Caio Meira e a fissura da poesia contemporânea

AutorManuela de Medeiros
CargoMestranda em Literatura na Universidade Federal de Santa Catarina
Páginas82-99
http://dx.doi.org/10.5007/1984-784X.2013v13n19p82
| b. pesq. nelic, florianópolis, v. 13, n. 19, p. 82-99, 2013 |
CAIO MEIRA E A FISSURA DA POESIA CONTEMPORÂNEA
Manuela de Medeiros
Universidade Federal de Santa Catarina / CNPq
RESUMO
A partir de textos de Gilles Deleuze sobre a
fissura e sobre o acontecimento, presentes
no livro
Lógica do sentido
, e de uma leitura
da fissura de Deleuze por Raúl Antelo, pas-
sando pelos conceitos de “contemporâneo”
e de
enjambement
de Giorgio Agamben,
este ensaio busca analisar a obra do poeta
brasileiro contemporâneo Caio Meira, reu-
nida na íntegra no livro
Romance
. Neste
trabalho, a poética de Caio Meira é definida
e discutida como uma poética da
fissura, que, nesse espaço de deslocamento,
de corte, está sempre em movimento, sem-
pre
entre
: entre a prosa e a poesia, entre o
eu e o outro, entre o corpo e a cidade. É
pelo espaço da fissura, portanto, que a
poesia de Caio Meira vaza, e é também
nesse espaço que ela é aqui analisada.
PALAVRAS-CHAVE: Poesia contemporânea.
Caio Meira. Fissura.
ABSTRACT
From Gilles Deleuze's texts on the rupture
and happening, in his book
The Logic of
Sense
, and a reading of Deleuze's rupture
by Raúl Antelo, through Giorgio Agamben's
concepts of “contemporary” and
enjambe-
ment,
this essay seeks to analyze the work
of Brazilian contemporary poet Caio Meira,
collected in full in his book
Romance
. In
this work, the poetry of Caio Meira is de-
fined and discussed as the poetry of
the rupture, which, in this shift, is always in
motion, always in
between
: between prose
and poetry, between self and other, be-
tween the body and the city. It is through
this rupture's crack, therefore, that Caio
Meira's poetry leaks, and it is also in the
space that it is here analyzed.
KEYWORDS: Contemporary poetry. Caio
Meira. Rupture.
Recebido: 11/07/2013
Aprovado: 30/08/2013
Manuela de Medeiros <manuelademedeiros@gmail.com> é mestranda em Literatura na
Universidade Federal de Santa Catarina.
manuela de medeiros
caio meira e a fissura da poesia contemporânea
83
| b. pesq. nelic, florianópolis, v. 13, n. 19, p. 82-99, 2013 |
CAIO MEIRA E A FISSURA DA POESIA CONTEMPORÂNEA
Manuela de Medeiros
todo oco que funciona, abriga e expele, luta e respira
Caio Meira
Um texto se oferece à leitura em sua fissura peculiar
[...] não só desde que se abra à devoração mas tam-
bém desde que se abandone ao acaso, além de toda
possibilidade.
Raúl Antelo
Gilles Deleuze, na vigésima segunda série do livro
Lógica do sentido,
com o
subtítulo de “Porcelana e vulcão”, nos diz que “poucas frases ressoam tanto
em nossa cabeça com esse ruído de martelo” 1 e que “poucos textos têm este
caráter irremediável de obra-prima e de impor silêncio” quanto a primeira
frase da novela
The crack up
, de F. Scott Fitzgerald. A frase à qual Deleuze se
refere, que também inicia seu ensaio, é traduzida como “Toda vida é, obvia-
mente, um processo de destruição.”2 Para o filósofo, toda a obra de Fitzgerald
seria o desdobramento dessa proposição e toda obra de arte, então, para ter o
referido caráter de obra-prima, deveria provocar essa reverberação, com o
ruído de martelo ressoando em nossa cabeça a ponto de provocar uma fra-
tura, uma ruptura e, dessa maneira, de impor silêncio. A fissura faz-se neces-
1 DELEUZE, Gilles. Vigésima segunda série: porcelana e vulcão. In:
Lógica do sentido
. Trad.
Luiz Roberto S. Fortes. São Paulo: Perspectiva, 1974, p. 157.
2 Ibidem, p. 157. No original, em inglês: “Of course all life is a process of breaking down.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT