Percepção ambiental como instrumento de participação social na proposição de área prioritária no semiárido

AutorMycarla Míria Lucena - Eliza Maria Freire
CargoDoutoranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil - Professora Titular do Departamento de Botânica, Ecologia e Zoologia-DBEZ, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil
Páginas147-171
1807-1384.2014v11n1p147
Esta obra foi licenciada com uma Licença Creative Commons - Atribuição 3.0 Não
Adaptada.
PERCEPÇÃO AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL
NA PROPOSIÇÃO DE ÁREA PRIORITÁRIA NO SEMIÁRIDO
Mycarla Míria Lucena
1
Eliza Maria Freire2
Resumo:
A percepção ambiental tem sido um instrumento bastante utilizado e relevante em
estudos que contemplam as relações entre meio ambiente e ações humanas, por
possibilitar análises das percepções, atitudes e valores, principais formadores da
topofilia, que repercute em ações de conservação. Nessa perspectiva, esta pesquisa
teve como objetivo analisar a Percepção Ambiental da comunidade de um complexo
serrano do Semiárido brasileiro (Serra João do Vale) como um dos critérios para a
proposição de Área Prioritária para Conservação. Para tanto, realizaram-se
entrevistas com 240 pessoas (100% dos domicílios ocupados na comunidade
serrana), utilizando como metodologia a observação e questionamento por meio de
entrevistas e aplicação de formulários, sendo estes aplicados nos meses de
fevereiro a agosto de 2011, com base teórico-metodológica da Percepção
Ambiental. Os resultados mostraram de forma clara nas respostas dos
entrevistados, seus conhecimentos e opiniões, assim como a concordância com a
criação de uma área exclusiva para conservação da Serra João do Vale. Mostraram
ainda que a chegada do turismo gera expectativa de melhorias na renda e na
qualidade de vida para essa comunidade.
Palavras-chave: Comunidade Rural. Percepções. Conservação. Ambiente Serrano.
Semiárido.
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, tem-se acompanhado um avanço das discussões no meio
acadêmico e na sociedade em geral, sobre a importância da conservação dos
recursos naturais, tanto de áreas que são protegidas por lei como das
preservadas, mas que não detêm nenhuma proteção legal. O Brasil, país com
elevada biodiversidade, mas que enfrenta graves problemas ambientais, conta com
o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), por meio do qual são
conservadas algumas áreas que ainda mantêm preservadas fauna e flora
1 Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil. E-mail: mycarlamiria@yahoo.com.br
2 Professora Titular do Departamento de Botânica, Ecologia e Zoologia-DBEZ, Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, Natal, RN, Brasil. E-mail: elizajuju@ufrnet.br
148
R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.11, n.1, p. 147-171, Jan./Jun. 2014
características de determinada região, bem como espécies endêmicas e ameaçadas
de extinção (REMPEL et al., 2008). Apesar do SNUC, os problemas ambientais
resultantes de ações antrópicas persistem, destacando-se suas relações com as
dinâmicas e alterações que promovem mudanças ambientais globais, com
consequências sobre a perda da biodiversidade e a degradação dos recursos
naturais (HOEFFEL; FADINI; SEIXAS, 2010).
Entre as regiões brasileiras submetidas à degradação ambiental encontra-se
a do semiárido, que inclui o Bioma Caatinga, o qual tem vivenciado muitas
transformações e contradições ao longo da sua história. Desde a colonização, esta
região ficou submetida primeiramente à atividade pecuária, que foi a base
econômica da região por alguns séculos e a forma típica de ocupação do território
(SOARES; ALMEIDA, 2011), e, seguidamente, aos impactos do processo de uso e
ocupação do solo, que degradaram paulatinamente, até a atual situação de regiões
em processo de desertificação (MACIEL, 2010).
Apesar de sua aparente fragilidade, a Caatinga possui uma rica
biodiversidade e alto número de endemismo, além de ser exclusivamente brasileira,
mas ainda não tem sua importância devidamente reconhecida pelo poder público
(MACIEL, 2010). Nesse contexto, a criação de Unidades de Conservação (UCs) tem
sido uma das estratégias que vem sendo utilizada para possibilitar a conservação
dos ecossistemas naturais, uma vez que é considerada uma via efetiva de proteção
dos recursos biológicos (MACIEL, 2010). Aliada a esse sistema de UC, um dos
critérios para reconhecimento e delimitação de áreas relevantes para a conservação
tem sido a designação de Áreas Prioritárias para Conservação, estabelecidas pelo
Decreto nº 5.092, de 24 de maio de 2004 (BRASIL, 2004), instituídas pela Portaria
MMA nº 126, de 27 de maio de 2004, e atualizadas pela Portaria MMA nº 09, de 23
de janeiro de 2007 (MMA, 2007).
Apesar da relevância da definição dessas Áreas Prioritárias para a
Conservação da Biodiversidade, seus critérios são questionáveis, uma vez que não
existe participação social efetiva nesse processo de definição, pois, para designação
dessas áreas, foram utilizados essencialmente os conhecimentos sobre riqueza
biológica, áreas de endemismo e distribuição de espécies ameaçadas de extinção. A
inclusão e utilização dos conhecimentos das comunidades locais do entorno dessas
áreas naturais seria de extrema importância, tendo em vista que, segundo Bezerra

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT