Ação Civil Pública (PRT 2ª Região)

AutorLorena Vasconcelos Porto
CargoProcuradora do Trabalho
Páginas193-235

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Excelentíssimo(a) Senhor(a) Doutor(a) Juiz(a) da Mm. ____ Vara do Trabalho de Guarulhos/SP

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO - PROCURADORIA DO TRABALHO NO MUNICÍPIO DE GUARULHOS, CNPJ n. 26.989.715/0033-90, situada na Rua Ibirapitanga, 19, Jardim Zaira, CEP 07095-120, Guarulhos/SP, pela Procuradora do Trabalho que esta subscreve, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, com fulcro nos arts. 127, caput, e 129, incisos III e IX, da Constituição Federal; artigos 6º, VII, "d", e 83, inciso III, da Lei Complementar n. 75/1993; arts. 81 e 82 da Lei n. 8.078/1990; e arts. 1º, inciso IV, e da Lei n. 7.347/1985, ajuizar a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

em face da AEROVIAS DE MÉXICO S.A. DE CV - AEROMEXICO, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n. 01.369.588/0002-07, estabelecida na Rodovia Hélio Smidt, s/n, Terminal 1, Asa A, Cumbica, CEP n. 07041-000, Guarulhos/SP, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.

I - Dos fatos

O Ministério Público do Trabalho instaurou o Procedimento Promocional n. 000289.2012.02.005/0 para apurar o desvirtuamento na contratação de

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serviços terceirizados pelas companhias aéreas no Aeroporto Internacional de Guarulhos. Tal desvirtuamento havia sido veriicado no curso do Inquérito Civil n. 000259.2011.02.005/6, da Carta Precatória n. 000215.2012.02.005/4 e do Inquérito Civil n. 000151.2011.02.005/7, em especial nas diligências realizadas no referido aeroporto por esta Procuradora do Trabalho, em 18.11.2011 e em 9.8.2012, e pela Exma. Dra. Rosemary Fernandes Moreira, em conjunto com o Ministério do Trabalho e Emprego, em 5.9.2011 (Doc. 1).

Ao inal do procedimento acima referido, foram instaurados procedimentos investigatórios em face de cada uma das companhias aéreas que se encontravam em situação irregular, tendo sido instaurado em face da ré o Inquérito Civil n. 000349.2013.02.005/2.

Em resposta à intimação do Parquet, a ré juntou os documentos requisitados e informou que opera apenas no Aeroporto de Guarulhos e que os trabalhadores que exercem as atividades de atendimento a passageiro (check-in, check-out, embarque, desembarque, venda e reserva de passagens) nesse aeroporto são terceirizados através de contrato irmado com a Seaviation Serviços Aeroportuários Ltda. Veriicou-se que a ré mantém 37 (trinta e sete) trabalhadores terceirizados e apenas 3 (três) empregados próprios nessas funções (Doc. 2).

Em prosseguimento, foi designada audiência administrativa, na qual o Parquet expôs à ré a necessidade de se adequar à legislação trabalhista, contratando diretamente como empregados os trabalhadores que exercem as atividades de atendimento a passageiro, e propôs-lhe a assinatura de Termo de Ajuste de Conduta (Doc. 3). No prazo concedido, a ré informou que não iria irmar o TAC.

Diante da recusa, o Ministério Público do Trabalho, juntamente com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), realizou diligência no aeroporto, quando então restou comprovada a prática de terceirização ilícita pela ré, pois: a) as tarefas executadas pelos obreiros terceirizados, consistentes no atendimento a passageiros, inserem--se nas atividades-im da ré; b) não se trata de um serviço especializado, mas do mero fornecimento de mão de obra pela empresa terceirizada; c) há pessoalidade e subordinação direta dos trabalhadores terceirizados em relação à ré; d) há precarização, sendo a remuneração e os benefícios recebidos pelos terceirizados muito inferiores àqueles concedidos aos empregados da ré.

Como elementos de convicção, ressaltam-se, além dos documentos apresentados pela ré e pela empresa terceirizada, as entrevistas realizadas pelo Parquet e pelo MTE com os terceirizados e os empregados da ré no aeroporto e o acompanhamento do denominado brieing, que ocorre momentos antes do check-in, quando os empregados da ré informam aos trabalhadores terceirizados os dados e procedimentos do voo, dando-lhes instruções especíicas e ordens diretas (Doc. 5 e Doc. 6).

Destacam-se também, no sentido da comprovação da pessoalidade e da subordinação direta, os denominados "alertas", que são comunicados escritos enviados por correio eletrônico pela ré a seus empregados contendo orientações e instruções sobre os procedimentos da companhia aérea. Tais comunicados são

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passados aos trabalhadores terceirizados, os quais devem lê-los e assiná-los, sendo que, durante o brieing, os empregados da ré esclarecem o seu conteúdo e respondem a dúvidas dos terceirizados (Doc. 7).

