Breves Considerações Sobre a Pena

AutorHeráclito Antônio Mossin/Júlio César O.G. Mossin
Ocupação do AutorAdvogado criminalista/Advogado criminalista
Páginas9-27

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De forma geral, a pena é uma sanção que o Estado impõe àquele que transgrediu o ordenamento jurídico de regência, fazendo com que haja o perdimento de um bem jurídico do autor ou partícipe do crime, que pode ser de caráter patrimonial (multa), envolvendo sua liberdade física (pena privativa de liberdade), independentemente de qualquer cogitação em torno da substituição da pena corporal pela restritiva de direitos.

No campo teórico da sanção penal, as razões de punir do Estado ius puniendi in concreto, gravitam em torno de duas pilastras: retribuição e prevenção.

Nos lindes de “Teoria Absoluta”, a pena é exigência de justiça. Quem pratica um mal deve sofrer um mal, (retribuição do mal pelo mal). Logo, o acusado é apenado porque delinquiu: “pune-se porque é uma falta”.

Em se cuidando da “Teoria Relativa”, a pena tem um fim de prevenção, que pode ser “geral” (intimidação que a pena pode causar aos possíveis infratores) e ‘especial’ (procura atemorizar o autor do crime, para que não volte a delinquir).

Há também a “Teoria Unitária”, que procura conciliar as precedentemente apontadas. Para ela, a pena tem índole retributiva, porém, tem por alvo a reeducação do criminoso e a intimidação geral.

Não se deve perder de vista que diante da realidade social presente e o aumento crescente da criminalidade, que sanção penal

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deve ter caráter retributiva, porém, não se pode negligenciar que seu fim primário é a ressocialização do condenado, ou seja, sua reintegração à sociedade, o que deve ser feito por intermédio de programas sadios em nível de execução da pena. Enfim, deve ser procurar evitar que o condenado venha praticar novos delitos.

No campo em análise, não se pode perder de vista que o próprio legislador, na mais importante norma compreendida na Parte Geral do Código Penal de 1940, no art. 59, deixou claramente expresso que a pena tem por escopo a “reprovação e prevenção do crime”.

Na ótica de Aníbal Bruno, em torno da pena, “é da sua essência o caráter aflitivo e retributivo. É aflitiva no sentido de que consiste na privação ou restrição de bens jurídicos fundamentais do criminoso. Em si mesma, é um mal que se opõe ao mal do delito e em que se exprime a reprovação da ordem do Direito. É retributiva porque posta em correlação, na sua qualidade e quantidade, com a grandeza do crime e o grau da culpabilidade do agente.”1No magistério de E. Magalhães Noronha,

a pena é retribuição, é privação de bens jurídicos, imposta ao criminoso em face do ato praticado. É expiação. Antes de escrito nos Códigos, está profundamente radicado na consciência de cada um que aquele que praticou um mal deve também um mal sofrer.2

1. 1 Quantidade da pena aplicável

O tema jurídico que está sendo abordado encontra apoio no art. 59 do Código Penal, cuja função é estabelecer as pilastras (circunstâncias judiciais), que norteiam o aplicador do direito no sentido de fixar a denominada pena-base ou de piso.

O elevado regramento legal, tendo em vista sua construção norma-tiva, atende plenamente o princípio constitucional da individualização

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da pena (art. 5º, inciso XLVI), eis que as circunstâncias judiciais nele contidas permitem ao julgador ajustar a reprimenda legal a cada tipo de delinquente.

A pena em seu primeiro momento tem o caráter de advertência, que se constitui na cominação, ou seja, na ameaça de sua aplicação caso haja transgressão ao tipo penal (ius puniendi in abstrato).

No seu segundo momento, o que se verifica quando há transgressão da norma sancionatória, nascendo para o Estado o direito de aplicar a pena na situação concreta.

Diante disso, na forma estabelecida pelo art. 59 do Código Penal, tendo por finalidade o critério da retribuição e o da recuperação social do delinquente, conforme restou precedentemente anotado, o magistrado elege a espécie da sanção penal que será aplicada e determina a sua quantidade.

No âmbito do que interessa na presente dissertação, é imperioso deixar assentado que na sistemática comum, o legislador, no tipo penal sancionatório, estabeleceu a sanctio legis, que torna coercitivo o conteúdo do preceito primário, em dois patamares: mínimo e máximo abstratamente cominado. Não se trata absolutamente de se ver nesse posicionamento legislativo a ideia primária e cardeal de imposição de castigo, mas forma de procurar conduzir o magistrado de maneira determinada e equilibrada a aplicar a sanção penal em conformidade com a gravidade do bem jurídico lesado. Assim, procura-se evitar o excesso, como um máximo, bem como a benevolência, como um mínimo, já que ambos não interessam à saudável administração da justiça e a sociedade.

