Ações Civis Admissíveis no Processo do Trabalho

AutorMauro Schiavi
Ocupação do AutorJuiz Titular da 19a Vara do Trabalho de São Paulo
Páginas1311-1445

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1. Conceito e espécies

A fim de que seja observado o devido processo legal, que é um mandamento constitucional e uma garantia da cidadania, o processo deve obedecer aos trâmites legais, passando por todas as fases até atingir uma decisão definitiva, com o trânsito em julgado.

Não obstante, situações há em que o direito postulado não pode aguardar o regular desenrolar do processo, sob consequência de perecimento. Desse modo, há instrumentos processuais destinados a tutelar pretensões que não podem esperar a tramitação do processo, muitas vezes, nem sequer aguardar a citação do réu. Tais medidas processuais são chamadas pela doutrina de tutelas de urgência, que têm por objetivo resguardar direito (tutela cautelar), antecipar o próprio provimento de mérito (tutela antecipatória) ou impedir que um dano iminente aconteça (tutela inibitória).

Como destaca José Roberto dos Santos Bedaque1:

“Os provimentos antecipatórios urgentes são cabíveis em qualquer forma de tutela e podem antecipar totalmente os efeitos da tutela final. Essa circunstância confere à instrumentalidade, característica fundamental das cautelares, conotação pouco diversa daquela atribuída tradicionalmente a essa modalidade de tutela, se analisadas as medidas meramente conservativas. Aliás, exatamente em razão desse fator, passou a doutrina a pensar em outra categoria de proteção jurisdicional — a tutela de urgência —

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destinada a abranger todas as medidas necessárias a evitar risco de dano ao direito. Caracterizam-se não pela sumariedade da cognição, circunstância também presente em tutelas não cautelares, mas pelo periculum in mora. Analisa-se a situação substancial e verifica-se a necessidade de proteção imediata, em sede cautelar, ante a impossibilidade de se aguardar o tempo necessário para a entrega da tutela final”.

A Consolidação das Leis do Trabalho contém disposição sobre tutela de urgência no art. 659, incisos IX e X, que tem a seguinte redação:

Competem privativamente aos Presidentes das Juntas, além das que lhes forem conferidas neste Título e das decorrentes de seu cargo, as seguintes atribuições:

IX – Conceder medida liminar, até decisão final do processo em reclamações trabalhistas que visem a tornar sem efeito transferência disciplinada pelos parágrafos do art. 469 desta Consolidação. (Acrescentado pela Lei n. 6.203/75 – DOU 18.4.75)

X – conceder medida liminar até decisão final do processo, em reclamações trabalhistas que visem reintegrar no emprego dirigente sindical afastado, suspenso ou dispensado pelo empregador. (Acrescentado pelo Decreto n. 9.270/96 – DOU 18.4.96)

Conforme o referido dispositivo legal, o Juiz do Trabalho poderá conceder liminares, antes da decisão final, a fim de evitar a transferência abusiva do empregado, ou para reintegrar dirigente sindical.

Há divergência na doutrina sobre a natureza da liminar mencionada nos incisos IX e X, do art. 659, da CLT, não obstante, conforme acertadamente se posicionou a doutrina majoritária, não se trata de tutela cautelar, pois não é providência de cautela a fim de assegurar a efetividade da tutela jurisdicional, mas de concessão da própria tutela de mérito, antes da sentença. Em razão disso, tal liminar tem contornos de tutela antecipada.

Nesse sentido, destacamos a seguinte ementa:

A antecipação de tutela prevista no art. 273 do CPC, é instituto do Processo Civil, que deve sofrer adaptação no Processo do Trabalho. Segundo o art. 769 da CLT, o Processo Civil é fonte subsidiária do Processo do Trabalho, sendo que a transposição de seus institutos deve se dar em consonância com as normas, princípios e peculiaridades a ele inerentes. O art. 659 da CLT, que, em seus incisos IX e X, contempla providência cuja natureza é verdadeira antecipação de tutela, atribui ao juiz presidente das Juntas a competência privativa para concedê-la (TST, RO-MS 417.142/98.7, Milton de Moura França, Ac. SBDI-2)2.

1.1. Da fungibilidade das tutelas de urgência

Considerando-se o caráter urgente das tutelas antecipatórias, cautelares e inibitórias, o resultado útil de tais medidas, a instrumentalidade do processo, e a efetividade processual, a moderna doutrina, à luz das recentes alterações do Código de Processo Civil pelas Leis ns. 10.444/2002 e 11.280/06, consagrou o chamado princípio da fungibilidade das tutelas de urgência.

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Ensina Plácido e Silva3:

“Coisa fungível é substituível. A coisa consumível é a que se anula ou desaparece desde que cumpra a sua finalidade ou dela se tenha tirado a sua utilidade. Mas o direito emprega fungível para significar substitutibilidade de uma coisa por outra, sem alteração de seu valor, desde que possa contar, medir ou pesar”.

Pelo princípio da fungibilidade das tutelas de urgência é possível que o juiz possa conceder uma medida de urgência no lugar de outra postulada, desde que presentes os requisitos para concessão.

Como bem adverte Cândido Rangel Dinamarco4, a fungibilidade entre duas tutelas deve ser o canal posto pela lei à disposição do intérprete e do operador para a necessária caminhada rumo à unificação da teoria das medidas urgentes — ou seja, para a descoberta de que muito há na disciplina explícita das medidas cautelares que comporta plena aplicação às antecipações de tutela.

Nesse sentido, é o § 7º do art. 273 do CPC, incluído pela Lei n. 10.444, de 2002: Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.

Conforme o referido dispositivo, é possível ao juiz, de ofício, converter o pedido de tutela antecipada em cautelar, desde que presentes os requisitos para concessão da medida cautelar. Pensamos que o referido dispositivo é de mão dupla, vale dizer: se o autor pedir provimento cautelar, mas se estiverem presentes os requisitos da tutela antecipada, o juiz poderá conceder o provimento antecipatório.

Nesse teor é a visão de Dinamarco5:

“O novo texto não deve ser lido somente como portador da autorização a conceder uma medida cautelar quando pedida a antecipação de tutela. Também o contrário está autorizado, isto é: também quando feito um pedido a título de medida cautelar, o juiz estará autorizado a conceder a medida a título de antecipação de tutela, se esse for seu entendimento e os pressupostos estiverem satisfeitos. Não há fungibilidade em uma só mão de direção. Em direito, se os bens são fungíveis isso significa que tanto se pode substituir um por outro, como outro por um”.

No mesmo diapasão, é a redação do art. 489 do CPC, com a redação dada pela Lei n. 11.280/2006, in verbis:

O ajuizamento da ação rescisória não impede o cumprimento da sentença ou acórdão...

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