Ao inal da iscalização, em virtude dos fatos acima narrados e de outras irregularidades, o MTE lavrou o auto de infração n. 203.309.316 (relativo à terceirização ilícita), bem como os autos n. 203.309.332, 203.309.341 e 203.309.383, concernentes à duração do trabalho (prorrogação da jornada diária além do limite legal e ausência de concessão dos intervalos intrajornada e interjornada mínimos), os quais não são objeto desta ação (Doc. 5).

Quanto ao auto de infração n. 203.309.316 (terceirização ilícita), que é objeto desta ação, destacam-se a sua ementa e um trecho de sua fundamentação:

"Auto de infração n. 203.309.316. Admitir ou manter empregado sem o respec-tivo registro em livro, icha ou sistema eletrônico competente. [...]. Constatou-se que a TOMADORA DE MÃO DE OBRA contratou trabalhadores por empresa interposta para exercer atividades que estão inclusas de forma central dentro da sua atividade econômica. Assim, o contrato entre ambas trata-se na ver- dade de mera intermediação de mão de obra e que atrai consequentemente a subordinação jurídica e a pessoalidade, em evidente afronta à Súmula n. 331, III, do TST, a qual autoriza somente a terceirização de ‘serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador’. Isso porque a prestação de serviços em atividade-im da empresa jamais poderia ser realizada sem pessoalidade e subordinação jurídica ao tomador de serviços, conirmando-se terceirização ilícita e verdadeira fraude à lei." (Doc. 5)

Ressalta-se que outras companhias aéreas investigadas pelo Parquet, que, a exemplo da ré, também terceirizavam as atividades de atendimento a passageiro, adequaram a sua conduta extrajudicialmente, através da assinatura de TAC, no qual se comprometeram a contratar diretamente como empregados os trabalhadores que exercem essas atividades. Podem ser citadas a Societé Air France (TAC n. 67/2010), U.S. Airways Inc. (TAC n. 1.740/2012), Qatar Airways Company (TAC n. 19/2014), Swiss International Air Lines (TAC n. 20/2014) e Emirates Airlines (TAC n. 24/2014) (Doc. 11).

Diante da evidente prática de terceirização ilícita e da posição assumida de negar-se ao ajuste extrajudicial, não restou alternativa ao Ministério Público do Trabalho senão recorrer ao Poder Judiciário a im de impedir a perpetuação das ilegalidades mencionadas e restabelecer a ordem jurídica violada.

II - Do direito

2.1. Da legitimidade do Ministério Público do Trabalho

Incumbe ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime demo-crático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127, caput).

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Tem por função, entre outras, a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, III).

De outra banda, a Lei Complementar n. 75/93, em seu art. 6º, VII, alíneas a e d, ao tratar do Parquet, atribui-lhe a defesa dos interesses individuais, homogêneos, sociais, difusos e coletivos, dentre outros, assegurando-lhe, como instrumentos de atuação, o inquérito civil e a ação civil pública.

Cuidando especiicamente do Ministério Público do Trabalho, referida Lei Complementar n. 75/93, em seus arts. 83, III, e 84, II, assegura competir a este ramo do órgão ministerial o ajuizamento da ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho, para a defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos.

A ação que ora é proposta tem por escopo combater e inibir a prática fraudulenta perpetrada pela ré, que objetiva desvirtuar a relação de emprego e afastar a aplicação dos direitos trabalhistas previstos na Constituição Federal, na CLT e em demais normas de proteção ao trabalhador.

Não é demais frisar, também, que a defesa da ordem jurídica e do patrimônio social, atribuição constitucional inerente à atuação do Ministério Público (CF, art. 127), a ser exercida também perante a Justiça do Trabalho (LC n. 75/93, art. 83, III), são interesses difusos da sociedade, inegavelmente tuteláveis pela via da ação civil pública (CF, art. 129, III; Lei n. 7.347/85, art. 1º, IV).

Inquestionável, portanto, a legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento da presente ação, com fundamento nos arts. 127, caput, e 129, III, da Constituição Federal, art. 6º, VII, alíneas a e d e arts. 83, III, e 84 da Lei Complementar n. 75/93.

2.2. Do cabimento da ação civil pública

A ação civil pública constitui instrumento adequado para a busca da tutela jurisdicional dos direitos metaindividuais, nos termos do art. 1º, IV, da Lei n. 7.347/85 c/c o art. 129, III, da Constituição Federal e art. 83, III, da Lei Complementar n. 75/93.

Conforme ensina Nelson Nery Junior:

"ACP e a Justiça do Trabalho. Podem ser ajuizadas todas as ações cabíveis para a defesa de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos concernentes a relações trabalhistas e questões versando Direito do Trabalho, por meio de ACP (difusos e coletivos) ou de ação coletiva (class action) para a defesa de direitos individuais homogêneos (CDC 81, parágrafo único, III e 91 a 100)."1

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Em verdade, a medida é imprescindível sempre que os fatos anunciarem o prejuízo de uma coletividade de trabalhadores em virtude da violação de direitos...

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