Aplicabilidade do Artigo 219 do CPC/2015 nos Juizados Especiais

AutorThomas Ubirajara Caldas de Arruda
CargoAdvogado. Assistente Jurídico da Defensoria Pública de Segunda Instância de Mato Grosso
Páginas6-9

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Excertos

"Não há nenhum dispositivo, definitivamente nada, na Lei 9.099/95 que regulamente a forma de contagem dos prazos processuais perante os juizados especiais"

"Se a vontade do legislador foi implantar um sistema jurídico coeso, coerente e principalmente íntegro, destoa da lógica a não aplicação do CPC ao sistema dos juizados"

"O diálogo entre as diversas classes é imprescindível para que se alcance a solução mais adequada, antes que os tribunais interpretem a norma concentrados em pura vaidade intelectual"

Inicialmente, é necessário apontar que a novidade trazida pelo artigo 219 da Lei 13.105/15, o novo Código de Processo Civil, referente à contagem dos prazos processuais em dias úteis apenas, refiete um antigo desejo dos advogados ao digno descanso nos feriados e finais de semana, assim como aos juízes, auxiliares e serventuários da justiça. Trata-se de demo-cratização da legislação e do sistema em si, o que em nada obstaculiza a tramitação dos feitos, especialmente porque o código nasceu com os olhos voltados para o espírito de cooperativismo processual, decorrente da ideia de que todas as partes que integram o processo devem colaborar para a obtenção de uma decisão justa, célere e efetiva.

O novel diploma deixou de enveredar por vales escuros na imaginação dos seus entusiastas para se tornar realidade factível, com a publicação e ulterior entrada em vigor, em março de 2016. Dizem por aí que o código é um divisor de águas, por ser o primeiro desenvolvido em regime democrático no país, o que não quer dizer que seja levemente digestivo. Longe disso. Hoje percebemos que digerir a invocação de algumas interpretações do CPC/2015 poderá se tornar uma tarefa afiitiva, angustiante, pelo menos nos primeiros anos de vigência. A preocupação que tanto pulsava na cabeça dos opera-dores do direito revela agora não ser somente o medo do novo, mas sim fruto de um sem-número de razões, sendo que uma delas concentra-se na (in)aplicabilidade da nova legislação processual ao microssistema dos juizados especiais cíveis. Afinal, a contagem dos prazos nos JECs será realizada em dias úteis ou continuará fiuindo em dias contínuos?

Muito se discutiu sobre o assunto, e, mesmo dentre os mais renomados estudiosos da comunidade jurídica, inclusive aqueles que acompanharam a tramitação do novo código e participaram da elaboração de seu texto, despontaram divergências. Não é o que deveria acontecer, pois, no que se refere à compatibili-dade do art. 219 com o procedimento especial da Lei 9.099/95, a questão é tecnicamente simples, arredia a interpretações mirabolantes.

Há quem diga que a aplicação subsidiária do CPC somente ocorrerá na fase de cumprimento de sentença e "no que couber", com fundamento no artigo 52 da lei que rege o procedimento especial1. Para tanto, afirmam alguns juristas, assim quis o legislador; caso contrário, reservaria um dispositivo que manifestasse expressamente a vontade de que fossem aplicadas as regras do procedimento comum.

Com efeito, analisando o texto do artigo 178 do Código de Processo Civil de 19732, é possível observar que a norma anterior previa claramente que o prazo (legal ou judicial) era contínuo e não se interrompia nos feriados. Nos juizados especiais, mencionada regra geral sempre foi aplicada subsidiariamente, sem maiores digressões, justamente por ausência de norma específica na Lei 9.099/95. Veja bem, nunca houve disposição expressa a respeito, mas a aplicação da regra geral de contagem dos pra-

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zos do CPC sempre vestiu perfeitamente bem, como um terno italiano, o sistema especial dos juizados. Pelo menos até a vigência do "famigerado violentador da celeridade", persona non grata pelos ferrenhos defensores do microssistema: o novo Código de Processo Civil.

Primeiro, é preciso empreender uma análise partindo da premissa de que não há nenhum dispositivo, de-finitivamente nada, na Lei 9.099/95 que regulamente a forma de contagem dos prazos processuais perante os juizados especiais. Da leitura, ponta a ponta, da norma especial, não é possível saber se no cômputo dos prazos se exclui o dia do co-meço e inclui o dia do fim ou vice--versa, muito menos se o transcurso do prazo será contínuo ou de modo diverso.

Assim, nada mais lógico do que a prevalência da regra geral do artigo 219 do novo diploma, até porque a Lei 9.099/95 fez questão de acompanhar a realidade do Código...

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