Atualização monetária

AutorPaulo Cesar Baria de Castilho
Ocupação do AutorAtuou como perito judicial contábil trabalhista e é mestre em Direito Tributário pela PUC de São Paulo e Doutor em Direito do Trabalho pela mesma Universidade
Páginas109-117

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A atualização monetária ao contrário dos juros, visa apenas a recompor o valor nominal da moeda, restituindo-lhe, ainda que de forma parcial, o mesmo poder de compra do seu valor original na data em que era devido inicialmente.

Não visa, portanto, a remunerar o capital, cuja função é atribuída aos juros.

A aplicação da atualização monetária aos débitos trabalhistas independe da determinação expressa da sentença (art. 39, § 1º, da Lei n. 8.177/91), isto porque, sem a atualização do débito, a condenação judicial restaria inócua, pois seu valor monetário seria praticamente inexpressivo, em função do elevado processo inflacionário que viveu o país, especialmente no período anterior ao Plano Real.

Preferimos utilizar o termo atualização monetária, por melhor refletir a ideia do referido instituto: recompor o valor de compra da moeda. O termo "correção monetária", ainda que bastante usado e difundido pela doutrina e jurisprudência, traz no seu bojo a ideia de que o valor original estava "errado" e, por isso, precisa ser "corrigido". Como se sabe, não é isso que acontece. O valor original está correto, precisa apenas ser adequado à realidade contemporânea, diante dos efeitos do processo inflacionário que, de tempos em tempos, volta a assombrar o país.

10.1. Evolução da legislação

Um dos temas mais conturbados e polêmicos dentro da fase de liquidação de sentença é a questão da aplicação do coeficiente (ou percentual) devido na atualização monetária dos débitos trabalhistas, tendo em vista a grande quantidade de dispositivos legais que versam sobre o tema.

A partir do início de 1986, com a edição do Plano Cruzado, o Brasil viveu uma série de momentos distintos em sua economia, em que a instabilidade política levou a uma série de planos econômicos (Cruzado I, Cruzado II, Bresser, Verão, Collor I, Collor II etc.), com constantes alterações nos índices de atualização monetária.

Para melhor compreensão de cada período, comentaremos o que ocorreu de mais importante em cada um deles, cujos resultados foram consolidados em uma Tabela única (Tabela 1), conforme constante do Cap. 13 - Tabelas Práticas.

O presente estudo sobre atualização monetária dos débitos trabalhistas foi elaborado com base na obra de Juarez Varallo Pont, denominada Cálculos de liquidação no processo trabalhista, publicada pela editora Juruá.

10.2. 1º período - Dec -lei n. 75/66

Desde que o Dec.-lei n. 75/66 instituiu a aplicação da atualização monetária aos débitos trabalhistas, os coeficientes a serem aplicados até dezembro de 1985 eram definidos pela variação da ORTN - Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional, que à época sofria reajustes ao final de cada trimestre civil (dezembro, março, junho e setembro), cujos índices eram divulgados pela Secretaria de Planejamento da Presidência da República - SEPLAN/PR.

Este é considerado um período tranquilo (novembro de 1966 a dezembro de 1985), uma vez que não houve qualquer alteração nos critérios utilizados para a atualização dos débitos trabalhistas.

Contudo, é a partir de 1986 que surgem as alterações constantes nos critérios adotados para a aplicação da atualização monetária aos referidos débitos.

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10.3. 2º período - Dec -lei n. 2.284/86 - Plano Cruzado

Com o advento do Dec.-lei n. 2.284, editado em março de 1986, o Governo pretendia expurgar de uma vez por todas a inflação reinante no país e, por isto, deixou de publicar no final do primeiro trimestre de 1986 (contrariando a sistemática dos trimestres anteriores), os coeficientes que deveriam atualizar os débitos trabalhistas naqueles três primeiros meses do ano (janeiro a março de 1986).

Certo é, contudo, que, embora o Governo não tenha publicado o índice de atualização monetária daquele período, a inflação existiu e a moeda sofreu seus efeitos corrosivos, pelo menos nos dois primeiros meses daquele ano (janeiro e fevereiro de 1986).

Em janeiro de 1986, a taxa de inflação foi de 16,23% e, no mês de fevereiro de 1986, de 14,36%, cujo montante acumulado no referido bimestre foi de 32,92% (16,23% x 14,36% + 2,33% = 32,92%).

