O direito ambiental sob a perspectiva da proteção internacional à pessoa humana

AutorAna Beatriz Koury - Daniel Leão Sousa
CargoGraduandos em Direito pela UFMG (7° período)
Páginas1-20
Regras para Citação:
KOURY, A. B.; SOUSA, D. L. O Direito Ambiental sob a Perspectiva da Proteção
Internacional à Pessoa Humana. Revista dos Estudantes de Direito da Universidade de
Brasília, n. 8, p. 306-345, 2009.
O DIREITO AMBIENTAL SOB A PERSPECTIVA DA PROTEÇÃO INTERNACIONAL À PESSOA
HUMANA
Ana Beatriz Koury e Daniel Leão Sousa
1
Resumo: O presente trabalho se propõe a analisar a proteção internacional do meio ambiente à luz do corpus juris
do Direito Internacional dos Direitos Humanos. Pens ar na existência de um Dire ito Ambiental Internacional
desprovido de uma vertente “antropocêntrica” – destinada, em último grau, à proteção da qualidade de vida e da
sobrevivência dos seres humanos – equivaleria a negar a orientação apresentada pela jurisprudência de tribunais
internacionais, por tratados e pela doutrina, qual seja, a de emprestar à proteção do meio ambiente um caráter de
humanidade.
Palavras-chave: Sistemas de Proteção aos Direitos Humanos; Direito Ambiental Internacional; Direito à Vida.
Abstract: The present article intends to analyze the international protection of the environment in the light of the
corpus juris and the jurisprudence of the International Human Rights Law. To consider the existence of an
International Environmental Law destitute of an a nthropocentric branch – which is intended, at an extreme degree,
to protect the quality of life and the survival of human beings – would mean a denial of th e orientation presented
by the jurisprudence of international courts, by a wild range of treaties and by the international doctrine, which is,
to embrace the environmental protection with a humanity character.
Keywords: International Human Rights Systems; International Environmental Law; Right to life
1. A “HUMANIZAÇÃO” DO DIREITO AMBIENTAL INTERNACIONAL
O Direito Internacional dos Direitos Humanos recebeu atenção da comunidade
internacional a partir, sobretudo, dos anos que se seguiram à II Guerra Mundial. O corpus
juris desse ramo do Direito, destarte, sofreu consideráveis expansões nas últimas seis
décadas, com a adoção de variados instrumentos internacionais, além da criação de um
Sistema Universal e de Sistemas Regionais de Proteção aos Direitos Humanos. Todos com o
mesmo fim: a salvaguarda da pessoa humana, e a garantia de que a barbárie a que se
assistiu na primeira metade do século XX não mais se repetiria.
Tal desenvolvimento, como bem se sabe, precedeu a construção do Direito
Ambiental Internacional, crescente a partir da década de 60
2
e, especialmente, após a I
Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente, de 1972. Natural foi, portanto, a tendência
de que se adotasse uma visão “antropocêntrica” do Direito Ambiental, ou, em outros
termos, que esse se revelasse, a priori, como meio de proteção dos seres humanos, e não
como um fim em si mesmo. Tal entendimento é expresso logo no Princípio 1 da Declaração
de Estocolmo: “O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute
1
Graduandos em Direito pela UFMG (7° período).
* O presente trabalho foi apresentado no Seminário de Desenvolvimento e Meio Ambiente na ILSA Interna tional
Conference – Brasil 2008, realizado em 15 de agosto de 2008, em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.
2
ANNONI, Daniela. Direitos Humanos e Meio Ambiente: Contribuiçõ es para a Humanização do Direito Internacional
Contemporâneo. In: Os Rumos Do Direito Internacional Dos Direitos Huma nos: Ensaios Em Homenagem Ao
Professor Antonio Augusto Cançado Trindade: 393-424. Porto Alegre: Fabris, 2005, p. 497.
2
de condições de vida adequadas, em um meio ambiente de qualidade, tal que lhe permita
levar uma vida digna e gozar de bem-estar”. Todavia, com o desenvolvimento dos diversos
ramos do Direito Ambiental Internacional, tal postura seria sobrepujada pela idéia de que a
proteção ambiental constitui um fim autônomo
3
.
Importante é ressaltar, nesse sentido, que, ao contrário do que se pode pensar, as
duas visões não devem ser encaradas como excludentes. Isso corresponderia a tolher a
expansão do Direito Ambiental e, ao mesmo tempo, negar uma realidade que nos é
patente: a vida humana guarda relação de dependência para com as condições ambientais.
A própria construção do direito a um meio ambiente sadio contribui para a afirmação de
que a perspectiva “humanista” de análise da proteção ambiental não se encontra, de forma
alguma, superada.
Na presente exposição discutir-se-á, portanto, o nascimento e evolução do direito a
um meio ambiente sadio, bem como as contribuições o ferecidas pelos sistemas
internacionais de proteção dos direitos humanos à construção desse direito e à proteção do
meio ambiente.
2. SISTEMAS INTERNACIONAIS DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS
É possível constatar aproximações normativas no que concerne à proteção ao meio
ambiente e a proteção à pessoa humana, tanto em instrumentos internacionais de direitos
humanos quanto em instrumentos que versam sobre o Direito Ambiental Internacional.
Nesse sentido adverte TRINDADE:
Pode-se em nossos dias detectar um ponto de contato entre a proteção dos
direitos humanos e a proteção ambiental na preocupação com esta última nos
instrumentos internacionais de direitos humanos e, reversamente, na
preocupação com a proteção dos direitos humanos nos instrumentos
internacionais de direito ambiental.
4
Tal “ponto de contato” será examinado, no presente trabalho, por meio da análise
comparada dos quatro sistemas internacionais de proteção à pessoa humana, quais sejam:
Sistema Universal (Sistema ONU); Sistema Europeu; Sistema Interamericano e Sistema
Africano.
2.1 Sistema Universal (Sistema ONU)
O Sistema Universal de Proteção aos Direitos Humanos (ou Sistema ONU) é composto
por instrumentos de direitos humanos que formam um corpus juris internacional de
proteção a esses direitos, bem como por pareceres de seus órgãos especializados advindos
da análise de casos concretos de violações. Vale notar que esse sistema evolui aos poucos,
concomitantemente à própria evolução da preocupação com os direitos humanos em
âmbito internacional
5
. Passar-se-á a análise dos (i) instrumentos de direitos humanos; dos
(ii) instrumentos de direito ambiental; do (iii) direito internacional costumeiro e, por fim,
dos (iv) procedimentos quase judiciais do Comitê de Direitos Humanos da ONU, que
evidenciam a relação de interdependência e ntre os direitos humanos e a proteção ao meio
ambiente.
3
Cf. SANDS, Philippe. Principles of International Environmental Law. 2. Ed. Cambridge: Ca mbridge University Press,
2003, pp. 292-293.
4
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direitos Humanos e Meio Ambien te: Paralelo dos Sistemas de Proteção
Internacional. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1993, p. 113.
5
GODINHO, Fabiana de Oliveira. Coleção pra entender: A proteção internacional dos direitos humanos. Belo
Horizonte: Del Rey, 2006, p.7-8.

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