A Nova Sistemática Legal do Mandado de Segurança (Lei 12.016, de 7.8.2009) e sua Aplicação ao Processo do Trabalho. Parte I

AutorJouberto de Quadros Pessoa Cavalcante; Francisco Ferreira Jorge Neto; Carlos Augusto de Assis
CargoAdvogado/SP/Juiz Titular da 1a. Vara do Trabalho de São Caetano do Sul/SP/Advogado/SP
Páginas5-10

Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante: Advogado/SP. Professor da Faculdade de Direito Mackenzie Mestre em Direito Político e Econômico (Universidade Presbiteriana Mackenzie)

Francisco Ferreira Jorge Neto: Juiz Titular da 1a. Vara do Trabalho de São Caetano do Sul/SP. Mestre em Direito das Relações Sociais – Direito do Trabalho (PUC/SP) tamulis@uol.com.br

Carlos Augusto de Assis: Advogado/SP. Professor da Faculdade de Direito Mackenzie. Mestre e doutor em Direito Processual (USP)

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Introdução

Diante da nova sistemática legal do mandado de segurança (Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009) e suas inovações, faz-se necessário sua análise ontológica, sob a ótica do sistema positivo de normas, da doutrinária e do ponto de vista da jurisprudência, com o foco nos conflitos decorrentes da relação de trabalho (Direito Processual do Trabalho).

1. Mandado de segurança no sistema jurídico

Previsto na Constituição Federal (art. 5º, LXIX), o mandado de segurança não se encontra disciplinado pelo Código de Processo Civil (CPC), mas por legislação especial. Até há pouco tempo era a Lei 1.533, de 31 de dezembro de 1951, com as alterações das Leis 4.166/62, a 4.348/64 e a 5.021/66. Todas essas normas foram revogadas expressamente pela nova Lei do Mandado de Segurança (Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009)1 .

Nos termos da Constituição Federal (CF), o mandado de segurança será concedido “para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”.

No âmbito infraconstitucional, o mandado de segurança existe para proteger “direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e seja quais forem as funções que exerça” (art. 1º, Lei 12.016).

Com a Emenda Constitucional (EC) 45/04, passou haver a previsão expressa de seu cabimento no âmbito da Justiça do Trabalho (art. 114, IV, CF). Contudo, mesmo antes da EC 45, não existia qualquer restrição à sua aplicação na Justiça do Trabalho.

No âmbito interno do Tribunal Superior do Trabalho (TST), o processamento do writ é disciplinado a partir do art. 209 (RITST).

O Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho (RITST) prevê a possibilidade de mandado de segurança contra ato do Presidente ou de qualquer dos Ministros (art. 209).

2. Atos atacáveis por mandado de segurança

Como preceitua o dispositivo constitucional, o mandado de segurança visa garantir direito líquido e certo, não amparado por outros remédios constitucionais (habeas corpus ou habeas data), quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Trata-se de uma ação constitucional, de natureza civil.

Assim, o direito violado que enseja o ajuizamento do mandamus of writ não se refere ao direito de liberdade ou ao direito de informação (conhecimento e retificação de dados).

Direito líquido e certo, como leciona Hely Lopes Meirelles2 “é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais”.

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Direito líquido e certo é aquele que não enseja dúvidas sobre sua existência fática3 , havendo comprovação de plano. Consequentemente, não pode depender de instrução probatória4 . Tanto é assim, que exige prova documental5 pré-constituída, sendo inaplicável o art. 284 do CPC quando verificada, na petição inicial do mandamus, a ausência de documento indispensável ou de sua autenticação (Súm. 415, TST).

O objetivo do mandado de segurança é atacar o ato judicial ou administrativo (ato coator) praticado por autoridade pública ou particular que exerce função delegada do Estado6 (Súm. 510, STF7) que viole direito líquido e certo.

O ato coator pode ser de caráter omissivo ou comissivo.

A inobservância do direito pela autoridade pública pode ocorrer por ilegalidade ou abuso de poder.

O mandado de segurança poderá ser repressivo, se o ato já foi praticado, e preventivo, quando há justo receio de que venha a ocorrer (ameaça).

Assim, quatro os requisitos essenciais do mandado de segurança: a) ato omissivo ou comissivo da autoridade pública ou do particular que exercer função delegada; b) ato ilegal ou abusivo; c) lesão ou ameaça de lesão a direito; d) caráter subsidiário, proteção ao direito líquido e certo não amparado por outras ações constitucionais.