No mês seguinte, o indexador utilizado para o cálculo da atualização monetária dos débitos trabalhistas foi alterado de IPCA para IPC, cuja taxa no mês de março de 1986 foi negativa, correspondente ao percentual de - 0,11%, não havendo, portanto, o que se falar em inflação neste mês.

A partir daí, a ORTN, transformada em OTN, deixou de ser atualizada trimestralmente e, por consequência, os débitos trabalhistas deixaram de ser atualizados, recebendo os reclamantes os valores que lhes eram devidos com a atualização monetária "estancada" em 31.12.1985, com base na última tabela de atualização publicada pelo Governo por meio da Portaria n. 250/85.

Era comum o reclamante receber o crédito a que tinha direito somente no mês de agosto de 1986 correspondente ao mesmo valor que lhe era devido em 31 de dezembro de 1985.

Nessa altura a quantidade de recursos promovidos pelos reclamantes pleiteando a atualização monetária deste período era incontável. Surge então a intervenção do Governo com a publicação de nova portaria para tentar resolver o impasse.

a) Portaria Interministerial n. 117/86

A Portaria Interministerial n. 117/86, editada apenas em 9.9.1986, divulgada pela SEPLAN/PR, agora em conjunto com o Ministério do Trabalho, procurou resolver o "buraco negro" que surgiu com o congelamento dos índices de atualização monetária ocasionado pelo Plano Cruzado.

Sua utilização, contudo, restou prejudicada. Isto porque, após cansativos cálculos, limitou-se à aplicação daquele percentual de 32,92%, referente à inflação do primeiro bimestre de 1986, conforme demonstrado no item anterior (Jan = 16,23% + Fev = 14,36% = 32,92% índice acumulado).

Cabe esclarecer aqui que a taxa negativa de março de 1986, de 0,11%, foi desprezada para efeito de cálculo do índice acumulado de 32,92%.

b) Dec.-lei n. 2.311/86

Dentro ainda do chamado Plano Cruzado foi editado, em 23.12.1986, o Dec.-lei n. 2.311/86, que previa, no seu art. 1º, novo critério para a atualização da OTN (que estava congelada até aquela data e seria reajustada somente a partir de 1º.3.1987), conforme segue:

Art. 1º O parágrafo único do art. 6º e o art. 12 do Dec.-lei n. 2.284, de 10.3.1986, passam a vigorar com a seguinte redação:

Art. 6º (...)

Parágrafo único. Na atualização do valor nominal da OTN, em 1º de março de 1987, serão computados:

  1. as variações do IPC ocorridas até 30 de novembro de 1986;

  2. a partir de 1º de dezembro de 1986 e até 28 de fevereiro de 1987, as variações do IPC ou os rendimentos das Letras do Banco Central (LBC), adotando-se, mês a mês, o índice que maior resultado obtiver.

Assim, novo "buraco negro" estava previsto na legislação, ou seja, a OTN que estava congelada desde março de 1986 iria permanecer com o mesmo valor até fevereiro de 1987, embora continuasse existindo inflação no país e a cada mês com índices maiores.

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A variação daquele período em que permaneceu congelada a OTN, medida pelo IPC/LBC, conforme determinou o já referido art. 1º, do Dec.-lei n. 2.311/86, atingiu o montante de 70,70% (OTN março/87 dividida pela OTN de março/86 = 181,61/106,40 = l,7070 = 70,70%). Este percentual serviu para atualizar a OTN em março de 1987, conforme Circular 1.149/87, do BACEN.

Assim, durante este período de março de 1986 a fevereiro de 1987, em que a OTN manteve-se congelada, houve novamente verdadeira "avalanche" de embargos pleiteando a atualização monetária aos débitos trabalhistas pagos neste período.

O argumento dos reclamantes obteve força ainda maior com a edição do referido Dec.-lei n. 2.311/86, que acabou por reconhecer oficialmente a existência de inflação naquele período.

10.4. 3º período - Dec -lei n. 2.322/87

Com a edição do Dec.-lei n. 2.322/87, em 27.2.1987, a "paz volta a reinar" na aplicação da atualização monetária aos débitos trabalhistas. Isto porque o § 1º, do art. 3º, do referido decreto deixou explícito que, a partir de sua edição, a atualização monetária dos débitos trabalhistas seria regida pela variação nominal do valor das OTNs - Obrigações do Tesouro Nacional:

§ 1º Nas decisões da Justiça do Trabalho, a correção monetária será calculada pela variação nominal da Obrigação do Tesouro Nacional, OTN, observado...

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