Assédio moral no trabalho e a dificuldade da prova

AutorIlse Marcelina Bernardi Lora
CargoJuíza do Trabalho no Paraná
Páginas5-21
LORA, I. M. B. 5
Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR, v. 15, n. 1, p. 5-21, jan./jun. 2012
1. NOTAS HISTÓRICAS SOBRE O ASSÉDIO MORAL
O assédio moral, também conhecido como terrorismo psicológico, ma-
nipulação perversa, bullying, dentre outros termos similares, vem frequentando,
com preocupante assiduidade, o cotidiano do Judiciário Trabalhista, a revelar
que se trata de fenômeno que estende seus poderosos e deletérios tentáculos no
âmbito das relações de trabalho.
Embora o interesse pelo tema, notadamente na área trabalhista, tenha
sofrido recrudescimento, trata-se de problema antigo, inicialmente descoberto e
estudado em área absolutamente estranha às relações de trabalho.
Coube ao etologista austríaco Konrad Lorenz, que viveu de 1903 a
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duz a noção de turba ou multidão desordeira. Lorenz analisou o comportamento
de animais que viviam em grupo e constatou que, havendo invasão de seu terri-
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de expulsar o invasor.
No âmbito das relações humanas, o pioneirismo é atribuído ao médico
sueco Peter-Paul Heinemann. Estudando, na década de 60, crianças reunidas em
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ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO E A DIFICULDADE DA PROVA
Ilse Marcelina Bernardi Lora1
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Juríd. Soc. UNIPAR. Umuarama. v. 15, n. 1, p. 5-21, jan./jun. 2012.
RESUMO: O assédio moral é tema frequente nas ações trabalhistas, o que de-
-
tem a saúde física e psíquica do trabalhador, a par de determinar prejuízos às
empresas e ao Estado, em razão do custo das doenças que dele decorrem. Os atos
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o acesso à justiça de parte das vítimas. Tais circunstâncias geram impunidade e
esta, por sua vez, estimula a reiteração das práticas ilícitas. O estudo examina a
possibilidade de inversão do ônus da prova como instrumento para equacionar as
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do acerca da procedência de suas alegações.
PALAVRAS-CHAVE: Assédio moral, Relações de trabalho, Acesso à justiça,
Ônus da prova, Inversão.
1Juíza do Trabalho no Paraná
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Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR, v. 15, n. 1, p. 5-21, jan./jun. 2012
tivos contra colegas da mesma classe.
Passados vinte anos, na década de 80, estando o assunto ainda restrito
à literatura psicológica, o alemão Heinz Leymann denunciou que o fenômeno
      -
mente era usada a violência física, sendo o assédio moral marcado por condutas
insidiosas, de difícil demonstração, como o isolamento social da vítima.
A psicóloga francesa Marie France Hirigoyen, referência mundial no
assunto, aprofundou as pesquisas, lançando, em 1998, o livro “Assédio moral: a
violência perversa no cotidiano”. A obra, em razão de seu conteúdo e relevância,
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tamentos o caracterizam, e também o que não é assédio moral, além de acen-
tuar adequadamente as diferenças de outras formas de sofrimento no trabalho,
igualmente ocasionou o aprofundamento da temática, notadamente no âmbito
trabalhista. Diz a pesquisadora na introdução de sua segunda obra, publicada em
20002:
Ignorado na França até a publicação de meu livro precedente, o assé-
dio moral no trabalho tornou-se, há dois anos, uma forte preocupação
social. Pessoas assediadas, que, até então, sofriam em silêncio, read-
quiriram a esperança; ousam agora se expressar e denunciar as práti-
cas abusivas de que são vítimas. Novas reivindicações deram origem
a numerosos movimentos sociais importantes, pois os trabalhadores
passaram a não mais aceitar ofensas e comportamentos que ofendam
sua dignidade. Eles exigem ser respeitados.
Hirigoyen demonstrou, em sua pesquisa, que as consequências do as-
sédio moral não estão circunscritas aos trabalhadores, atingindo também as em-
presas, na medida em que a prática pode ensejar pagamento de indenizações de
valor expressivo e queda da produtividade, dentre outras repercussões, compro-
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bém é problema de saúde pública, pois os governos são compelidos a suportar os
custos do tratamento das doenças determinadas pelo assédio moral.
No Brasil, a médica do trabalho Margarida Barreto elaborou dissertação
de mestrado intitulada “Uma Jornada de Humilhações”, a partir de pesquisa de
campo, onde analisou as humilhações sofridas por trabalhadores dos setores quí-
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informa Márcia Novaes Guedes3, colheu o relato de cerca de 2.072 trabalhado-
2HIRIGOYEN, Marie-France. . Trad. Reja-
ne Joanowitzer. 2ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005, p. 9.

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