Para efeito da imposição da sanção legal em grau mínimo e máximo, o legislador no sobredito regramento integrante, deixou sublinhado que o magistrado, atendendo as circunstâncias judiciais, deve estabelecer “a quantidade da pena aplicada, dentro dos limites previstos” (art. 59, inciso II, CP), tendo em linha de consideração a previsão menor e maior contida no tipo penal violado.

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No ensino de Aníbal Bruno,

o juiz, na aplicação da medida penal, terá diante de si duas sortes de investigações: a que diz respeito ao fato punível em si, na sua objetividade, e a que se dirige ao homem que o praticou, na sua íntima natureza e na sua relação com o mesmo fato.3Verificada de forma sumária e objetiva, qual foi o critério adotado pela legislação pátria para a individualização da pena, no que concerne à sua imposição dentro dos limites legalmente previstos no tipo penal violado, resta agora analisar se existe a viabilidade de aplicá-la aquém do mínimo previsto, para tanto se examinando situações legais que permitem a diminuição ou redução da pena.

De outro lado, não se fará incursão sobre as chamadas circunstâncias agravantes (art. 61, CP); bem como às denominadas causas de aumento da reprimenda legal (concurso material, art. 69, CP); concurso formal (art. 70, CP) crime continuado (art. 71), além de outras hipóteses previstas na Parte Especial do Código Penal, a exemplo do homicídio culposo resultante de inobservância de regra técnica de profissão (art. 121, § 4º, CP); roubo com emprego de arma, concurso de duas ou mais pessoas (art. 157, § 2º, CP), porquanto esse assunto jurídico não ostenta nenhum liame de interesse com o tema objeto de dissertação.

Em circunstâncias desse matiz, é oportuno deixar salientado e patenteado, que a abordagem do assunto relativamente à aplicação da sanctio iuris nos limites em que será abordado, guarda íntima relação com o Instituto da Delação Premiada, que é o tema jurídico central deste trabalho jurídico.

1. 2 Circunstâncias atenuantes

As causas determinantes da atenuação da pena se encontram alinhas nos arts. 65 (genéricas nominadas) e 66 (inominadas) do Código Penal.

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É primordial para o estudo que está sendo desenvolvido, assinalar que o legislador no art. 65, diz expressamente: “são circunstâncias que sempre atenuam a pena.” Isso conduziu Celso Delmanto a ensinar e, com razão, que: “como indica o caput do artigo, as atenuantes são de aplicação obrigatória (sempre atenuam) em favor do agente.”4Logo, pelos dizeres normativos em espécie, a diminuição da pena constatada a atenuante é cogente”.

Tendo por ponto de partida o que restou exposto, o que se procura estabelecer, quer em nível doutrinário, quer jurisprudencial, é que sendo imposta a sanção penal em seu mínimo abstratamente cominado, pode o magistrado reduzi-la, levando-se em conta a expressão contida no mencionado art 65: “sempre atenuam a pena.”

Em termos pretorianos há conflito de julgados. Há corrente se posicionando no sentido de que é inadmissível a fixação da pena abaixo do mínimo legal (maioria); enquanto que outra o permite.

Com efeito, a teor da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, “a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal.”

Em sentido oposto,

basta a confissão do fato para ensejar a atenuação da pena, a qual possibilita o apenamento aquém do mínimo legal, apesar da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça. É que o art. 65 do CP reza que as atenuantes “sempre atenuam a pena”.5

No campo doutrinário, sustentam Alberto Silva Franco e outros, que

o juiz na sua atuação, não está dotado de um poder ilimitado. Nenhum acréscimo ou diminuição de pena pode superar o máximo ou ficar aquém do mínimo legal, sendo certo que, apesar de não expresso, está subentendido que as quantidades de penas relativas às agravantes e às atenuantes não podem extravasar os limites punitivos do tipo.6

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Defendendo a posição acima, sustenta Guilherme de Souza Nucci, que

as atenuantes não fazem parte do tipo penal, de modo que não têm o condão de promover a redução da pena abaixo do mínimo legal. Quando o legislador fixou, em abstrato, o mínimo e o máximo para o crime, obrigou o juiz a movimentar-se dentro desses parâmetros, sem possibilidade de ultrapassá-los, salvo quando a própria lei estabelecer causas de aumento ou de diminuição. Estas, por sua vez, fazem parte da estrutura típica do delito, de modo que o juiz nada mais faz do que seguir orientação do próprio legislador.7

Na linha doutrinária de Rogério Greco,

conforme dissemos, entendemos, contrariamente à Súmula nº 231 do STJ, que a existência de uma circunstância atenuante fará com que a pena-base encontrada seja, obrigatoriamente, diminuída, pouco importando se tenha ou não sido fixado em seu mínimo legal. O art. 65 não faz essa ressalva, pelo contrário determina expressamente, por intermédio do advérbio sempre, que a pena deverá ser diminuída caso exista alguma circunstâncias atenuante.8

Por seu turno Celso Delmanto, abraçando o posicionamento assumido por...

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