A legislação infraconstitucional exclui o cabimento do mandado de segurança contra atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público (art. 1º, § 2º, Lei 12.016). E não será concedida a segurança quando se tratar de: a) ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução; b) decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo; c) decisão transitada em julgado (art. 5º).

A segurança será denegada nos casos do art. 267 do CPC (art. 6º, § 5º)8.

Dessa forma, o mandado de segurança não substitui a ação popular (Súm. 101, STF), ação de cobrança (Súm. 269), ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária (Súm. 213) e embargos de terceiros para desconstituir penhora (OJ 54, SDI-II).

Também não se presta o writ of mandamus contra ato judicial passível de recurso ou correição (Súm. 267, STF), decisão judicial com trânsito em julgado (Súm. 268, STF, Súm. 33, TST), lei em tese, salvo se de efeito concreto ou autoexecutória (Súm. 266, STF), que envolva exame de prova ou situação funcional complexa (Súm. 270) e atos interna corporis de órgãos colegiados.

A mera existência de recurso administrativo, com efeito suspensivo, não impede o uso do mandado de segurança contra omissão da autoridade – ato omissivo (Súm. 429, STF).

O que tem sido inadmissível é a postulação administrativa e judicial simultaneamente.

O art. 5º, I, da Lei 12.016 errou ao prever o não cabimento do writ contra ato administrativo do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, ainda que independentemente de caução. Tal restrição é inconstitucional, por violar o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 5º, XXXV, CF).

O recurso administrativo não se confunde com o pedido de reconsideração, o qual não interrompe o prazo para ajuizamento do writ (Súm. 430).

A existência de recurso próprio, ainda que com efeito diferido, impede o mandado de segurança (OJ 92, SDI-II).

Para o TST, não procede ação rescisória calcada em ofensa à coisa julgada perpetrada por decisão proferida em ação de cumprimento, em face de a sentença normativa, na qual se louvava, ter sido modificada em grau de recurso, porque em dissídio coletivo somente se consubstancia coisa julgada formal. Assim, os meios processuais aptos a atacarem a execução da cláusula reformada são a exceção de pré-executividade e o mandado de segurança, no caso de descumprimento do art. 572 do CPC (Súm. 397, TST, OJ 277, SDI-I).

Não há direito líquido e certo, amparado pelo mandado de segurança, quando se escuda em lei cujos efeitos foram anulados por outra declarada constitucional pelo STF (Súm. 474, STF).

A existência de meio judicial adequado para impugnar o ato afasta o cabimento do writ of mandamus, de modo que contra sentença homologatória de adjudicação é incabível o remédio constitucional (o meio próprio consiste nos embargos à adjudicação) (OJ 66, SDI-II) ou contra ato judicial que, de ofício, arbitrou novo valor à causa, acarretando a majoração das custas processuais (OJ 88).

Não havendo recurso próprio no processo do trabalho, contra a tutela antecipada concedida antes da prolação da sentença é impugnável mediante mandado de segurança (Súm. 414, II, TST). Se a tutela antecipada for concedida na sentença, a ação cautelar será o meio próprio para se obter o efeito suspensivo ao recurso ordinário (Súm. 414, I).

A superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do mandado de segurança que impugnava a concessão da tutela antecipada (ou liminar) (Súm. 414, III).

Não se admite mandado de segurança para impugnar despacho que acolheu ou indeferiu liminar em outro mandado de segurança (OJ 140, SDI-II).

Se houve determinação de reintegração no emprego em ação cautelar, admite-se o mandado de segurança como forma de atacar a decisão (OJ 63).

Contudo, não há violação de direito líquido e certo na concessão de tutela antecipada para reintegrar empregado protegido por estabilidade provisória decorrente de lei ou norma coletiva (OJ 64), decorrente do exercício da função sindical (OJ 65) ou para obstar a transferência de empregado (OJ 67).

Constitui direito líquido e certo do empregador a suspensão do empregado, ainda que detentor de estabilidade sindical, até a decisão final do inquérito em que se apure a falta grave a ele imputada (art. 494, caput e parágrafo único, CLT) (OJ 137).

A concessão de liminar ou...

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