1 Professor do Departamento de História da Universidade Federal de Santa Catarina. rampinelli@globo.com.
2 Sob o ponto de vista histórico, pertencem a América Central os seguintes países: Guatemala, Honduras, El Salvador,
Nicarágua e Costa Rica. Belize e Panamá não fazem parte da história centro-americana.
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Waldir José Rampinelli
Textos de Economia, Florianópolis, v.10, n.1, p.83-99, jan./jun.2007
Guatemala foi governada por uma série de ditadores, até eclodir a Revo-
lução de Outubro, em 1944.
Os trinta anos de conservadorismo na Guatemala, cujo principal expo-
ente foi o governo de Rafael Carrera (1841-1871), foram substituídos pela
reforma liberal, que teve em Justo Ruf‌ino Barrios (1873-1885) seu principal
idealizador. Adotou este governante uma política de reformas para dissolver
as instituições herdadas da época colonial, bem como a sua organização so-
cial. Pôs f‌im ao latifúndio eclesiástico, distribuiu terras, multiplicou o número
de camponeses, fomentou e introduziu cultivos, acabando assim com diversos
sistemas seculares de posse de terra (Guerra-Borges, 1987: 115-154).
O século XX encontrou a Guatemala governada pelo ditador Manuel
Estrada Cabrera (1898-1920), sendo a imagem perfeita daqueles tristes anos
descritos com perfeição pelo Nobel de Literatura Miguel Angel Astúrias em
El señor presidente. Cabrera abriu as portas para a United Fruit Company,
fazendo-lhe então grandes concessões.
Finalmente, o general Jorge Ubico (1931-1944) realizou melhoras
materiais e deu ao país um estado de solvência econômica. Educado, po-
rém, na velha escola liberal, entendia que governar era impor a vontade do
presidente sem levar em conta a opinião pública e a constituição do país.
Sua ditadura foi derrubada pelos movimentos populares de junho de 1944,
dando início à Revolução de Outubro.
2. A REVOLUÇÃO DE OUTUBRO
A Revolução de Outubro, comandada inicialmente por uma junta de
governo, e logo por Arévalo e Arbenz, foi “uma revolução democrático-
burguesa, nacionalista e antiimperialista, que lutava para tirar seu povo
de um atraso secular, qual seja, a miséria e a ignorância a que havia sido
submetido desde a Conquista espanhola; foi um movimento que buscava
substituir a estrutura semi-feudal e semi-colonial de seu anacrônico sistema
econômico por outra moderna, ainda que de tipo capitalista, porém, mais
avançada” (Toriello Garrido, 1976:20).
O início deste período de democratização (1944-1954) signif‌icava mu-
danças transcendentais para a Guatemala, tendo-se em vista que a mesma
fora totalmente atrelada aos interesses estadunidenses, assim como a grupos

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