Terceirização

AutorLuís Antônio Camargo de Melo
Páginas166-172

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Introdução

Incorporado definitivamente no cotidiano das empresas brasileiras, e em quase todos os países capitalistas, no final da década de 1970, o instituto da terceirização, com raras exceções, conduz os assalariados a uma perda gradual dos direitos sociais e trabalhistas sedimentados nas Cartas Constitucionais e Texto Celestista. A esperada e propagada inovação das relações de trabalho e as vantagens resultantes da subcontratação da mão de obra não gerou para os trabalhadores os mesmos benefícios alçados pelos setores empresariais. O discurso neoliberal apenas aumentou a competição, o individualismo e a exclusão social.

A matéria é alvo de discussão em praticamente todos os segmentos da sociedade, notadamente quando em evidência Projetos de Leis que visam a disciplinar o tema, cujos limites hoje estão traçados pela jurisprudência e direito comparado. Não surpreende, portanto, que a terceirização, modalidade de flexibilização ou desregulamentação do Direito do Trabalho, suscite controvérsias. O vazio legislativo, por certo, aumenta o clima de insegurança jurídica e afeta tanto a administração pública, servidores e empregados públicos, como empregadores e trabalhadores da iniciativa privada.

A regulamentação da matéria, entendo, será um divisor importante entre o quadro de incertezas que hoje sustenta as relações de terceirização (precariamente estabelecidas) e a garantia de um patamar mínimo de direitos assegurados pelo Estado à categoria. As normas aprovadas, entretanto, jamais poderão se afastar de princípios basilares como a preservação da dignidade humana e o valor social do trabalho.

Levando-se em conta os diversos setores da economia afetados por esta realidade, e sem pretensão de esgotar a matéria, quero contribuir para o debate, com enfoque na atuação do Parquet no combate às fraudes trabalhistas e nos maléficos efeitos da terceirização na coletividade e trabalhadores a ela submetidos (fragmentação da categoria profissional e consequente redução da capacidade de negociação por melhores condições de trabalho, apenas para citar alguns), especialmente quando o Estado se mantém omisso e não define as responsabilidades, direitos e deveres dos atores sociais envolvidos no processo.

1. Projetos de lei

Tramitam na Câmara dos Deputados 22 (vinte e duas) propostas sobre a regulamentação do tema. As principais divergências concentram-se na definição da responsabilidade das empresas prestadoras e tomadoras do serviço e nos limites da terceirização.

Entre os projetos apresentados, detacam-se1:

1. Projeto de Lei n. 8.174/86: Autoria de Almir Pazzianotto Pinto, à época Ministro do Governo Sarney, dirigido à Câmara dos Deputados com a mensagem n. 472/86, de 21 de agosto de 1986. Institui o contrato escrito para locação de mão de obra pelas empresas de leasing, folha de pagamento, piso salarial; disciplina a contratação de boia fria nos períodos de safra e pelo período de seis meses. Também define o acidente de trabalho e a contribuição para custeio o benefício previdenciário por acidente.

Retirado de pauta em razão do Enunciado n. 256 do TST, que restringia as hipóteses de terceirização ao trabalho temporário e serviços de vigilância e arquivado na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.

2. Projeto de Lei n. 4.302/98: Autoria de Fernando Henrique Cardoso. Inclui a alteração da Lei do Trabalho Temporário e regulamentação da terceirização no setor público e privado e em todos os seguimentos produtivos: serviço, indústria, comércio e agricultura. No momento está aguarda parecer na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania.

3. Projeto de Lei n. 4.330/04: Proposta de autoria do Deputado Sandro Mabel, que dispõe sobre "o contrato de prestação de serviços a terceiros e as relações dele decorrentes". Permite a terceirização de atividade-fim e de atividade-meio, a

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responsabilidade da empresa tomadora e o controle periódico do cumprimento das obrigações trabalhistas da contratada. Aguarda parecer na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania

4. Projeto de Lei n. 5.439/05: De autoria da Deputada Ann Pontes. Acrescenta dispositivo à CLT, restringindo a contratação da mão de obra por empresa interposta, ressalvando apenas as hipóteses de trabalho temporário, vigilância, conservação e limpeza. Encontra-se em apenso ao PL n. 4.330/04.

5. Projeto de Lei n. 1.621/07, do Deputado Vicente Paulo da Silva. Dispõe sobre as relações de trabalho em atos de terceirização e na prestação de serviços a terceiros no setor privado e nas sociedades de economia mista. Proíbe a terceirização da atividade-fim e prevê a comunicação ao sindicato da categoria profissional, com no mínimo seis meses de antecedência, sobre os projetos de execução de serviços por empresa interposta. Também fixa a responsabilidade e o controle e fiscalização da empresa tomadora. Aguarda parecer na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio.2

Apenso ao referido projeto, está o PL n. 6.832/2010 de autoria do ex-deputado Paulo Delgado, que estabelece a regra mista para responsabilidade, ou seja, subsidiária quando a empresa contratante comprovasse a fiscalização dos encargos trabalhistas e solidária nos casos de omissão.

Em notícia veiculada no site do Tribunal Superior do Trabalho, João Oreste Dalazen, Presidente da Corte, defendeu a adoção a responsabilidade solidária por parte do tomador de serviço pelo descumprimento de obrigações trabalhistas: "Seria um avanço social e induziria as empresas que contratam a prestação de serviços a participar mais do processo de fiscalização", afirmou. E arremata: "A terceirização na atividade-fim é, na minha opinião, a negação do Direito do Trabalho" [...] Não há um rigor científico absoluto, mas o critério ainda é um mal menor diante da possibilidade de abertura plena e desenfreada da terceirização3.

Há hoje cerca de 8,2 milhões de trabalhadores, segundo estudo do Sindicato das Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros de São Paulo, que precisam de uma resposta do Estado, consistente e efetiva. Não existe mais tolerância para a omissão do direito positivo. A definição da responsabilidade solidária das empresas, como a delimitação do objeto da terceirização, configura meio hábil de impedir o uso abusivo do instituto.

Por fim, vale mencionar o anteprojeto elaborado desde o fim do Governo Lula, em parceria com o empresariado e as Centrais Sindicais, que prevê a responsabilidade solidária e proíbe a terceirização de atividade fim. Inexiste, entretanto, previsão para a minuta ser encaminhada à Câmara dos Deputados.

2. Ministério público do trabalho

No âmbito do Ministério Público do Trabalho criaram-se diversas coordenadorias nacionais com o fim de buscar a especialização na atuação de conflitos trabalhistas de interesses coletivos e difusos.

Em razão das particularidades que o tema terceirização envolve, além do aumento de demandas judiciais e extrajudiciais em que o Ministério Público do Trabalho atua, geralmente decorrente de fraudes praticadas em processos de terceirização, o tema restou considerado prioritário da Conafret - Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Emprego.

A Conafret alberga discussões sobre o tema terceirização, elabora projetos, organiza reuniões e debates entre os membros do MPT que integram referida coordenadoria, além de criar forças tarefas para instruir inquéritos civis ou atender demandas específicas.

Nos últimos anos as atividades da Coordenadoria se intensificaram, principalmente tendo em vista o crescente desvirtuamento do instituto da terceirização. O abuso da prática da terceirização na prestação de serviços decorre em muito da ausência de legislação específica que possa nortear a atuação de empregadores e da falsa ideia do tomador de serviço em associar todo processo de terceirização à redução de custos operacionais, independentemente de tal proceder caracterizar ofensa a dispositivos legais ou caracterizar a precarização das relações de trabalho.

Outras Coordenadorias Temáticas desenvolvem projetos correlacionados com o tema Terceirização, a exemplo da Conap

- Coordenadoria Nacional de Combate às Irregularidades Trabalhistas da Administração Pública - atua especialmente nas contratações sem concurso público, terceirização ilícita, desvirtuamento da contratação temporária e empregos em comissão, além de improbidade administrativa; a Conalis - Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical - por sua vez, analisa a fragmentação e enfraquecimento da classe trabalhadora e do movimento sindical; Codemat - Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho -, cujo objetivo é assegurar um meio ambiente sadio e saudável; Conatpa tem por objetivo o combate a elevada incidência de terceirização no setor portuário e aquaviário e a Coordigualdade que procura garantir a igualdade nas relações...

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